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"No Brasil, só incomoda o racismo do outro", diz a filósofa Djamila Ribeiro

Djamila Ribeiro, filósofa e ativista pelos direitos dos negros - Christian Parente/Divulgação
Djamila Ribeiro, filósofa e ativista pelos direitos dos negros Imagem: Christian Parente/Divulgação

Natacha Cortez

Do UOL, em São Paulo

11/11/2017 11h35

Para a mestre em Filosofia e ativista negra Djamila Ribeiro, 37, a acusação de racismo que caiu sobre o âncora da Rede Globo, William Waack, deveria ir além do barulho nas redes sociais e das críticas ao apresentador e servir como ponto de partida para uma discussão ainda mais profunda: o racismo estrutural existente no Brasil.

"Não me interessa meramente a punição do William Waack. Quero discutir por que na Globo há poucos jornalistas negros, por que há pouquíssimos jornalistas negros como âncoras de jornal. Quero discutir por que nas universidades há poucos alunos e professores negros; por que pessoas negras não estão em lugares de poder e privilégio em todos os setores da sociedade."

Ela ainda explica a importância da autocrítica e reflexão para cada cidadão brasileiro. "Não adianta nada as pessoas apenas se exporem indignadas no Facebook pra mostrar o quanto são críticas e inteiradas no debate e não fazerem nenhum questionamento sobre o racismo que carregam em si. Costumo dizer que no Brasil o racista só se incomoda com o racismo do outro. Ou seja: aponto o dedo pro Waack, mas não discuto por que na minha empresa não há negros, por que na escola do meu filho não há negros, por que meu partido não há negros. Dessa forma, o debate não passa de oportunista e superficial."

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"Neste país, as pessoas têm essa ideia de que racismo é humilhar o outro, ofender o outro. Por aqui, não se entende que racismo é bem mais, que é um sistema de opressão que nega direitos à população negra. E é esse debate, do racismo como sistema, que falta para avançarmos", continua.

Sobre a reação da emissora de Waack, Ribeiro é incisiva: "Foi branda; 'suspensão' não é o bastante. Em outros países, o apresentador seria demitido da emissora", diz ela, comparando o caso ao do ator norte-americano Kevin Spacey, cortado de todas as produções da Netflix por conta de denúncias de abuso sexual. "No Brasil as pessoas ficam com pena do racista e se conformam com penas mansas", diz.

"Coisa de preto"

William Waack foi afastado das suas funções de jornalista após o vazamento de um vídeo, na última quarta-feira, 8, onde faz comentários racistas. No material, ele aparece xingando um motorista que buzinava no local onde gravava a cobertura das eleições americanas:

“Tá buzinando por que, ô seu merda do cacete? Deve ser um daqueles… Não vou nem falar de quem é, eu sei o que é… Sabe o que, né? Preto, né? Sabe o que é isso? É coisa de preto.”

Após a repercussão na internet, Waack afirmou não se lembrar do que disse, que o áudio vazado "não tem clareza” e pediu desculpas àqueles que sentiram ultrajados.