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Entidades constroem casa de 70 m² por R$ 60 mil em reserva indígena

O telhado da casa de Lorraine Nakai aponta para as colinas da Nação Navajo, uma área de 71 mil km² (EUA) - Tony Cenicola/The New York Times
O telhado da casa de Lorraine Nakai aponta para as colinas da Nação Navajo, uma área de 71 mil km² (EUA) Imagem: Tony Cenicola/The New York Times

Sarah Amelar

The New York Times, Bluff, Utah (EUA)

19/08/2013 07h02

Quando um grupo sem fins lucrativos abordou Lorraine Nakai, em 2011, e se ofereceu para construir uma casa para ela, Lorraine foi pega de surpresa. Embora o seu ativismo na comunidade tenha melhorado as condições de moradia de outros Navajos na reserva, nunca lhe ocorreu procurar nada para si. “Eu nem sabia que seria indicada”, argumenta. “E estava hesitante, me sentindo desconfortável com a situação”.

Finalmente, ela superou seus medos. E oito meses depois, Lorraine, uma poeta e entomologista, se estabeleceu em uma nova casa na fronteira norte da Nação Navajo, numa área do sudeste de Utah com 71 mil km², habitada por sua família há gerações.
 
A equipe de projeto e construção consistia em oito estudantes de arquitetura que participavam de um empreendimento conjunto entre a Universidade do Colorado e a DesignBuildBLUFF, uma organização em Bluff, Utah. Fundado em 2004 por Hank Louis, um jornalista que se tornou arquiteto, o grupo sem fins lucrativos foi moldado com base no Rural Studio - o programa de projetos de construção com base no Alabama - no tocante à sua ênfase em reciclagem criativa e em dar aos estudantes experiência prática numa comunidade carente. 
 
Como descreveu Rick Sommerfield, atual instrutor da Universidade do Colorado: “É um programa imersivo em outra cultura, assim como estudar no exterior, em um país do terceiro mundo, só que isso acontece dentro dos Estados Unidos”.  
 
Lorraine, 56 anos, passou muito de sua infância na Nação Navajo, mas como suas irmãs e, depois, os dois filhos adultos, deixou a reserva para correr atrás de sua educação e carreira. Ela estava trabalhando em entomologia numa fazenda corporativa no Novo México quando sua avó e, na sequência, sua mãe morreram. Não havia mais ninguém para cuidar da propriedade da família, um aglomerado de pequenos edifícios degradados naquele deserto escassamente povoado.
 
Elevando-se sobre um local plano e onde venta muito está um moinho bombeador de água que os pais de Lorraine trouxeram, pedaço por pedaço, do Novo México nos anos 1960. Sempre que a poeta ia até a propriedade - depois da morte de sua mãe - caía em lágrimas ao observar o moinho sumir pelo retrovisor. O equipamento representava não somente as memórias de infância, mas também o duro investimento de seus pais em água, um bem precioso na região. Assim, Lorraine sabia que tinha que voltar.
 
Então em 2001, a poeta se mudou para a cabana de pedra de sua avó e a encheu com os quase 2.000 livros que precisava para educar em casa seu “filho talentoso e intelectualmente indisciplinado”, conta. (Agora com 23 anos, ele é técnico em emergências médicas).
 
A nova casa, no velho coração índio
 
Quando os estudantes de arquitetura chegaram, a cabana estava em condições tão precárias que a restauração significaria demoli-la. Então, começaram do zero. O orçamento era de US$ 25 mil para uma casa com 70 m² e prazo de onze semanas para a construção.
 
Lorraine, que ensina o idioma Navajo, além de ciências e matemática em meio período numa escola local, queria um espaço flexível onde pudesse se concentrar na pintura, na poesia e na pesquisa agrícola. Um espaço em que pudesse, também, selecionar as formações geológicas que ela associava aos seus ancestrais.
 
Suas histórias inspiraram o longo telhado de aço corten que aponta em direção à colina - que ela amava escalar quando criança - e a uma árvore solitária que sobrevive no bosque da família. Os demais materiais de construção foram, em sua maior parte, reaproveitados, reciclados, doados ou obtidos a preços muito baixos.
 
Na casa, uma estante de 15 metros de comprimento domina o espaço organizado como em um loft. O banheiro é acessado por uma porta escondida nessa estrutura e até mesmo a cama de Lorraine faz parte da estante, um cantinho que ela chama de “minha cabine de iate”.
Agora capaz de focar no seu trabalho criativo, a poeta afirma que a casa lhe deu uma base sólida. “Esta transformação continua acontecendo”, acrescentou. “Ainda me surpreende que esta casa seja minha”, conclui.