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Um dia de fúria: conheça o transtorno que causa explosões de raiva

Homem gritando com o celular - Getty Images
Homem gritando com o celular Imagem: Getty Images

Gabriela Guimarães e Marina Oliveira

Colaboração para o UOL

15/09/2017 04h00

Arremessar o celular na parede porque a internet não pega, berrar com alguém que deu uma resposta atravessada, jogar o carro em cima de outro só porque o motorista tirou uma fina no trânsito… Todos esses acessos de raiva extremos podem ser sinal de um problema chamado Transtorno Explosivo Intermitente. 

Afinal, o que é TEI?

É um transtorno de impulso – assim como cleptomania, compras compulsivas e dependência de comida ou internet - caracterizado por reações desproporcionais de raiva. Essas explosões, usualmente, acontecem de três a quatro vezes por semana, durante, no mínimo, três meses. Três grandes explosões no ano – bater o carro propositalmente, colocar outras pessoas em risco e agredir fisicamente, por exemplo - também são indícios de TEI. As pesquisas já feitas sobre o assunto apontam que cerca de 3% da população brasileira é acometida pelo transtorno.

Como age a pessoa com transtorno?

Algumas só têm explosões verbais –  xingam, gritam e fazem escândalo. Outras, quebram objetos. Há, ainda, quem precise ir para cima, brigar e agredir. A ação, no entanto, nunca é premeditada – por isso chama-se transtorno do impulso. Se a pessoa está com raiva de você, ela não vai pensar “amanhã eu vou lá e arrebento a cara dele”. Ela vai bater na hora. Mas logo depois, se arrepende e sofre com vergonha e culpa pela atitude.

Mas todo mundo que explode tem TEI?

Não. Acessos de raiva, vez ou outra, são esperados. Mas quem tem TEI se descontrola regularmente e sempre se arrepende depois. Para chegar ao diagnóstico, o especialista vai descartar algumas situações, que podem desencadear raiva, como consumir em excesso álcool ou drogas. Ou ter sofrido de traumatismo craniano ou doenças inflamatórias cerebrais, que também podem ocasionar ataques de ira.

O que causa os ataques de fúria?

Qualquer situação pode desencadear uma reação explosiva porque, na verdade, ela será apenas um gatilho para um problema preexistente. Pode ser o trânsito, uma resposta atravessada, uma cara feia, um atraso, alguém furando a fila. A reação é, geralmente, completamente desproporcional à ação. Não adianta buscar coerência na atitude, porque não vai encontrar.

A pessoa percebe que está fora de controle?

Sim, porque o TEI começa a complicar a vida dela. Imagine a situação: ela está com o celular na mão e fica com raiva, porque o aparelho trava. Sem pensar se o telefone é caro, vai jogá-lo na parede – e este é um exemplo light de explosões, dizem as especialistas. Há quem é demitido, perde a namorada ou namorado e rompe relação com familiares, por causa dos ataques de fúria. Em situações extremas, podem agredir fisicamente. Sem saber do transtorno, muitos preferem se isolar, por medo do descontrole.

O transtorno se altera conforme a idade?

O TEI pode iniciar na infância e início da adolescência, ter seu pico por volta dos 30 anos e aos 50 anos há um declínio e ele ameniza, mas nunca some. A maturidade ajuda, porque a pessoa desenvolve estratégias de controle, por já ter passado por experiências ruins. O isolamento social é uma delas. Mas as explosões com a família e cônjuge tendem a permanecer, já que a intimidade deixa ela menos preocupada em gerenciar os ataques.

Existe cura?

Não. Mas com a ajuda de tratamento especializado, a pessoa aprende a identificar os gatilhos das explosões de raiva e criar estratégias para lidar com eles. Por exemplo, se alguém sempre explode ao dirigir no trânsito caótico, vai tentar dirigir em outros horários, ir de carona ou de transporte coletivo. As sessões de terapia individual ou em grupo também podem ajudar a não levar tudo para o lado pessoal.

E se alguém tiver um ataque de fúria na minha frente?

Pedir calma não adianta. O jeito é conversar quando ela se tranquilizar e apontar que as atitudes são prejudiciais para ela e para quem está ao redor. É preciso sugerir ajuda profissional. O simples fato de a pessoa descobrir que tem um transtorno – e parar de achar que é, apenas, alguém horrível – já é terapêutico, porque tira um peso das costas dela. 

FONTES: Liliana Seguer, coordenadora do Grupo de Transtorno Explosivo Intermitente do Ambulatório dos Transtornos do Impulso, do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo. Vânia Calazans, psicóloga clínica e autora do livro “Mente impulsiva, comportamento explosivo: Transtorno Explosivo Intermitente” (Sinopsys Editora).