Fontes digitais ganham espaço na coleção de arquitetura e design do MoMA

Swiss Dots Ltd
Fonte Helvetica usada em camiseta nas ruas de Amsterdam em imagem do filme "Helvetica" Imagem: Swiss Dots Ltd

Alice Rawsthorn

20/02/2011 08h00

Quer ver um exemplo brilhante de: a) design engenhoso, b) uso criativo das novas tecnologias e, c) o mantra modernista "a forma (sempre) vem depois da função"? Se sim, abra o seu menu de fontes no computador e clique em Verdana.

Digite o número 1, seguido das letras I, i e l. Estes são os tipos que mais se parecem, e estão mais suscetíveis a serem confundidos em várias fontes, especialmente as digitais, que você lê nas telas. Note as sutis diferenças entre elas na Verdana: como o "i" é menor do que o "l", e o "I" maiúsculo e o número "1" são os únicos tipos com serifas, ou pequenos traços, nas duas extremidades, para que possamos distingui-los do "l" minúsculo.

Em seguida, digite as letras "fi", “ff” e "fl". O espaço entre cada dupla de letras é ligeiramente maior que entre outras duplas para evitar que eles virem um borrão único quando juntos, outro problema das fontes digitais. Por fim, se você imprimir tudo o que tiver digitado, vai notar que os tipos estão mais afastados na tela do que no papel.

Todos esses detalhes foram adicionados à Verdana pelo seu criador Matthew Carter, em 1996, quando a Microsoft encomendou a ele a criação de uma fonte que fosse fácil de ler nos computadores. Sua solução é um exemplo clássico de como o design inteligente pode nos ajudar a adaptar às mudanças tecnológicas.

Na final de janeiro, o Museu de Arte Moderna de Nova York anunciou que a Verdana e outras 22 fontes digitais foram escolhidas para fazer parte da sua coleção de arquitetura e design.

Fazer parte da coleção do MoMA é a maior das honras no universo do design: trata-se do equivalente a um Oscar ou a uma medalha de ouro olímpica. Até agora, apenas um tipo de letra conseguiu o feito - Helvetica – assim como alguns outros poucos exemplos do design gráfico. Há mais de 28 mil obras no acervo de arquitetura e design, que remonta a 1932. Entre elas estão cadeiras, carros esportivos, computadores, um helicóptero e os arquivos do grande arquiteto modernista Mies van der Rohe, mas não muitas peças gráficas. As exceções são um conjunto de cerca de cinco mil cartazes e preciosidades como a coleção completa da revista “Emigre”, todos os livros criados pela genial designer holandesa Irma Boom, e a fonte Helvetica, claro.

"Percebemos que o design gráfico era uma lacuna da coleção", disse Paola Antonelli, curadora sênior de arquitetura e design do MoMA. "Três anos atrás, realizamos um simpósio em Nova York para discutir e identificar novas categorias que devemos abraçar. A tipografia estava entre elas.”

O MoMA começou com as fontes digitais, que são criadas tanto em computadores, como a Verdana, ou para serem usadas sobre eles, como a OCR-A, a primeira fonte da nova coleção do MoMA. Ela foi desenvolvida pela American Type Founders em 1966, para um novo tipo de tecnologia, o OCR (Reconhecimento Ótico de Caracteres).

  • Erik van Blokland/Just van Rossum

    A fonte FF Beowulf foi programada para mudar a forma dos caracteres a cada vez que são impressos, de modo que elas nunca mais apareçam com o mesmo visual novamente


Durante séculos, as fontes tipográficas eram produzidas através do trabalhoso processo de fundição dos caracteres em metal, primeiro à mão e, a partir da década de 1880, mecanicamente. A introdução da fotocomposição na década de 60 tornou o processo um pouco mais fácil, mas o impacto da tipografia digital foi muito mais dramático. Os computadores não só eram mais rápido do que máquinas, mas interpretavam as instruções dos designers com muito mais precisão.

