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Paola Machado

Como saber sua frequência cardíaca durante um treino?

Paola Machado

12/11/2018 04h00

Crédito: iStock

O frequencímetro é um dos principais companheiros de treino de muitos atletas, especialmente os que praticam modalidades como corrida, ciclismo e natação. Porém, não é raro ver quem faz musculação usando um relógio que monitora os batimentos cardíacos e exibe, entre outras coisas, as calorias gastas na atividade física. Mas será que é realmente tão importante para nós, "pessoas comuns", estarmos por dentro da frequência cardíaca durante um treinamento?

Antes de saber a resposta, você precisa entender melhor o que é a frequência cardíaca e o que acontece com seu corpo pré-exercício.

A frequência cardíaca é determinada pelo número de pulsação –contração de forma rítmica — do coração pela unidade de tempo, expressada por batimentos por minuto (bpm). Ela pode variar de acordo com as necessidades físicas do organismo, desde a absorção de oxigênio até a excreção de gás carbônico; sofrendo influência dos exercícios físicos, sono, ansiedade, estresse, doença ou ingestão de drogas.

Quando nos preparamos para a atividade física, contamos com uma resposta "antecipada" do organismo pré-exercício. Isso significa que o seu corpo se prepara para tudo o que acontecerá na sequência. Por isso é tão importante o aumento gradual, e não abrupto, da intensidade de treinamento. Sendo assim, existe o aquecimento, que faz com que você tire seu corpo do estado de repouso e comece a sinalizar que iniciará um "estresse do bem" para seu organismo. Falo estresse do bem pois o exercício é, sim, um fator estressante para o corpo. Ele tira o organismo do estado de repouso, estimula a liberação de hormônios estressores, eleva a frequência cardíaca e, depois de um breve período, tudo se normaliza e ele entende que não é um estresse negativo e, sim, um grande benefício.

A resposta antecipada pré-exercício nada mais é que a mesma relação de "luta ou fuga" — com certeza você deve lembrar de alguma situação de alerta ou de medo, em que sentiu o coração disparar e você se preparar para o que está por vir, não? Usamos essa expressão para mostrar que todos os sinais de estresse de uma situação que deixe você a mil é capaz de sinalizar uma resposta antecipada que, às vezes, você pode sentir com mais intensidade, como, antes da largada da corrida, aquele friozinho na barriga; ou, com menos intensidade, quando você vai para a academia e nem percebe que seu corpo já está se preparando.

Isso faz com que ocorra a ativação do comando central a partir do córtex motor e da área superior do cérebro, levando a um aumento do fluxo simpático — responsável, dentre inúmeros fatores, por acelerar os batimentos cardíacos — e inibindo a atividade parassimpática — responsável, dentre inúmeros fatores, por retardar os batimentos cardíacos. Como resposta ocorre:

  • Aceleração da frequência cardíaca;
  • Maior contração cardíaca;
  • Vasodilatação no músculo esquelético e cardíaco;
  • Vasoconstrição em outras áreas –como pele, intestino, baço fígado e rins;
  • Elevação da pressão arterial.

Para se ter uma ideia, uma pessoa sedentária em repouso tem uma frequência cardíaca basal média em torno de 70 bpm. Já pessoas treinadas e atletas de endurece alcançam, em média, 50 bpm de frequência cardíaca basal –há casos mais raros de pessoas treinadas com frequências cardíacas inferiores a 30 bpm. Por isso, fica mais claro de entender que quanto mais treinado você é, menor a sua frequência cardíaca –o que é ótimo para a saúde, já que o coração se "esforça" menos para distribuir sangue para todo organismo, diminuindo o risco de doenças cardíacas.

A principal diferença entre esses dois exemplos no estado de repouso é que os atletas têm um maior volume de sistólico de ejeção e menor frequência cardíaca. Isso significa que possuem um tônus vagal aumentado e impulso simpático reduzido, fazendo com que o coração no estado basal fique mais lento e também ocorre um aumento do volume sanguíneo e da contratilidade cardíaca em pessoas treinadas que justificam o maior volume de ejeção. Resumindo, o coração de um atleta funciona melhor.

O que acontece na hora do treino?

Durante o exercício, ocorre supressão parassimpática no início e durante exercícios de baixa intensidade. Já em exercícios mais intensos, ocorre a estimulação simpática progressiva na atividade mais intensa e aumento da vasodilatação do músculo ativo, com alterações das condições metabólicas locais, liberação de adrenalina e noradrenalina e muitos outros eventos.

As adaptações fisiológicas do treinamento dependem da intensidade e sobrecarga do exercício. Existem, pelo menos, sete maneiras de enunciar essa intensidade:

  1. Energia por unidade de tempo;
  2. Nível de exercício absoluto ou produção de potência;
  3. Nível metabólico relativo enunciado como consumo de oxigênio máximo;
  4. Exercício abaixo ao nível ou acima do limiar do lactato (OBLA).
  5. Frequência cardíaca do exercício ou percentual da frequência cardíaca máxima;
  6. Múltiplos de taxa metabólica de repouso (MET);
  7. Taxação de esforço percebido (TEP).

Como esse texto é sobre frequência cardíaca, vou entrar em detalhes sobre ela. Há diversas formas de chegar à frequência correta de acordo com a intensidade de treinamento. Uma das mais exatas é pelo consumo de oxigênio máximo, ou seja, ergoespirometria –exame em que você corre na esteira com uma máscara. Porém, ele não é usual para a grande maioria da população.

Por esse motivo, vou mostrar métodos mais subjetivos para você aprender a calcular, em casa, sua intensidade de treino.

