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Trans diz que foi demitida após pedir nome social em crachá e acusa empresa

Ana Alice Agostinho Ribeiro da Costa foi demitida da empresa sem receber qualquer feedback negativo - Arquivo Pessoal
Ana Alice Agostinho Ribeiro da Costa foi demitida da empresa sem receber qualquer feedback negativo Imagem: Arquivo Pessoal

Thamires Andrade

Do UOL

16/02/2017 15h12

A funcionária Ana Alice Agostinho Ribeiro da Costa, 31, foi contratada pela empresa Everis como especialista em gerenciamento do relacionamento com clientes, para trabalhar nas instalações da TIM, em Santo André (SP). Na época, ainda não havia assumido a transexualidade e resolveu, depois de um mês na empresa, contar a todos que era transexual. Segundo ela, a partir desse momento, começaram seus problemas, até ser demitida, em outubro de 2016.

Em comunicado ao UOL, por e-mail, a TIM diz que tem respeito à diversidade e que tem um acordo coletivo de trabalho, que prevê medidas como uso do nome social em crachás, mudanças de e-mails e banheiro unissex. A Everis, por sua vez, afirma que a empresa tinha conhecimento da transexualidade da funcionária e que ela foi desligada por questões de performance, não preconceito (leia a íntegra dos comunicados abaixo).

"Quando resolvi assumir, conversei com o RH da TIM. Eles me pediram duas semanas para viabilizar o necessário. Nesse tempo, conversaram com os gerentes, para que não houvesse qualquer desrespeito, já que teria 'um homem que viria com roupas de mulher'. Eles usaram esses termos", conta.

Ana Alice passou a usar roupas femininas e a equipe que trabalhava diretamente com ela nunca agiu com desrespeito, segundo ela, mas tinha problemas para lembrar seu nome social, já que tanto o e-mail quanto o crachá da funcionária tinham seu nome de batismo.

"Eles faziam o máximo para lembrar, só que todo dia mandavam, em média, 30 e-mails para Arnaldo César. Muitas vezes, a pessoa tentava olhar o crachá para lembrar o nome e, novamente, o nome estava errado. Foi uma situação muito desgastante psicologicamente", conta.

Ana Alice pedia para que uma colega enviasse os e-mails necessários para os colegas de trabalho. “Toda comunicação partia da caixa de entrada da minha colega, com o aviso: ‘enviado em nome de Ana Alice’”, conta.

A decisão foi tomada após um episódio constrangedor. “Teve um dia que fiquei ajudando uma colaboradora da empresa e, no fim do atendimento, tínhamos de mandar um resumo do que foi feito. No dia seguinte, ela sentou ao meu lado e pediu ajuda para identificar quem era o Arnaldo César, que tinha enviado o e-mail. Sai da sala e fiquei 15 minutos no banheiro chorando. Para mim, foi o auge”.

Ana Alice se uniu então a uma outra funcionária trans da TIM, que também foi demitida na mesma época, para reivindicar algumas solicitações, como a mudança no e-mail, crachá e o uso de banheiros femininos. A outra funcionária não concede entrevistas e prefere não ter o nome divulgado.

"Como a outra funcionária participava da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), levamos nossas reclamações para a reunião. Nossos superiores não gostaram e demonstraram isso. Disseram que a gente não precisava falar com os outros, que era para procurá-los, que eles resolveriam. Para mim, isso foi uma tentativa de oprimir qualquer possibilidade de nos unirmos", disse.

De acordo com Ana Alice, as reivindicações foram feitas durante seis meses ao RH da empresa, além de também terem feito parte da pauta de duas reuniões da CIPA. "Em novembro, às vésperas da terceira reunião, a outra funcionária foi demitida e, quando voltei de licença, pois estava com conjuntivite, também fui", relembra.

A justificativa dada pela empresa foi que ela não se adequava às funções, o que Ana Alice discorda com veemência. "Nunca tive nenhum feedback negativo, pelo contrário, todos os retornos que recebi diziam que eu era uma profissional muito qualificada. Trabalho na área há sete anos e sempre me dediquei muito", diz.

Uma das justificativas dadas pela empresa para não alterar o crachá das funcionárias era que não havia uma lei que obrigasse a fazer isso. “Eles diziam que seria ruim para a empresa se o nome do crachá fosse diferente do registrado na Receita Federal, o que é uma desculpa absurda. Nunca me neguei a apresentar meus documentos oficiais, só queria que no crachá e no e-mail constassem o nome social, até para facilitar meu dia a dia e diminuir o constrangimento”, fala.

Ana Alice não pensa em processar a empresa, “apesar de saber que deveria”, e, no momento, não está trabalhando. “Não quero me apresentar inicialmente com nome masculino, para depois falar da minha condição trans. E ser transgênero dificulta o ingresso em um novo emprego, principalmente nessa área que é muito machista e transfóbica”, fala.

Posição das empresas

Questionada pelo UOL, a Tim enviou o seguinte comunicado: “Sobre o caso em questão, a empresa esclarece que a colaboradora não era uma funcionária TIM e, em linha com a conduta que adota com seus prestadores de serviço, garantiu que a mesma fosse orientada a buscar o RH da empresa da qual fora contratada, para as devidas providências, já que a TIM não oferece ingerência na gestão dos negócios dos seus prestadores de serviços. A TIM informa que, de imediato, atendeu aos pedidos da colaboradora que lhe cabia, e a comunicou que deveria solicitar às demais alterações para seu empregador. A empresa reitera também que repudia qualquer forma de discriminação”.

A Everis também se posicionou, afirmando que "a empresa mantém processos de avaliação dos funcionários, realizados periodicamente, que podem ocasionar desligamentos quando necessário. Quanto aos crachás, a Everis deu início a um processo de mudança (em andamento) para que todos os funcionários da empresa possam definir seus nomes no crachá, em linha com o que as empresas vêm adotando para adequação ao atual cenário de diversidade na sociedade.”