Topo

Desejo sexual por idosos pode não ser natural; entenda a gerontofilia

Para diferenciar o assédio da relação saudável, é preciso oberservar suas motivações - Arte/UOL
Para diferenciar o assédio da relação saudável, é preciso oberservar suas motivações Imagem: Arte/UOL

Thais Carvalho Diniz

Do UOL, em São Paulo

13/11/2015 08h05

O interesse amoroso exclusivo por pessoas em média 40 anos mais velhas e o desejo sexual por características físicas próprias da velhice --como cabelos brancos e pele flácida e enrugada-- podem ser sinais de gerontofilia. A atração patológica é uma parafilia --categoria de distúrbios psíquicos que se caracterizam pela preferência por práticas sexuais incomuns, como o sadomasoquismo e o voyeurismo.

"A diferença de idade por si só não caracteriza o transtorno. A gerontofilia é diagnosticada quando existe uma discrepância vulgar --como no desejo por crianças--, e o indivíduo não consegue ter relações com pessoas de faixa etária próxima à sua", afirma Ricardo Barcelos, da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).

Os especialistas entrevistados pelo UOL alertam para o cuidado que se deve ter para não generalizar. A atração genuína por pessoas mais velhas acontece por admiração à experiência, naturalmente adquirida com o passar dos anos e, claro, afinidades e atrativos físicos. O gerontófilo, por sua vez, é motivado por desejos torpes de manipulação por perceber o idoso como alguém vulnerável.

“O envelhecimento e as mudanças biológicas associadas à sexualidade na velhice não impossibilitam relações saudáveis com adultos jovens. É inconcebível tratar como perversão as relações românticas e sexuais entre pessoas conscientes de suas escolhas apenas com base na distância entre os anos que nasceram”, afirma Mara Lúcia Madureira, psicóloga cognitivo-comportamental.

A sexóloga forense Dalva Cutrim, professora da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de Goiás, afirma que a patologia é reconhecida por um conjunto de sintomas, entre os quais, tendências sádicas e problemas para conviver em sociedade.

"A gerontofilia é uma característica de pessoas com traço de personalidade infantil e conflitos sexuais. A condição requer obrigatoriamente a possibilidade de abusar de um idoso para obter satisfação no sexo. Comumente está ligada a outros transtornos de personalidade antissocial, como a esquizofrenia", diz.

O indivíduo nem sempre é capaz de identificar os sinais do problema. Por isso, familiares e amigos é que vão perceber que o desejo virou uma obsessão. De acordo com Mara Lúcia Madureira, para diferenciar um relacionamento patológico do saudável, é preciso observar as motivações de cada um.

“Fantasias são consideradas perversas quando chegam ao ponto de exigir a participação do outro sem consentimento e envolver humilhações. Quando o interesse sexual incomum se torna insubstituível, é preciso procurar ajuda”, fala.

Ainda segundo a especialista, a gerontofilia pode ter origem na infância ou no início da adolescência. Torna-se mais frequente na idade adulta e costuma persistir por toda a vida. 

Por ser um transtorno psicológico, o gerontófilo vive em situação de conflito e angústia, pois, por mais forte que sejam seus desejos, precisa reprimi-los. Dessa forma, pode sofrer de depressão e suas consequências.

“Se ele manifesta o que quer, sofrerá com o preconceito. Se for descontrolado e impulsivo, a tara poderá levá-lo a cometer abusos e consequentemente à criminalidade”, fala Dalva. Sobre a vítima, a sexóloga forense diz que, tanto as violências físicas --estupro, por exemplo-- quanto as morais --como assédio-- acabam em traumas graves.

De acordo com Ricardo Barcelos, especialista da ABP em psiquiatria geriátrica, o primeiro passo é ter o diagnóstico com base em uma avaliação psicoterápica. “A psicoterapia é uma opção que deve ser levada em conta. O uso de medicamentos --para conter os impulsos e o desejo sexual-- deve ser alternativa para um segundo estágio e para casos mais graves.”

A vigilância por parte de familiares e pessoas próximas, como destaca Mara Lúcia, pode inibir as oportunidades e evitar a exposição a situações de risco e de estresse, que fazem aflorar o transtorno. “A ajuda de quem está por perto é essencial para que o gerontófilo controle seu desejo, o que é perfeitamente possível, e assim não cause prejuízos a si mesmo e ao próximo.” 

A lei

Diferentemente do desejo sexual por crianças, a simples atração por pessoas da terceira idade não configura crime. Porém, a violência sexual contra pessoas com mais de 60 anos é um agravante de qualquer ato criminoso. Qualquer ato contra a integridade do idoso resulta em um acréscimo de um terço sobre a pena original.

Para denúncias, o Estatuto do Idoso, juntamente com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, disponibiliza o canal Disque 100 --além das delegacias especializadas. Segundo dados do Disque 100, cerca de cem casos foram registrados no Brasil, em 2015.