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O novo síndico é profissional, graduado e adepto da internet

Entre as atribuições mais importantes do síndico estão preservação do patrimônio e a prestação de contas aos condôminos - Getty
Entre as atribuições mais importantes do síndico estão preservação do patrimônio e a prestação de contas aos condôminos Imagem: Getty

THIAGO OLIVEIRA

Colaboração para o UOL

18/07/2010 10h00

A figura caricatural do síndico remete a um senhor meio ranzinza, avesso a modernidades, que faz da atividade a grande ocupação dos seus dias de aposentadoria. Essa figura certamente ainda existe, ralhando com crianças barulhentas e preenchendo recibos à máquina de escrever, mas já faz tempo que deixou de ser regra nos condomínios.

"O síndico, hoje, tem uma atribuição muito mais profissional do que tinha no passado", resume Marcelo Borges, diretor jurídico adjunto da Abadi (Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis). "Do ano 2000 para cá, em razão das obrigações que se multiplicaram, nós assistimos ao fim do síndico amador, que administrava o condomínio de forma caseira".

Responsável pela manutenção da ordem e do bom convívio social nos condomínios, o síndico tem suas competências legais regidas pelo artigo 1.348 do Código Civil. São ao todo nove itens, que abrangem desde a cobrança da taxa condominial até a preservação dos equipamentos de uso comum, passando pelo pagamento de obrigações trabalhistas aos funcionários e também por uma rigorosa prestação de contas aos condôminos.

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Na análise de Marcelo Borges, a profissionalização que se observa no síndico atual é motivada pelo novo relacionamento que se instaurou entre condomínio, Estado e o mercado. "As legislações modernas passaram a enxergar o condomínio como um protagonista atuante nas obrigações e responsabilidades contratuais, tributárias e trabalhistas. Afinal, o condomínio se relaciona com muita gente, contrata empresas, recruta mão-de-obra".

Para atender às novas demandas, o síndico precisou evoluir. A escolaridade aumentou e o contato com recursos tecnológicos, também. De acordo com levantamento feito por uma administradora em 20 mil condomínios de São Paulo, 81% dos síndicos da cidade têm curso superior ou de pós-graduação. Além disso, 37% se valem das facilidades da internet nas suas gestões – índice que era de apenas 10% em 2003.

Na espreita dessa evolução está o aumento da fiscalização por parte dos condôminos. "Principalmente quando há a assessoria de uma administradora moderna, o condômino tem acesso ao saldo das contas diariamente pela internet, o que estimula o acompanhamento com muito mais assiduidade e diminui eventuais fraudes", aponta o diretor da Abadi.

Autonomia para tomar decisões

O Código Civil também é a base que define até onde vai a autonomia do síndico e em que situações ele precisa solicitar aprovação da assembleia de condôminos. Certas iniciativas o gestor não só pode como deve ter por conta própria, como a realização de uma apólice de seguro para o edifício, a cobrança (em âmbito judicial, se necessário) de taxas condominiais atrasadas e a aplicação de multas – apenas quando devidamente previstas no regulamento interno, na convenção e no próprio Código Civil.

A fim de não engessar o trabalho do gestor, a legislação federal concede ainda outras liberdades. A contratação e demissão de funcionários, por exemplo, pode ser feita sem necessidade de comunicação à assembleia, assim como a execução de obras emergenciais de baixo custo, desde que respeitados os limites de gastos firmados em convenção.

Para outras diversas situações, no entanto, há necessidade de convocação de reunião – a começar por obras que exijam um volume maior de recursos, como a pintura da fachada do prédio ou mesmo a construção de uma churrasqueira. Outro exemplo é a alteração de normas do regulamento interno, para a qual é preciso aprovação de dois terços dos titulares das frações ideais do condomínio.

A violação de algumas dessas determinações pode acarretar em uma série de problemas ao administrador. “Existem vários exemplos de atos omissivos e comissivos praticados pelo síndico que podem sujeitá-lo a responder pessoalmente em virtude de negligência, imperícia ou imprudência”, afirma Marcelo Borges.

Um caso de potencial processo civil se configura quando um acidente é causado por defeito em algum equipamento de uso coletivo do prédio, como azulejos rachados em piscinas ou brinquedos de playground enferrujados.

“Se o condomínio tiver de indenizar alguém, o síndico pode muito bem ser responsabilizado por sua negligência, uma vez que tem por missão cuidar da manutenção do patrimônio comum”, afirma o diretor jurídico da Abadi.

Já a responsabilização criminal acontece, por exemplo, em casos de apropriação indébita de fundos do condomínio, ou de verbas previdenciárias de funcionários. Nesses cenários, a pena inclui multa e cumprimento de um a cinco anos de prisão.

Há 26 anos no comando de 236 apartamentos

Além de uma maior profissionalização nos mecanismos de trabalho, o sucesso como síndico requer certas habilidades pessoais que não se encontram em qualquer pretendente ao cargo. Quem ensina é Izabel Rodrigues Massini, 83 anos, desde 1984 no comando do edifício Regente Feijó, um colosso de 236 apartamentos localizado na Praça da Liberdade, região central de São Paulo.

“Minha grande obra nesses 26 anos como síndica, e que alimento a cada dia, é o respeito que conquistei de condôminos e funcionários”, orgulha-se, lembrando de pessoas que trabalham há mais de 30 anos no edifício, mesmo oficialmente aposentadas.

Essa conquista, conforme relata a síndica, é efeito de muito bom senso na mediação de conflitos, honestidade na gestão das finanças e paciência no cumprimento das responsabilidades cotidianas. No quesito “resultados práticos” do seu trabalho, tem uma lista para citar. “Quando assumi, o prédio não tinha nada: antena coletiva, interfones, luzes de emergência, corrimãos nas escadas. Foi tudo feito na nossa gestão”.

Izabel Massini dispõe do auxílio de uma empresa administradora para calcular folhas de pagamento e montar demonstrativos financeiros, mas faz questão de realizar cada acerto pessoalmente – seja com prestadores de serviço, seja com funcionários.

Os cheques são assinados por ela e pela sub-síndica, e os canhotos, posteriormente enviados à administradora. Também cuida de manter sempre um fundo de caixa, de modo a evitar rateios constantes entre os moradores.

Dedicada em tempo integral à função, Izabel recebe um pró-labore de R$ 800,00 por mês. Sua reeleição ocorre quase automaticamente a cada dois anos – prazo legal do mandato do síndico. “Ninguém mais se interessa em pegar o abacaxi” brinca, consciente de que será difícil surgir um candidato que faça frente à sua experiência, jogo de cintura – e disposição! – para lidar com os assuntos do condomínio.