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10 expressões curiosas e ditos populares com origem na arquitetura

Colaboração para o UOL, em São Paulo

08/08/2016 10h00

A língua portuguesa está cheia de ditos curiosos e a arquitetura contribuiu para moldar alguns deles como "sair pelo ladrão" e "sem eira nem beira". Veja 10 dessas expressões e conheça seus significados e origens (hipotéticas ou não!). Ah! E se você souber outras histórias que expliquem esses jargões ou se lembrar de mais frases e palavras curiosas, conte 'pra' gente nos comentários.

Fontes:  Adalberto da Silva Retto Jr., pós-doutor em arquitetura e professor de Desenho Urbano e História do Urbanismo da Unesp (Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - campus Bauru); José La Pastina Filho, arquiteto e superintendente do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) no Paraná; Karina Leitão, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP).

Para saber mais, acesse: "Eram as telhas feitas nas coxas das escravas?", artigo do professor José La Pastina Filho, e a página da Mies van der Rohe Society. Leia: "Locuções Tradicionais do Brasil", Luís da Câmara Cascudo. Consulte: "Dicionário da Arquitetura Brasileira", Eduardo Corona e Carlos Alberto Cerqueira Lemos.

  • Marcos Inoue/ Arte UOL

    Sem eira nem beira

    "Olha lá, o fulaninho! Não tem eira, nem beira!" Quantas vezes você ouviu isso na vida? A expressão que indica pobreza veio da arquitetura. O professor da Unesp, Adalberto da Silva Retto Jr., explica que eira designa o terreno onde os cereais eram debulhados e secos. Por sua vez, beira seria a beirada desse espaço. Dessa forma, quando uma eira não tinha beira, os grãos eram levados pelo vento e o dono ficava "a ver navios". Ah, conhece outra versão da história? Pois ela é típica das regiões Norte e Nordeste do Brasil, onde o jargão derivou de outra explicação: "As antigas casas dos ricos tinham um telhado triplo, composto de eira, beira e tribeira, esta a parte mais alta da cobertura. Os mais pobres acabavam construindo somente a tribeira, ficando assim 'sem eira e nem beira'", completa Retto.

  • Marcos Inoue/ Arte UOL

    Sair pelo ladrão

    "Estava lotado, saía gente pelo ladrão!" Usamos com frequência essa frase para expressar algo em grande quantidade e ela não tem nada a ver com 'meliantes' que praticam roubo ou furto. O 'ladrão' em questão faz parte do mundo da hidráulica e é o tubo ou saída para o escoamento do excesso de líquido, por exemplo, das caixas d'água. Quando dizemos que alguma coisa está "saindo pelo ladrão" significa que aquilo está tão cheio que periga extravasar, transbordar.

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    Feito nas coxas

    Quando você se depara com um trabalho realizado sem capricho, possivelmente vem a sua mente a expressão "feito nas coxas". A explicação mais disseminada está ligada à produção de telhas tipo 'capa e canal', no Brasil colonial. Tais telhas, quando moldadas em diferentes coxas de escravos, ganhariam encaixes imperfeitos e essa falta de padrão teria originado o jargão de cunho pejorativo e racista. O arquiteto e superintendente do Iphan, José La Pastina Filho, desmistifica a crença: "Para confirmar nossa convicção das inconsistências da assertiva popular (...) tomamos as medidas das coxas de um homem com 1,80 m e verificamos que, usando-a como molde, só seria possível a fabricação de uma pequena telha com 36 cm de comprimento".

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    'Menos é mais'

    Será que o arquiteto alemão Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969) ficaria espantado com a fama da sua frase "menos é mais" ("Weniger ist mehr", em alemão, ou "Less is more", em inglês)? O projetista pode até não ter sido o único a usar a expressão, mas certamente a incorporou e popularizou. A citação se relacionava com a arquitetura racionalista e seus preceitos minimalistas, praticada por Mies. No entanto, hoje em dia, a expressão vai além do campo arquitetônico: em diferentes situações do cotidiano, nós a proferimos quando queremos afirmar que é possível viver feliz com menos ou quando achamos que é melhor 'não exagerar'. Na TV, o chef Henrique Fogaça, jurado do MasterChef, costuma bradar a frase para os participantes.