Os designers aproveitaram a oportunidade para experimentar. Entre as novas aquisições do MoMA está Oakland, criada por Zuzana Licko, co-fundadora da “Emigre”, em 1985, usando um computador pessoal Apple Macintosh de 128K. A digitalização também ofereceu oportunidades atraentes para os designers que queriam inventar novas fontes e reinventar fontes antigas para computadores, celulares, consoles de jogos, iPads e assim por diante. E isso democratizou o mundo esotérico da tipografia para o resto de nós ao nos permitir escolher nossas fontes favoritas nos nossos computadores.

Algumas das 23 fontes digitais do MoMA são soluções inspiradas para problemas práticos. A FF Meta, de 91, criada por Erik Spiekermann e a recriação da FF DIN, em 95, por Albert-Jan Pool, são exemplos de clareza tipográfica. Assim como a Bell Centennial, de 78, criada pelo Sr. Carter, que foi projetada para ser legível no minúsculo documento da AT&T que mostra diretórios de telefone. Tobias Frere-Jones e Jonathan Hoefler alcançaram o mesmo resultado para gráficos de jornal do mercado de ações e resultados esportivos com a Retina, de 2001.

Outras fontes foram escolhidas por sua engenhosidade tecnológica. A New Alphabet foi concebida por Wim Crouwel em 1967 para ser lida nos pedaços de pixels que saem dos tubos de raios catódicos e vão para os monitores. Na virada da década de 90, os pixels ficaram menores e fontes digitais como a Keedy Sans de 1989, de Jeffery Keedy; a Template Gothic de 1990, de  Barry Deck e a FF Blur, criada em 1992 por Neville Brody, mostraram como os designers haviam desenvolvido habilidades para manipular a tecnologia digital na hora de criar formas expressivas. Erik van Blokland e Just van Rossum programaram sua fonte FF Beowulf, de 1989, para mudar a forma dos caracteres a cada vez que são impressos, de modo que elas nunca mais apareçam com o mesmo visual novamente.

"Para mim, trabalhar digitalmente na década de 1990 foi um luxo", lembrou o Sr. Carter. "Por um lado, até que uma impressora a laser fosse ligada a um Mac pela primeira vez, os designers de fontes não tinham sido capazes de enxergar os resultados de seu trabalho em tempo real. Uma vez que você tivesse duas cartas digitalizadas, poderia definir o 'hohohohoh' para tamanhos diferentes e estudar as formas combinadas. Instantaneamente. Magia pura.”

Outra consideração do MoMA na hora de decidir quais fontes digitais seriam admitidas em sua coleção é a sensibilidade com que elas refletem algumas mudanças culturais mais abrangentes. Tanto a Dead History, criada por P. Scott Makela em 1990 quanto a Mason, de 92, exemplificam as fusões de 1990 entre referências históricas e contemporâneas. O Sr. Frere-Jones e o Sr. Hoefler ecoaram a tendência de reinterpretação do simbolismo vernacular ao ser usada nas placas interestaduais das rodovias americanas, e a Gotham, de 2001, (que se tornou a fonte oficial da campanha presidencial de Barack Obama) usada em placas de rua de Nova York.

A tipografia digital tem seus detratores, que afirmam que ela é muito pretensiosa, suave e homogênea. Esses tradicionalistas conduziram o coro de críticas ao IKEA anunciou em 2009 que estavam substituindo a Futura, uma fonte bem modernista projetado em 1927 por Paul Renner, com Verdana. Uma queixa comum foi que a Verdana não era um digno sucessor, pois seu projeto era dominado pela preocupação funcional - legibilidade na tela. Apesar de que é, claro, em partes, porque o MoMA o está honrando.

Tradutor: Erika Brandão

ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}

Ocorreu um erro ao carregar os comentários.

Por favor, tente novamente mais tarde.

{{comments.total}} Comentário

{{comments.total}} Comentários

Seja o primeiro a comentar

{{subtitle}}

Essa discussão está fechada

Não é possivel enviar comentários.

{{ user.alternativeText }}
Avaliar:
 

O UOL está testando novas regras para os comentários. O objetivo é estimular um debate saudável e de alto nível, estritamente relacionado ao conteúdo da página. Só serão aprovadas as mensagens que atenderem a este objetivo. Ao comentar você concorda com os termos de uso. O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia os termos de uso

Escolha do editor

{{ user.alternativeText }}
Escolha do editor