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Ela já viajou para dez países e ganha R$ 8 mil vendendo potes de plástico

Amanda Serra

Colaboração para o UOL, em São Paulo

22/04/2017 04h00

Carro zero, três viagens por ano, ganho mensal de até R$ 8 mil, mais de dez países visitados, 400 revendedoras sob seu comando e um costureiro para fazer seus vestidos de princesa. Por sete vezes, a piauiense Rosa Maria Dias de Oliveira, 53, a Rosinha da Tupperware como é conhecida na Cidade Tiradentes, onde mora no extremo leste de São Paulo, foi coroada como uma das “melhores líderes empreendedoras do Brasil”. Mas para fazer parte dessa "realeza", precisa vender em média 100 mil apetrechos plásticos e recrutar cem novas vendedoras por ano.

Em meio a crise econômica dos anos 1990, ser responsável pelo próprio faturamento soou mais convidativo do que a sina de empregada doméstica à qual acreditava estar predestinada. Há 28 anos, Rosinha foi seduzida pelas ofertas de um folheto colocado sob a porta: “Vire revendedora e ganhe um kit de jarra e copo”. "Como sempre gostei dos produtos, mas não tinha dinheiro para comprar e estava escrito ‘ganhar’, liguei para saber como funcionava. Até participar das primeiras reuniões, achava que seria doméstica para sempre”, conta ela, que aos 13 anos se mudou para a capital paulista para trabalhar como babá dos primos.

A missão estava clara para Rosinha: caçar clientes, prospectar pessoas e ser uma líder. Mesmo com a flexibilidade de horários, ela teve de abrir mão de eventos familiares aos finais de semana e conciliar a rotina de mãe e dona de casa com a nova função. Até os títulos nobres, os prêmios e o dinheiro aparecerem, foram cinco anos percorrendo a pé e de ônibus vários bairros da periferia, onde está seu público-alvo, sob sol ou chuva.

Desafios nada glamourosos

Rosinha saía com caixas e sacolas cheias de potes e contava com a ajuda da filha mais velha, Eliane, e dos filhos das vizinhas na via-sacra por A.E. Carvalho, Vila Nhocuné, Guaianases e Itaquera. “A gente atravessava as linhas de trem a pé para fazer entregas, bater nas portas e participar das reuniões. Quando eu não ia, ficava em casa cuidando dos meus irmãos, os buscava e levava na escola, cozinhava...”, lembra Eliane, 37, que apesar de não ter aproveitado a infância como gostaria, segue os passos da mãe: já recrutou mais de 50 revendedoras para seu próprio time.

No começo, o lucro era baixo, muito por conta da inflação. “Nunca pensei em desistir, já tinha decidido que queria fazer carreira. Ganhava pouquinho nos primeiros meses, mas já era mais do que uma doméstica. Depois de dois anos, fazia 14 reuniões por mês”, conta, e esclarece que o objetivo dos eventos em que uma vizinha convida a outra é recrutar novos "soldados" e não apenas vender. Para brilhar nas reuniões, a piauiense, que estudou até a sexta série, anotava frases de efeito e treinava em frente ao espelho, em casa. “Tinha apenas três roupas boas para ir às reuniões, que eu usava para ir à igreja. Vestia uma delas e subia no salto. Precisa ter classe”, ensina ela.

De gata borralheira a Cinderela

Aos 30 anos, chegou sua primeira viagem de avião: Rosinha foi a Foz do Iguaçu (PR) para ser reconhecida como uma das dez melhores vendedoras do Brasil e logo depois para Aruba, onde aprendeu a usar corretamente os talheres. “Consegui me transformar em uma pessoa muito importante. Não sabia nem o que era passaporte, e meus únicos jantares haviam sido em casamentos. Minha maior conquista foi ir ao supermercado, pegar o que queria e não olhar o preço. Isso, sim, foi uma satisfação, sabia que tinha como pagar”, conta, aos risos. 

Há 23 anos chefiando a família, a piauiense, casada com Arnor Gonçalves, 62, prefere não exaltar esse título. “Ele é meu parceiro. Cuida da casa, limpa, cozinha e atende as minhas revendedoras. Ele é metade do meu sucesso”, afirma. Recentemente, ela levou o marido para um passeio de helicóptero pelas Cataratas do Iguaçu, na primeira viagem do casal. “Hoje, posso me programar e comprar o que desejar. Tenho até um costureiro só para mim, o Moisés do Itaim Paulista. Ele faz os vestidos das minhas premiações. No mínimo três por evento, porque não posso repetir nas fotos”, gaba-se.

Para saciar sua ânsia de crescer, a microempreendedora mantém um call center em sua casa e se tornou “escrava do WhatsApp”. Além dos treinamentos semanais, ela é responsável por ligar para cada uma das 400 pessoas de sua equipe para saber como andam as negociações das peças, que variam de R$ 9 a R$ 610 (o item mais caro é uma panela de pressão de micro-ondas), e ver se alguém precisa de capacitação. Sorridente, ela revela os planos para o futuro. “Em maio, vou para Israel pela segunda vez. E estou pagando o consórcio do meu carro novo. Quero um maior”, diz, animada.