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Mesmo sem talento artístico, muitos buscam fama a qualquer custo

Para sonhar com a fama, é preciso estar preparado para um possível fracasso - Thinkstock
Para sonhar com a fama, é preciso estar preparado para um possível fracasso Imagem: Thinkstock

Giovanny Gerolla

Do UOL, em São Paulo

08/08/2013 07h07

Ser capa de revista, estrelar campanhas publicitárias, além de usufruir dos melhores serviços de cabeleireiro e maquiagem do país e ainda ganhar cachê para vestir as mais belas produções de moda: quem não gostaria?

Todos querem ser maravilhosos, porque esse é um dos padrões de sucesso da sociedade contemporânea: "A valorização do visual e do espetáculo é algo que surgiu e evoluiu no século 20, com grande influência da TV, do cinema e, agora, das multimídias e redes sociais", afirma Lisete Barlach, psicóloga e professora doutora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP (Universidade de São Paulo). 
 
Para ela, as redes sociais multiplicam as possibilidades de exposição pública. "Todos têm de saber o que um faz ou representa. Nosso parâmetro de bem-estar e felicidade ficou intimamente ligado à fama e à superexposição", afirma.
 
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Atriz, cantora e produtora de elenco da O2 Filmes, Paula Pretta pergunta: "Quem não quer dar um passo numa festa e levar R$ 600 mil?". Muitos dos que buscam a fama se iludem com fortunas prometidas e convites para áreas VIPs em encontros glamourosos da mais alta sociedade, holofotes e câmeras das emissoras de TV. 
 
O outro lado é o da falta de privacidade, o assédio quase insuportável de jornalistas nos momentos mais tristes e difíceis da vida (como no divórcio ou na morte de um ente querido) e a total falta de liberdade para dizer o que pensa, quando quiser. 
 
"Tem de ter muito jogo de cintura e maestria para manter a postura sempre exemplar", afirma Pretta, que lida diariamente com dezenas de currículos e portfólios para testes de gente cheia de esperança.  
 
Para sobreviver como famoso, é necessário saber bem qual é seu lugar no mundo da fama: "Este é um tipo de inteligência emocional indispensável para não transformar tudo em deslumbramento e frustração", explica a produtora e atriz. "No caso das celebridades que não se firmam na mídia de forma duradoura, é preciso ter estabilidade emocional para lidar com a queda: hoje, você está em cima; amanhã, ninguém lembra que você existe", diz ela.
 
 
Por outro lado, é preciso saber que a vida do artista que chegou à novela do horário nobre não é fácil. Ele passou por cursos de interpretação, fez figuração em filmes, minisséries e outros programas de TV (muitas vezes anos a fio, em participações inexpressivas), além de ter passado por incontáveis processos seletivos e visto portas se fecharem em muitas dessas oportunidades. 
 
Em muitos casos, ser famoso implica em estar sempre bonito. "Não só as empresas anunciantes querem a perfeição associada aos seus produtos como o público espera e exige que a beleza ideal, do espetáculo, mostre sua cara", diz Pretta.  
 

Vontade de aparecer, e daí?

 
Chamar a atenção é querer trazer para si os olhos do maior número possível de pessoas. "Desejar ser visto e ouvido é algo inerente ao ser humano, comportamento que pode ser observado desde a infância", afirma o psiquiatra Eduardo Adnet. 
 
Os motivos pelos quais alguém precisa de atenção podem variar em cada indivíduo, mas todos buscam reconhecimento. Lisete Barlach, da USP, concorda que não há dúvida da existência de uma vontade de realização egocêntrica ou ímpeto narcisista.  
 
Esse tipo de pessoa presta muito mais atenção em si mesma do que em qualquer outro ser humano. "É comum tenderem a buscar um reconhecimento, sem terem muito a oferecer em troca", diz Adnet. O problema é que isso gera decepção, frustração e antipatia de quem está próximo. 
 
Além das razões individuais para a vontade de ser midiático, ferramentas culturais como as de comunicação de massa (como o "Big Brother Brasil") são veículos da hiperexposição e promovem muito rápido a fama baseada em aspectos exteriores, mais superficiais. "O 'BBB' enfatiza a aparência, o corpo e a sensualidade –coisas importantes na vida, só que não são tudo", diz Lisete. 
 
Para ela, a profundidade do ser humano vai muito além da beleza física, mas a essência das pessoas que participam de um reality acaba ofuscada pelo mito do espetáculo, que toma conta não só dos próprios participantes do programa, enquanto jogam, mas do público, que acompanha todos os conflitos, fraquezas e vitórias, como se fossem seus. 
 
 
Porém, o problema maior está no fato de a busca excessiva do reconhecimento público ter se tornado sinônimo de sucesso. "Não há escapatória: não consigo ser bem-sucedido, se não cuidar da minha imagem, fazer bom marketing pessoal e político, de forma estratégica e planejada", diz a professora da USP. 
 
Daí em diante, como a imaginação humana gosta de voar alto, a ideia de ser reconhecido se confunde facilmente com a possibilidade de desfilar sob os holofotes. "Ser celebridade é ser um produto, daqueles que mais vendem", define a produtora de elenco Paula Pretta. A confusão ocorre porque alguns artistas, mais visados, carregam consigo nomes que viraram grifes. 
 

Busca por reconhecimento

 
Os artistas, que estão na labuta por um emprego, querem ser famosos, pois isso faz parte do seu cotidiano. "Admita ou não, o que ele quer é ser entendido, se comunicar", diz Pretta, que encara o fato com bastante naturalidade, sem preconceitos nem pudores. 
 
Ela mesma já foi escalada para atuar ao lado de grandes nomes do cinema e da TV, como Glória Pires ("É Proibido Fumar") e Selton Mello ("O Cheiro do Ralo"). "O artista que diz que não precisa ser reconhecido está mentindo".

A busca pela notoriedade pode virar doença de verdade. "Esses transtornos estão muito ligados a quadros de depressão e ansiedade", afirma o médico Eduardo Adnet. "Acredito que o apego excessivo a si próprio, o culto ao corpo, o materialismo e o consumismo desenfreados têm se mostrado insalubres para a mente das pessoas", conclui Adnet.