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Enxergar-se diferente não é frescura; entenda a doença de Daiana Garbin

A jornalista diz que a primeira lembrança de não gostar do seu corpo foi aos cinco anos  - Arquivo pessoal
A jornalista diz que a primeira lembrança de não gostar do seu corpo foi aos cinco anos Imagem: Arquivo pessoal

Thais Carvalho Diniz

Do UOL, em São Paulo

30/06/2016 07h10

O Transtorno Dismórfico Corporal (ou de distorção de imagem) é uma doença psiquiátrica que se caracteriza principalmente por uma preocupação excessiva com uma ou mais partes do corpo. O TDC --que ganhou destaque quando a ex-repórter da Globo Daiana Garbin assumiu sofrer dele-- pode estar relacionado a um "defeito" real ou imaginário.

"Muitas vezes, a pessoa tem um pequeno desvio no nariz, por exemplo, mas enxerga aquilo como um grande problema, o que causa sofrimento a ela. Podemos nos sentir insatisfeitos com algo no nosso corpo, mas isso não pode se tornar um inferno na vida de ninguém", afirma Eduardo Aratangy, do Ambulim (Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP).

Tratado muitas vezes como frescura ou vaidade excessiva pelos próprios pacientes ou pelos que estão à sua volta, o transtorno pode ser diferenciado dessas duas características muito facilmente, segundo José Carlos Appolinário, da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), já que a doença interfere no desempenho dos papéis sociais.

"O paciente com TDC perde horas do dia se olhando no espelho tentando pensar em algo para disfarçar o 'defeito', deixa de sair de casa e compartilhar momentos com amigos e familiares porque não consegue lidar com o problema", diz Appolinário.

Um caso bastante usado como exemplo pelos psiquiatras é o de Michael Jackson. Em novembro de 2010, pouco mais de um ano após a morte do cantor, Katherine Jackson disse, em entrevista à apresentadora americana Oprah Winfrey, que o filho era "muito inseguro em relação à aparência desde a adolescência e viciado em cirurgias plásticas".

Independentemente dos outros fatores que influenciaram a transformação de Jackson, os procedimentos estéticos repetidos e a "feiura imaginária" que o incomodava desde a juventude são sinais claros do TDC. 

Segundo Ana Clara Floresi, também psiquiatra do Ambulim, o diagnóstico demora porque as pessoas procuram dermatologistas e cirurgiões plásticos para tratar algo que acreditam ser estético, mas que é mental.

"Estudos mostram que dois terços dos quadros começam antes dos 18 anos. A adolescência é a época de maior incidência justamente pelas mudanças que o corpo passa e que podem gerar infelicidade", fala Ana Clara.

Particularidades da face (nariz, olhos, orelhas, a própria pele e o cabelo) são os maiores culpados pela incidência do TDC. Entretanto, barriga, músculos, tronco, coxas e pés também são motivo de sofrimento para alguns.

"Os pacientes vivem um calvário, comprometem o orçamento com tratamentos estéticos e continuam se sentindo mal, porque não é aquilo que vai resolver", afirma Appolinário.

O diagnóstico é feito por uma análise psiquiátrica, mas o tratamento deve ser psicoterapêutico, de preferência cognitivo-comportamental. "O problema é crônico, a terapia ajuda o indivíduo a se aceitar. Quando necessário, também existe um arsenal medicamentoso que o psiquiatra pode recomendar", declara Aratangy.

E atenção! Segundo os especialistas, para chegar à raiz do problema, os pacientes precisam da ajuda de familiares e amigos para notar a preocupação descabida. Além disso, comorbidades são regra nesse caso.

"Transtornos depressivos são os mais frequentes, mas o TDC também pode estar associado a problemas de ansiedade --como fobia social--, TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo) e transtornos de personalidade e alimentares", diz Ana Clara.

TDC x transtornos alimentares

Para diferenciar o TDC de um incômodo comum com a aparência, observe quanto tempo da sua vida você perde em função deste 'defeito' - Getty Images - Getty Images
Para diferenciar o TDC de um incômodo comum com a aparência, observe quanto tempo da sua vida você perde em função deste 'defeito'
Imagem: Getty Images

O TDC não é um transtorno alimentar, por isso não está ligado à bulimia ou anorexia necessariamente. Para não confundir, é preciso entender que quem tem a distorção de imagem não terá questões alimentares claras, como vômito e perda radical na balança.

"A pessoa pode apresentar uma preocupação com o peso, querer esconder o corpo, mas não terá um comportamento alimentar distorcido. De qualquer maneira, quando o peso está envolvido, uma avaliação bastante criteriosa é necessária para descartar problemas alimentares", afirma Ana Clara.

Para o psicoterapeuta e especialista em transtornos alimentares Marco Antonio de Tommaso, o “bombardeio” de padrões de beleza também é desencadeador do mal nos jovens.

"Existe uma pressão muito grande na cultura ocidental sobre o corpo magro, que seria mais bonito e preferencial. Dessa forma, é muito frequente nos enxergarmos mais gordos do que somos", declara Tommaso.

No vídeo de estreia de seu canal no You Tube, "Eu Vejo", no qual fala sobre insatisfação com o corpo, Daiana Garbin contou que, desde os cinco anos, "odiava o próprio corpo" e que há cerca de um ano foi diagnosticada com TDC.

Corpo ideal

Ao UOL, Daiana, 34, falou que entre os 20 e 30 anos se submeteu a três lipoaspirações e diversos tratamentos estéticos para corrigir seu corpo, que para ela é gordo.

"Eu me enxergo grandona, mais alta, com uns 100 kg. Meus ombros e braços são muito largos, coxas e cintura também. Mesmo quando me comparo aos outros ou ao meu marido --o apresentador Tiago Leifert--, sempre me acho maior e mais gorda", fala Daiana.

A jornalista contou que "todas as massagens e soluções de capa de revista" já a seduziram e fez de tudo, mas que a maior loucura foi se "encher de remédio para emagrecer", quando ainda era adolescente.

"Tomei tantos que, aos 23 anos, tive depressão e a razão foi o excesso de medicamentos, segundo os médicos que me trataram", diz.

Sobre o trabalho na televisão, Daiana diz que foi uma batalha conseguir, mas que há muito tempo já havia se tocado de que tinha um problema e não poderia deixá-lo prejudicar a carreira que escolheu. "Eu me queixava diariamente e tenho sorte porque minha família, amigos e colegas de trabalho sempre foram sensíveis e me entenderam, não viam como uma bobagem", afirma.

Hoje, ela faz terapia de uma a duas vezes por semana e diz acreditar que o novo trabalho e o tramento a colocaram no caminho certo. "Antes, todos os dias eram ruins. Agora consigo me olhar no espelho, achar bonito e aceitar meu corpo do jeito que ele é. Outro grande objetivo é fazer as pazes com a comida e ter uma vida cada vez mais saudável"