Exposição em Milão traz retrato do design gráfico contemporâneo

Metahaven
Pôsteres criados pelo grupo Metahaven para o WikiLeaks Identity Project (2011) Imagem: Metahaven

Alice Rawsthorn

06/03/2011 07h00

MILÃO - Victor Papanek não pensava muito sobre designers. "Há profissões mais prejudiciais do que a de designer industrial, mas poucas", escreveu ele, na abertura de seu livro de 1971 "Design for the Real World" [N.T.: sem tradução no Brasil].  "E possivelmente só tem uma profissão mais falsa. Design publicitário, ao persuadir as pessoas a comprar coisas que não precisam com o dinheiro que não têm, para impressionar os outros que não se importam, é provavelmente o campo de trabalho mais falso dos dias de hoje."

Ai... "Design publicitário" é um termo antiquado hoje em dia, mas perto da virada da década de 1970 teria incluído todos os Don Drapers, Peggy Olsons e o resto do pessoal de criação da agência de publicidade da série  "Mad Men" da vida real no termo “designer gráfico” (ou "artista comercial", como alguns ainda se autodenominavam) aqueles que estavam produzindo logotipos corporativos e brochuras de vendas.

  • NORM

    Pôster da série "Superficial", criado pelo grupo NORM


Isso era antes. Há agora muitos outras, espero que menos falsificadas, formas de praticar o design gráfico, como a "Graphic Design Worlds" -  exposição que acontece até 27 de março no La Triennale Design Museum, em Milão - ilustra. Seu curador, Giorgio Camuffo, convidou 30 designers gráficos e equipes de design para mostrar como eles usam seu trabalho para explorar e interpretar o mundo ao seu redor, em outras palavras, como um meio de autoexpressão em vez de uma ferramenta de marketing.

Os resultados variam entre a identidade visual para o site WikiLeaks, cartas ornadas com vidro que exibem o nome de um colecionador de curiosidades científicas milanês do século 17, a uma análise da crise do lixo no sul da Itália ou uma réplica da cabana de madeira onde um designer trabalha, no interior da Inglaterra, além de muitos e muitos cartazes e livros.

Juntos, eles pintam um retrato alegre, eclético, muitas vezes provocativo do design gráfico contemporâneo, que é resumido pela longa lista de possíveis papéis para designers gráficos no catálogo. Há 46 no total. Artistas. Catalisadores. Artesãos. Curiosos. Editores. Empresários. Intérpretes. Solucionadores de problemas. Investigadores. Tradutores. Utopistas. E assim por diante.

  • NORM

    Pôster da série "Superficial", criado pelo grupo NORM


"Graphic Design Worlds" não é uma exibição programática. Ela não apresenta uma visão definitiva do design gráfico, mas permite que os designers explorem suas possibilidades. Eles trabalham em escalas diferentes, com objetivos diferentes, mas são sobretudo do sexo masculino, e geralmente brancos. Não que esta seja a única exibição a carregar essa culpa. O projeto tem sido esmagadoramente dominado por homens brancos há muito tempo, mas "Graphic Design Worlds" não ajuda ao ignorar a questão. Numa época em que tantos designers emergem na China e na Índia, bem como em partes da África e da América Latina, por que a exposição não inclui os trabalhos de, digamos, designers gráficos chineses como Liu Zhizhi e Guang Yu?

Dito isto, um dos pontos fortes de "Graphic Design Worlds" está nos designers escolhidos, que representam posições radicalmente diferente na exposição e em seus catálogos. Existem alguns pressupostos básicos. A maioria deles mantém o roteiro padrão, dizendo que os avanços na tecnologia transformaram o projeto gráfico ao ficar mais fácil produzir formas cada vez mais complexas, sofisticadas e expressivas. Há também uma queixa geral que, embora o design gráfico esteja mais visível e poderoso do que nunca, o resto da população (os 99,99% de nós que estudaram design) não o leva a sério o suficiente. Agora, você já encontrou algum grupo que acredita que a sociedade compreende o seu trabalho, e o valoriza corretamente?

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    Pôster da série "Superficial", criado pelo grupo NORM


O favorito como vilão da peça é Paul Rand, o falecido, grande designer americano do século 20 de logos corporativos como IBM, UPS, provavelmente por praticar a velha escola do design publicitário tão bem. Os candidatos mais indicados à disputa de herói e heroína são Anthony Dunne e Fiona Raby, designers de produto britânicos que foram pioneiros no movimento do “design crítico” ao usar o processo de design para produzir objetos conceituais, cuja função é analisar o design e seu impacto na sociedade. Grande parte do trabalho que está em "Graphic Design Worlds" aplica princípios semelhantes aos do design gráfico.

A exposição abre com um exemplo impressionante de gráficos conceituais de "Superficial", uma série de 64 atraentes cartazes serigrafados pelo grupo de design de Zurique chamado NORM. Ao criar diferentes combinações dos elementos-chave dos gráficos impressos, - forma, letras, imagens, cores, geometria e assim por diante - para cada pôster, o grupo NORM produziu uma compacta história visual do design gráfico.

  • NORM

    Pôster da série "Superficial", criado pelo grupo NORM


Outros designers criaram "mundos" microcósmicos, como a cabana de madeira tomada pelo designer britânico Anthony Burrill como seu estúdio de design. A agência de comunicações de Amsterdã KesselsKramer cobriu as paredes e o chão de uma galeria com seus cartazes, folhetos, livros e desenhos. M / M (Paris) encheu uma casa de bonecas com modelos em escala de cada objeto que criou. Geoff McFetridge, designer baseado em Los Angeles, pintou personagens de animação enormes, em cores vivas, nas paredes de uma galeria e construiu uma pequena sala quadrada no centro. Dentro dela, encheu de moldes de madeira esculpida com símbolos lúdicos, no mesmo estilo dos personagens.

Outro grupo de designers se concentra em questões políticas e ambientais. A análise da crise do lixo no sul da Itália é o trabalho da Brave New Alps, um dos jovens grupos de design italiano em destaque numa área especial da exposição. Mas o grupo Metahaven, de Amsterdã, rouba a cena com uma instalação elegante e eloquente sobre a identidade visual que eles sonharam para o WikiLeaks.

Ao invés de esperar os clientes encomendarem o que querem, o Metahaven (Vinca Kruk e Daniel van der Velden) define a sua própria agenda, identificando quais os projetos querem adotar e trabalhar. Eles se aproximaram do WikiLeaks em junho do ano passado, vários meses antes de ele se tornar a sensação na mídia. A identidade que desenvolveram utiliza camadas de textos parcialmente obscurecidos para refletir a tensão entre a natureza intensamente secreta do trabalho do WikiLeaks e sua luta pela transparência. WikiLeaks agora está considerando a possibilidade de adotá-la.

Você pode conhecer melhor o papel do Metahaven como um grupo de design provocador no catálogo de "Graphic Design Worlds", o qual descreve o uso de "design especulativo" para antecipar mudanças radicais em um ensaio que leva (vamos dizer) uma visão Papanekeana da maioria dos outros designers, gráficos e afins. 

 

Tradutor: Erika Brandão

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