Conheça Gio Ponti, arquiteto, designer e principal cronista do design moderno italiano

17/07/2011 10h00

 

MILÃO – Foi uma carreira e tanto. Como designer, Gio Ponti trabalhou para 120 empresas. Como arquiteto, construiu em 13 países. Como editor de revista, produziu 560 edições e escreveu pelo menos um artigo para cada uma delas. Como acadêmico, lecionou em 24 países. Ele ainda encontrou tempo para ditar algo como 2.500 cartas e fez 2.000 cartas ilustradas, além de pintura e poesia.

Ponti, que morreu em 1979 aos 87 anos, surgiu como um dos mais influentes arquitetos e designers da Itália do século 20, onde a Pirelli Tower ainda se eleva sobre sua Milão nativa. Resumir sua carreira sempre foi complicado. Ele não só era extraordinariamente prolífico, como seu trabalho era eclético de modo incomum e refletia estilos e ideologias diversas e geralmente conflitantes, com as quais ele experimentou ao longo dos anos. 

Germano Celant, o curador de “Expressions of Gio Ponti”, uma retrospectiva que vai até dia 24 de julho no museu Triennale em Milão (triennale.org), começa seu ensaio no catálogo admitindo que é “impossível condensar” os feitos de Ponti em uma única exibição. Curadores sempre dão depoimentos parecidos, algo que geralmente parecem suspeitas desculpas, mas, ao falarmos sobre Ponti, isso é verdade. 

Ao invés de tentar apresentar sua carreira de forma resumida, Celant selecionou 250 entre os milhares de trabalhos de Ponti para contar sua história como uma série de vinhetas. Infelizmente, ele está obstruído, ao invés de auxiliado, pelo design da exposição. Construído como um museu de arte na era de Mussolini, o lúgubre Triennale sempre oprime suas exibições, incluindo esta, que tem o ar sombrio de uma feira de negócios. "Expressions” também teve um nascimento difícil. Originalmente concebida como a exposição de estreia do museu satélite do Triennale em Nova York, que deveria ter sido inaugurado no outono (do hemisfério norte) passado, ela acabou em Milão depois do projeto nova-iorquino ter sido suspenso. 

Que prazer ela acabou virando. A exibição é tão atraente que, apesar do design monótono e da historia diversificada, a exposição brilha com o espírito alegre de Ponti, além da sutileza, sensualidade e inteligência do melhor do seu trabalho.

Como muitos dos mestres que estabeleceram a Itália como um centro global de design no século 20, Ponti originalmente se desenvolveu como arquiteto e entrou no universo do desenho industrial ao criar produtos para uma empresa italiana. Tratava-se da Richard Ginori, que produzia cerâmica desde o século 18 e era baseada perto de Florença. Durante os anos de 1920 e 1930, Ponti colaborou com seus artesãos para desenvolver carâmicas intrincadas, belamente trabalhadas, suntuosamente decoradas, geralmente no estilo neoclássico.

Essas peças, entretanto, eram impressionantes, pareciam arcaicas perto do estilo “moderno” e contemplativo que fora abraçado pelos colegas de Ponti. Os designers hoje em dia são encorajados a serem expressivos, mas não naquela época. A expressão pessoal era vista como uma distração desnecessária para o sério negócio do funcionalismo. A experiência inicial na Richard Ginori nutriu seu amor pela riqueza de cores, formas exuberantes e artesanato de qualidade, tudo o que estava profundamente fora de moda durante a maior parte de sua carreira, mas que se manteve importante para ele, mesmo que seu trabalho tenha se tornado menos exuberante ao longo dos anos.

Algumas das obras no Triennale, inclusive a prataria da Christofle e os cristais Venini, além das cerâmicas da Richard Ginori, são exemplos deslumbrantes de artesanato, assim como as sedas maravilhosamente bordadas da década de 1930 criadas para Vittorio Ferrari e os armários suntuosos de 1935, feitos a partir de raízes da urze-branca.  

Mesmo os exemplos de maior sucesso no design industrial de Ponti têm uma aura idiossincrática. Tome as curvas voluptuosas do La Cornuta, sua máquina de café expresso de 1948 para La Pavoni, que se tornou um símbolo da la dolce vita italiana, ou então o assento com trançado artesanal da cadeira de 1957, chamada Superleggera (literalmente, “superleve”), que ele criou para a Cassina. A cadeira era tão leve que as fotos promocionais exibiam um garoto levantando-a com a ponta do dedo. 

Como arquiteto, o repertório de Ponti ia do estilo clássico de seus primeiros projetos nos anos de 1920 -a maioria casas, fortemente influenciadas pelas villas do século 16 de Andrea Palladio-, à contenção modernista de seu trabalho pós-guerra, inclusive a Pirelli Tower, de 1956. Mas seus melhores edifícios, como o Villa Planchart, de 1955, em Caracas, e o Villa Nemazee, de 1960, em Teerã, são aqueles que refletem sua vivacidade ao criar contrastes deslumbrantes de cor, luz e textura.   

A importância que Ponti teve como designer e arquiteto praticante era igual, senão maior, à de catalisador cultural que celebrava o trabalho de outros profissionais e definia os termos do debate sobre design enquanto editor, escritor e professor.

Como editor da revista “Domus” (entre 1928 e 1941 e entre 1948 e 1979) e da revista “Stile”, de 1942 a 1947, ele foi o principal cronista sobre a evolução do design moderno na Itália. Ponti usou esta posição para advogar a favor de designers e artistas que admirava, inclusive Carlo Mollino, Piero Fornasetti e Lucio Fontana, além de contextualizar o design italiano na cultura contemporânea. Ao fazer isso, ele deu peso intelectual ao design, o que acabou salvando-o de ser posto de lado como uma disciplina puramente comercial na Itália, assim como era nos Estados Unidos.

Uma das maiores forças de Ponti como editor e designer era a sua generosidade. Intensamente curioso, ele tinha uma mente incomum e aberta, ávida por explorar novas ideias. Ele estabeleceu fortes amizades com colegas ao redor do mundo, que sempre o visitavam em sua casa em Milão ou em seu estúdio. O estúdio, que já havia sido uma garagem, era tão grande que seus assistentes circulavam pelas mesas em scooters. Seus amigos ainda contam historias sobre seu charme e sua delicadeza para com eles.

Apesar de o trabalho de Ponti ter se tornado mais convencionalmente modernista na segunda metade de sua carreira, ele ainda gostava de encorajar os jovens designers, inclusive aqueles cujas ideias desafiavam as suas próprias. Entre eles estavam Alessandro Mendini e Ettore Sottsass, que estavam na linha de frente do movimento pós-modernista da década de 1970 e que emergia como alternativa ao modernismo.

Naquela época, Ponti entrava nos seus 80 anos, ainda trabalhando, mas proibido de dirigir seu amado Citroen DS por Milão. Ele o trocou por uma tranquila van Fiat. Caracteristicamente, ele escolheu uma com 12 lugares, esperando preenchê-los com amigos com quem ele poderia conversar enquanto estavam na estrada.

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