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"Parecem não querer que transexuais voem", diz mulher barrada no aeroporto

Getty Images
Imagem: Getty Images

Denise de Almeida

Do UOL

18/08/2017 21h00

Mariana Franco, 30, tinha passagens para voar de Joinville para Brasília, mas foi impedida de embarcar em um voo da Latam e ainda ouviu uma insinuação de falsidade ideológica. Tudo porque Mariana, que é transexual, tem documentos ainda com nome masculino, enquanto seus bilhetes já registravam o nome social.

"Foi muito constrangedor pela forma com que eu fui tratada. Da forma que foi me falado, parecia que eu era uma criminosa", diz.

Convidada pelo Conselho Nacional de Saúde, órgão vinculado ao Ministério da Saúde, Mariana tentava participar de uma conferência em Brasília. As passagens, compradas pelo governo federal, seguiam o que determina o decreto presidencial 8.727/2016, que diz que órgãos e entidades da administração pública federal devem adotar o nome social para pessoas transexuais.

Mariana conta que nas passagens constava também o número de seu RG e CPF, que já poderiam provar sua identidade, mas mesmo assim a companhia se negou a permitir seu embarque. Ela mostrou ainda o cartão nacional do SUS, cartão de crédito e cartão de clube, todos já com o nome social. "Eles não são considerados documentos oficiais, mas é toda documentação que eu uso no meu dia a dia", explicou Mariana em entrevista ao UOL.

Mariana, que é presidente da União Nacional LGBT de Jaraguá do Sul e vice-presidente da União Nacional LGBT de Santa Catarina, afirma que a companhia aérea não tentou solucionar a questão.

"Até falei para uma das atendentes: 'me desculpe, mas o que parece que acontece é que vocês não querem que travestis e transexuais voem, como se não fosse um direito digno nosso'. Não tive nenhuma assessoria da Latam enquanto estive no aeroporto".

Avião da LATAM - Divulgação - Divulgação
Imagem: Divulgação

Procurada pela reportagem, a Latam Airlines Brasil se limitou a dizer que "para que o embarque possa ser realizado, é necessário que o bilhete seja compatível com o documento de viagem do passageiro".

Questionada sobre o fato do documento apresentado ter a mesma numeração registrada no sistema, a empresa não enviou resposta oficial até o fechamento da reportagem. O comunicado da Latam declara ainda que "a diversidade faz parte da cultura da companhia, que atende qualquer pessoa com a mesma atenção, cuidado e respeito".

Para a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), o nome fornecido no momento da compra da passagem deve ser igual ao nome do documento de identificação do passageiro. Seguindo os termos do decreto 8.727/2016, a ANAC informa que "o interessado deve solicitar a inclusão do nome social no documento oficial".

No entanto, Mariana afirma que não enfrentou esse constrangimento em outras companhias. "Eu já tinha embarcado pela Avianca usando nome social e não tive problema. Achei muito curioso que o pessoal da Gol no aeroporto também ficou bastante indignado, mas eu não sei se eles já adotam o uso do nome social".

Ela ainda reclama do atendimento recebido no balcão da companhia no aeroporto "Fui tratada com desdém, como se eu estivesse pedindo um favor. Em nenhum momento tentaram resolver o problema. Foi simplesmente 'você não pode embarcar'. Só faltou falarem 'saia daqui'", desabafa.

"A minha intenção não é ganhar nem mil reais com isso. Só quero que seja resolvido, para que nenhuma outra pessoa passe o constrangimento que eu passei. Espero que vejam que também somos pessoas. Apenas estamos pedindo direito a reconhecimento".

Para conseguir embarcar, Mariana teve que recorrer a outro voo, viajando com seu nome de registro. "O curioso é que em conta de banco e cartão de crédito você consegue usar o nome social. Inclusive ontem, para comprar novas passagens, eu iria comprar com o cartão, que tem o nome social. Mesmo nome que eu não posso usar para viajar. Nome que a própria companhia não aceitou na passagem".