Topo

Trans exposta em alistamento militar tem vitória na Justiça: "Estou feliz"

Marianna Lively, 19, comemorou a decisão da Justiça paulista - Arquivo Pessoal
Marianna Lively, 19, comemorou a decisão da Justiça paulista Imagem: Arquivo Pessoal

Thamires Andrade

Do UOL

19/04/2017 18h01

Em setembro de 2015, a estudante transexual Marianna Lively, 19, teve suas fotos e dados pessoais divulgados depois de fazer o alistamento militar em Quitaúna, em Osasco. Ela resolveu entrar com um processo por danos morais e está feliz com a notícia de que a Justiça Federal de São Paulo condenou a União a pagar uma indenização de R$ 60 mil.

“Fico feliz de ter visto o resultado da minha luta, de ter corrido atrás e não ter deixado passar. Sei que não fui a primeira. Então, ter corrido atrás e ver que valeu a pena me dá uma felicidade enorme. Querendo ou não resolvi processar não só por mim, mas por outras garotas também. Espero que isso nunca aconteça de novo”, afirmou Marianna ao UOL.

A estudante, que atualmente mora em Londres, mas tem planos para retornar ao Brasil em breve, espera que a decisão seja um marco para que o Exército não permita que os transexuais tenham que passar por esse processo. “É um processo de exibição nas bases militares. Querendo ou não é um constrangimento estar no meio de uma multidão de meninos, sendo que é uma coisa que a gente não se encaixa e não faz parte”.

Para Marianna, a decisão da Justiça Federal é gratificante não só por conta do valor da indenização, “que não cobre um terço do que eu passei”, mas sim por que a justiça foi feita. “Só eu sei o que passei com tudo isso. Não foi nada fácil e deixou sequelas que estão comigo até hoje. Quando estou em público, fico desesperada quando apontam o celular para mim. Se alguém está com o aparelho em pé, já acho que estão tirando foto minha. É uma situação muito desconfortável”.
O caso

Em 2015, Marianna chegou cedo a base militar para fazer o alistamento. Ela conta que em meia hora foi liberada e chegou em casa feliz por ter sido bem tratada por todos. “Não passei por nenhum preconceito, apenas recebi alguns olhares, que até acho natural, pois era a única garota no meio dos meninos”.

Cerca de três horas depois, ela começou a receber ligações estranhas em seu telefone residencial, perguntando por seu nome de batismo. “Muita gente ligando e falando coisas ruins, vários trotes. Era uma ligação atrás da outra. Foi uma situação muito chata para mim e para a minha família”.

Pessoas desconhecidas chegaram a ir até a frente da casa de Marianna e chamar por ela. “Esperavam eu sair para me abordar. Foi uma situação horrível de passar. Não desejo isso para ninguém. Só eu e a minha família sabemos o que foi passar por tudo isso”.

Na parte da tarde, uma amiga avisou Marianna que as fotos dela estavam sendo compartilhadas em grupos de WhatsApp. “Foi aí que eu vi que era uma foto minha dentro da base militar e da minha documentação, onde aparecia meu endereço e telefone de casa. Vi que a proporção daquilo era muito maior do que eu pensava”.

Marianna e a mãe foram até a base militar para falar com o comandante, que orientou a estudante a esperar a poeira baixar para que ele pudesse resolver tudo. “Na hora já percebi que ele estava querendo jogar tudo para debaixo do tapete e já deixei claro que ia procurar os meus direitos, que não ia deixar nada quieto”.

Segundo a estudante, o comandante tentou impedi-la, dizendo que não havia necessidade de ir atrás de ninguém. “Mas eu sabia dos meus direitos de cidadã. Sabia que um militar em horário de trabalho não podia tirar uma foto minha lá dentro da base”.