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Após adotar menino de nove anos, gay solteiro ganha licença de seis meses

Peterson dos Santos e seu filho Lucas - Arquivo pessoal
Peterson dos Santos e seu filho Lucas Imagem: Arquivo pessoal

Melissa Diniz

Do UOL, em São Paulo

15/01/2016 12h42

 

O vendedor Peterson Rodrigues dos Santos, 34 anos, de Gravataí, região metropolitana de Porto Alegre (RS), acaba de quebrar diversos tabus. Solteiro e homossexual, ele conseguiu tirar licença-paternidade de seis meses após adotar o menino Lucas, de nove anos.

A história dos dois começou em 2013, quando Peterson começou a frequentar uma ONG que, por coincidência, chama-se Amigos de Lucas, e promove o apadrinhamento de crianças que vivem em abrigos.

“Procurei a instituição para fazer um trabalho voluntário, participei de oficinas e depois de uma festa para conhecer as crianças que poderiam ser apadrinhadas”, conta.

Para surpresa de Peterson, durante a comemoração, Lucas se aproximou pedindo a ele que segurasse seu agasalho para poder brincar. “A psicóloga da ONG me alertou que aquilo era um sinal de empatia, pois ele não costumava falar com ninguém. Então perguntei: tu já tem dindo? E ele respondeu, tenho sim, é tu.”

Em geral, crianças que participam do projeto não estão disponíveis para adoção porque ainda não perderam o vínculo com a família de origem. Além disso, elas são maiores de cinco anos, perfil que não costuma ser procurado por candidatos a pais adotivos.

“Ao conseguirem um padrinho, as crianças passam a ter uma referência da vida fora do abrigo. Elas podem sair aos finais de semana para passear e passar férias com os padrinhos”, diz.

Foi aí que o vínculo entre os dois se fortaleceu. “Inicialmente, as visitas eram a cada 15 dias, mas logo passei a vê-lo toda semana, e o amor foi crescendo.” Um ano depois, Lucas foi destituído da família, tornando-se adotável.

“Contratei um advogado e entrei com um pedido de guarda em outubro de 2014, mas não contei a ele para não criar expectativas. Sei que o mundo é preconceituoso e temia ser barrado nas entrevistas por ser gay e solteiro.”

Levou quase um ano para que a decisão do juiz – favorável a Peterson – saísse. “Brinco que minha gestação durou 11 meses. Em setembro de 2015, Lucas tornou-se meu filho.” 

Mas a vida ainda reservava outra surpresa a eles. “Imediatamente, avisei o departamento de RH (recursos humanos) da Livraria Cultura, empresa em que sou funcionário, em Porto Alegre, que havia adotado uma criança.”

Inicialmente, a empresa ofereceu a ele uma licença-paternidade de 15 dias. “Eles não sabiam que, em 2014, havia entrado em vigor uma nova lei que dá direito a 120 dias de licença para pais adotivos, sejam homens ou mulheres, independentemente da idade da criança.”

Assim que tomou conhecimento da lei, a diretora de RH da empresa, Juliana Brandão, decidiu ir além. “Nós oferecemos às funcionárias licença-maternidade estendida de seis meses, não havia motivo para não conceder o mesmo benefício a ele, afinal, a história dos dois é muito bonita. Esperamos que sirva de incentivo para que outras empresas brasileiras façam o mesmo.”

Em abril, Peterson retornará ao trabalho e está aproveitando cada minuto com o filho para fortalecer a relação. “Ele viveu em abrigo quase a vida inteira, é a primeira vez que tem uma casa e uma família. Estou aprendendo a colocar limites e a dizer não, ser padrinho é bem mais fácil do que ser pai.”

Durante o período de apadrinhamento, Peterson aproveitou para explicar a Lucas sobre sua homossexualidade. “Na época, estava passando a novela 'Amor à Vida' (Globo) e havia dois personagens que formavam um casal gay, Félix e Niko (interpretados por Mateus Solano e Thiago Fragoso). Falei que eles se amavam e iam adotar uma criança, formando uma família.”

Lucas disse a ele que havia ouvido na escola que aquilo era errado. “Eu expliquei que não existe amor errado, mas preconceito sempre é errado. Sou consciente de que ele sofrerá bullying, porque ainda há muita ignorância no mundo, e a melhor maneira de protegê-lo é falando a verdade. Não vamos deixar que alguns ‘haters' (termo em inglês usado normalmente para pessoas que, na internet, postam comentários de ódio e/ou crítica) estraguem nossa felicidade.”