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BBB: comentário preconceituoso de Marcos sobre Marinalva infringe a lei

Marcos fez comentários preconceituosos sobre Marinalva - Reprodução/TV Globo
Marcos fez comentários preconceituosos sobre Marinalva Imagem: Reprodução/TV Globo

Thamires Andrade

Do UOL

04/04/2017 16h46

No BBB17Marcos causou polêmica ao desferir comentários preconceituosos sobre a deficiência física de Marinalva. Tudo começou quando o brother estava ensinando Emilly a jogar xadrez. Ele perguntou o nome de uma das peças e a sister respondeu: "Cavalo manco". "Marinalva", respondeu ele. Ela, então, o alertou: "Marcos, cuidado".

Em outro momento, o médico afirmou que a paratleta se faz de vítima por conta da sua deficiência e, para conseguir esse feito, tira a prótese, e fica usando apenas a muleta.

O UOL conversou com ativistas da causa que destacaram que os comentários de Marcos infringiram a lei brasileira de inclusão e só escancaram o preconceito que acontece pela exclusão dos deficientes na sociedade:

Mara Gabrilli, deputada federal pelo PSDB-SP

Deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP) - Reprodução/PSDB - Reprodução/PSDB
Imagem: Reprodução/PSDB
Para mim é muito positivo ter uma participante com deficiência no BBB. Me lembro quando a Globo colocou uma personagem tetraplégica na novela das 21h. Ela entrava na casa de todos os brasileiros e era como se fizesse parte da família. O BBB traz informação, desperta reflexão e curiosidade e leva as pessoas a pensarem em outras questões que estão por trás, como quão difícil é importar uma prótese como a da Marinalva, como é a distribuição dessa prótese pelo SUS, isso nos leva a refletir.

Marcos é médico e ao dizer que Marinalva se faz de coitada quando tira a prótese para usar a muleta só mostra o quão ignorante ele é no assunto. A prótese cansa e machuca. Ela não precisa ficar usando o tempo todo para agradar os olhos dele ou de qualquer outro participante da casa. Ele foi muito deselegante, mal informado, ignorante e preconceituoso em todos seus comentários e infringiu uma lei.

No artigo 88 da Lei Brasileira de Inclusão, praticar, induzir ou incitar discriminação em razão da deficiência pode trazer pena de um ano a três anos de reclusão e multa.

Se o crime for cometido por meios de comunicação social, a pena de reclusão vai de dois a cinco anos mais a multa. A fala grosseira dele reflete a falta de preparo e de respeito da sociedade com os deficientes. Falta informação, cultura e familiaridade em conviver com pessoas com deficiência e isso só gera exclusão dessas pessoas, que muitas vezes não frequentaram a escola e não saem de casa pela falta de acessibilidade nos locais que frequentam.

Os deficientes enfrentam todo tipo de preconceito velados ou explícitos. Muita gente que conviveu com ela nem deve ter reparado que ela não tinha uma perna, enquanto outros acharam que aquilo era sua característica mais marcante. Marinalva ter entrado na casa traz a familiaridade com a deficiência e isso amplia o universo de diversidade, melhorando a concepção de mundo das pessoas. E é com a criação das políticas públicas que os deficientes serão inseridos na sociedade.

Eles só querem usufruir de serviços de qualidade, circular pela cidade com autonomia e liberdade, só querem ser felizes, como todas as outras pessoas. Mas muitas vezes essa infraestrutura da cidade os impede de ir e vir e de estudar. Quando existir uma escola que ofereça ensino de qualidade para todos estudantes, dos autistas aos deficientes, as crianças aprenderão desde sempre a conviver e não terão uma atitude como essa de Marcos. Parece que ele vive em uma bolha. Usar deficiência de uma pessoa para poder atacá-la é um absurdo.

Não é só por que uma pessoa é desinformada que precisa ser grosseira e desrespeitosa como ele. Marcos teve acesso à educação, informação e cultura e ainda dá uma dessa? Ele pode estudar o quanto quiser. Não tem elegância na alma e provavelmente vai precisar aprender muuuito para adquirir alguma.

Igor Castanheira, responsável pela comunicação do documentário Paratodos sobre atletas paralímpicos

Ter um participante com deficiência em um reality show é positivo e faz parte de um processo de amadurecimento de uma sociedade que ainda está longe de ser inclusiva, apesar de tentar trabalhar para isso. A presença de Marinalva serve para mostrar ao público que as pessoas são diferentes, não só fisicamente, não só no tipo de deficiência que tem, mas na própria personalidade. Afinal, cada um lida com a sua deficiência de um jeito. Marinalva é bem-resolvida com a dela. Sou manco e muitas vezes brinco com a minha deficiência em uma roda de amigos. Mas o comentário de Marcos foi ofensivo e tinha intenção de menosprezá-la por sua deficiência.

O que mais me impressiona nesse caso é que o comentário não partiu de uma pessoa ignorante, mas de um médico instruído que, querendo ou não, deve ter convivido com deficientes e pessoas de diferentes classes e credos. Se ele falou uma coisa dessa, mesmo em um momento de raiva, só mostra o preconceito que existe dentro dele. A postura da Emilly, por sua vez, de repreender o parceiro não foi com a ideia de mostrar que ele foi preconceituoso, mas sim de aquela atitude poderia prejudicá-lo no jogo.

Na real, é só o público que pode vê-la como coitadinha ou não, isso não parte dela, mas sim do olhar do outro. A minha experiência própria mostra que as pessoas têm um pouco de receio de se aproximar dos deficientes quando não conhecem. Por isso, acho que é importante estimular o convívio com as diferenças.

Acho que as pessoas precisam entender, aceitar e admirar as pessoas com deficiência, muitas vezes essas pessoas se fecham nas instituições e se excluem da sociedade e não desenvolvem mecanismos de defesa.

O sistema de inclusão ainda é muito falho e a sociedade é dividida em grupos que não se misturam. Mas é preciso justamente se misturar para limar esse preconceito velado que só existe pela falta de conhecimento. É só pensar na mulher gestante. Ela diz que quer ter um filho saudável. Quando ele tem deficiência, é considerado doente. Mas não é a realidade. A criança é apenas diferente e as pessoas não estão preparadas para entender isso. Existe um medo e ele só aparece por falta de educação, cidadania e aprendizado com as diferenças.