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    Casa da mãe joana

    E se alguém dissesse que seu querido lar é como a "casa da mãe Joana"? Garanto que você não iria gostar, afinal, a expressão popular se refere a um lugar sem regras ou normas de conduta, onde impera a ba-gun-ça. Conforme explica o historiador Luís da Câmara Cascudo, o nome Joana usado na frase está ligado à Joana I, rainha de Nápoles e condessa de Provença, que viveu no século 14. Em 1347, aos 21 anos, ela regulamentou os prostíbulos da cidade francesa de Avignon, onde vivia refugiada. Uma das particularidades dos locais seria ter uma porta por onde todos pudessem entrar. Desse modo, a "casa da mãe Joana" virou sinônimo de bordéis ou locais onde há confusão.

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    Empena cega

    Não fique triste achando que há problemas de visão envolvidos nessa história! O termo 'empena', em arquitetura, pode se referir a qualquer parede lateral de uma casa, em especial, àquela que se encontra na divisa do terreno. O adjetivo 'cega' apenas indica que nela não há qualquer abertura para iluminação, ventilação ou passagem. Nos edifícios da cidade de São Paulo, por exemplo, antes da implantação da lei "Cidade Limpa", esses grandes paredões sem janelas ou portas serviam como plataformas publicitárias do tipo "outdoor". Hoje em dia, muitas dessas empenas cegas, verdadeiras "telas em branco", foram transformadas por grafiteiros em peças de uma grande galeria a céu aberto.

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    Partido

    A polissemia é uma área da linguística que estuda palavras que possuem a mesma grafia, mas significados distintos a depender do contexto em que estão inseridas. O termo 'partido' é um desses exemplos: pode ser a organização de fim político (partido 'dos coxinhas' ou 'dos petralhas'); a forma de tirar vantagem ou proveito ou a maneira de tomar decisão ou resolução. Entre os mais de dez sentidos dessa palavra tão surrada, temos também o partido arquitetônico. E este termo pomposo nada mais é do conjunto de diretrizes gerais para a elaboração de um projeto. Tá difícil? Faz parte do "partido" o sistema estrutural e a verba disponível, por exemplo.

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    Laje

    Hoje vai ter festa na laje? Em São Paulo, talvez não, mas no Rio, com certeza. Quem é que nunca ouviu esse termo associado aos morros da capital fluminense? Na arquitetura formal, a palavra 'laje' consiste em uma placa contínua que cobre um pavimento e serve de teto para a edificação ou dá forma ao piso/ teto entre dois pavimentos. Contudo, nas construções situadas nas periferias das cidades brasileiras, o vocábulo ganhou contornos mais festivos. Para a professora de arquitetura, Karina Leitão, a termo deixa de ser um elemento construtivo e passa a ter todo um sentido socioespacial. "A laje virou o lugar do banho de sol, do churrasco, da música popular. É o local de moradia de mais um membro da família, o cômodo que vai servir de aluguel para ajudar a compor a renda familiar", explica Leitão.

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    Tesoura

    Pensar em ter uma 'tesoura' sobre a cabeça pode parecer temeroso e, você pode até não se dar conta, mas já viu e teve várias bem neste ponto em diferentes lugares e momentos. O termo não é uma ameaça constante de perigo e nem sequer oferece risco de corte: as tesouras são armações de madeira que correspondem a um sistema de vigas dispostas de maneira cruzada e com dois apoios. Essas estruturas triangulares são comumente usadas para sustentar telhados que cobrem grandes vãos, sem precisar do auxílio de paredes internas, como em galpões ou nas casas antigas.

  • Marcos Inoue/ Arte UOL

    Pé-direito

    Você já deve ter escutado a expressão "pé-direito" por aí. É possível, também, que não consiga explicá-la com clareza, mas provavelmente a associa à altura de uma casa ou apartamento. O professor e pós-doutor em arquitetura, Adalberto da Silva Retto Jr., conta que os arquitetos e engenheiros no período colonial teriam usado essa expressão para nomear as estacas de madeira que sustentavam as estruturas de uma construção. A ideia faz sentido, porque 'pé' também significa árvore e 'direito' pode designar algo que está a prumo, em ângulo reto. "Assim como coloca o arquiteto Carlos Lemos, um dos autores do 'Dicionário da Arquitetura Brasileira', com o passar do tempo, o espaço do teto ao chão, que dependia do tamanho do apoio de madeira que escorava a edificação, começou a ser chamado de 'pé-direito'".