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Fazer loucuras para presentear o filho prejudica o orçamento e a criança

Fernanda Nogueira fez loucura para satisfazer o desejo da filha, Ananda - Arquivo Pessoal
Fernanda Nogueira fez loucura para satisfazer o desejo da filha, Ananda Imagem: Arquivo Pessoal

Do UOL, em São Paulo

20/12/2015 08h05

 

“Passeava com a minha filha, quando ela se encantou com um cavalinho pula-pula em uma loja. Ela pediu tanto que eu disse que voltaria depois para buscá-lo. Mas, naquele momento, eu e meu marido tínhamos aberto uma empresa e a nossa situação financeira estava difícil. Quando chegou perto do Natal, não tinha dinheiro para nada, cheguei a chorar porque não podia comprar o pula-pula. Até que consegui fazer uma venda que era o valor certinho do brinquedo. Não tive dúvida: peguei o dinheiro de outro cliente para pagar o fornecedor e comprei. Esse valor fez falta mais tarde na empresa, mas ver a felicidade da minha filha ao receber o presente foi muito emocionante.”

Essa é a história da empresária Fernanda Nogueira, 25, mãe de Ananda, 3. Mas poderia ser também a de muitas outras mães brasileiras. Um estudo realizado pelo SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas, divulgado em setembro, revelou que 64,4% das mães entrevistadas, em 27 capitais, não resistem aos apelos dos filhos. O percentual é ainda maior entre as mães de meninas, como é o caso de Fernanda: 68,9%.

A mesma pesquisa indicou que quatro a cada dez mães, ou 36,7% das que foram ouvidas, já ficaram em algum momento endividadas em decorrência das compras que fizeram para os filhos. Além disso, 9,9% deixaram de comprar produtos importantes para a casa ou de pagar alguma conta pela mesma razão.

Segundo a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti, é muito comum os pais darem aos filhos presentes que estão fora do padrão de vida familiar, o que sacrifica não só o orçamento doméstico, como ensina um comportamento financeiro irresponsável à criança.

“Isso faz com que a criança se acostume com um padrão que não é o dela. Outra lição que ela vai aprender é que, se não houver dinheiro suficiente para comprar o que deseja, bastará se endividar”, afirma a economista.

Para a psicoterapeuta Ana Olmos, conselheira do projeto “Criança e Consumo” do Instituto Alana --ONG de defesa da infância--, a atitude também não contribui para o amadurecimento dos filhos. “A criança deve perceber que não é sempre que realizamos nossos desejos. Se existe prazer o tempo inteiro, ela não aguentará frustração alguma”, diz. E como as crianças se orientam pelo que vêem no comportamento dos pais, os adultos também precisarão aprender a lidar com as próprias frustrações.

Negociação entre pais e filho

Na tentativa de demonstrar amor, os pais podem estimular o consumismo dos filhos ao dizer “sim” a todos os desejos deles. Porém, de acordo com o especialista em educação financeira Álvaro Modernell, autor de “Zequinha e a Porquinha Poupança” (Editora Mais Ativos), negociar o desejo dos filhos é fundamental.

“Com crianças maiores, o pai pode combinar de não dar presente no Dia das Crianças e cortar a saída do fim de semana para que o filho receba o celular que quer no Natal. É isso ou um modelo mais simples de telefone, que caiba no orçamento”, diz.

Para a educadora financeira especializada em crianças Cássia D’Áquino, devem ser fixadas datas para dar presentes. Assim, as crianças aprenderão a esperar e terão tempo para perceber se aquele desejo é mesmo real. O comportamento também contribuirá com a vida financeira do filho lá na frente. “Alguém que fica no cheque especial porque precisa de um objeto é alguém que não aprendeu a esperar”, diz Cássia.

Na hora de explicar para crianças pequenas que elas não ganharam tudo o que pediram, uma estratégia é recorrer ao Papai Noel. “Elas escrevem em uma cartinha o que querem de presente, dando opções, e os pais escolhem o que cabe no orçamento. Se não vier algo, por ser caro demais, os pais explicam que o Papai Noel não conseguiu trazer agora, mas talvez consiga no próximo ano”, diz Cássia.