Como descobrir a frequência cardíaca (FC)?

Descobrir a frequência cardíaca basal –de repouso — é supertranquilo. Basta você colocar o dedo indicador e o dedo médio no pulso (ou no pescoço) e contar os batimentos do coração por 60 segundos. Para obter um resultado mais preciso, faça isso durante uma semana ao acordar, de preferência ainda deitado, e tire a média. Se achar melhor, você pode também utilizar um relógio que monitora os batimentos cardíacos.

As diferentes zonas de frequência cardíaca impostas em um treino dependem do seu objetivo. Se ter mais resistência é seu objetivo, então você vai precisar manter sua frequência cardíaca por longos períodos de forma consistente. Manter de 60% a 70% de sua frequência cardíaca máxima por 30 minutos é uma ótima forma de começar –uma vez que isso se torne normal, você pode aumentar sua intensidade a partir daí.

Use sempre o dedo indicador e o médio para conferir sua frequência cardíaca

A capacidade aeróbia melhora se a intensidade do exercício mantém gradualmente a frequência cardíaca entre 55% a 70% do máximo.

Método de Karnoven

Esse é um método alternativo para estabelecer o limiar de treinamento. É necessário realizar o exercício na frequência cardíaca igual a 60% da diferença entre o valor de repouso e o máximo. Assim, você obtém a frequência cardíaca do treinamento.

FC limiar = FC repouso + 0,60 (FC máxima – FC repouso)

Zona sensível ao treinamento ou zona-alvo

Pode-se determinar a frequência cardíaca máxima do exercício imediatamente após alguns minutos de esforço explosivo, sendo que essa intensidade requer motivação e estresse com supervisão profissional e liberação médica. As pessoas devem considerar a média e utilizar a frequência cardíaca máxima prevista para sua idade.

Frequências cardíacas máximas e zona sensível ao treinamento para o treinamento aeróbico de homens e mulheres em diferentes idades.

É importante saber a sua frequência cardíaca máxima (FC máx) porque isso determinará a sua frequência cardíaca para cada zona de treinamento. Por muito tempo, a fórmula para calcular a FC máx foi uma conta simples: 220 menos sua idade. Mas esse pode não ser o melhor caminho e é um cálculo mais subjetivo.

Uma fórmula mais precisa para o cálculo de homens e mulheres é:

FC máxima = 208 – (0,7 x idade)

Exemplo de homem ou mulher de 20 anos

FC máxima = 208 – (0,7 x 20) 

FC máxima = 208 – 14

FC máxima = 194 bpm

Esse é um cálculo subjetivo para frequência cardíaca máxima. Vale lembrar que para realmente determinar, de forma precisa, o valor é necessário realizar testes de VO2 máximo, que é considerado padrão ouro de capacidade aeróbia. Assim, você chegará a um valor mais próximo da real intensidade que pode se exercitar.

Valores selecionados do VO2 máximo e o percentual correspondente da FC máxima obtidos por várias fontes bibliográficas, com erro de, aproximadamente, 8%.

Comparação da zona-alvo com escala de Borg (percepção do esforço)

A taxação de esforço percebido (TEP) pode ser usada além do consumo de oxigênio, da frequência cardíaca e do lactato sanguíneo para indicar a intensidade do exercício. Com essa escala, a pessoa classifica a sensação de esforço de acordo com o número da tabela, que coincide com medidas subjetivas de % FC máx, % VO2 máximo e concentração de lactato sanguíneo.

Quanto maior o número da tabela, maior o nível do seu esforço.

Zonas de treinamento

– Zona 1 (50% a 60% da FC máx) O exercício é bem leve e você é capaz de sustentar durante um longo tempo.

– Zona 2 (61% a 70% da FC máx) Treinos mais de resistência e emagrecimento. Um bom ritmo para treinos longos ou um treino que você consegue realizar de forma moderada e até conversar com amigos.

– Zona 3 (71% a 80% da FC máx) Treinos de resistência mais intensos, que você consegue manter por cerca de 30 minutos em ritmo constante. Você ainda está trabalhando com sua capacidade aeróbia –seu corpo está usando oxigênio como energia celular.

– Zona 4 (81% a 90% da FC máx) Quando você atinge cerca de 84% da sua frequência cardíaca máxima, seu corpo entra no metabolismo anaeróbico. O que isso significa essencialmente é que o organismo está com falta de oxigênio, por isso tem de procurar outras fontes de combustível para queimar. É legal você tentar chegar nessa zona de treino –quando supervisionado, com liberação médica e você se sentir seguro — por pelo menos 10 minutos. Aqui, você consegue diversos benefícios, entre eles acelerar o metabolismo pós-treino (EPOC). É um treino que você se estressa um pouco mais e, depois, quando vai para casa, seu corpo continua se recuperando a um ritmo alto para compensar isso. Você terá um metabolismo elevado que continuará a queimar gordura.

– Zona 5 (91% a 100% da FC máx) É quando você está dando tudo de si. Você consegue ficar nessa zona por pouco tempo –geralmente, no máximo dois minutos, mas a maioria das pessoas atinge seu limite entre 30 segundos e um minuto. Ela é alcançada em treinos muito intensos (HIIT) ou em sprints.

Se você deseja obter informações específicas sobre como usar sua frequência cardíaca em seu treinamento, é útil falar com um instrutor sobre suas metas. A mudança da frequência cardíaca não acontece em um dia, por isso, se você está apenas começando, pense primeiro na segurança ao aumentar seus limites de resistência.

Referência:
– Gellish, R.L.; et al. Longitudinal modeling of the relationship between age and maximal heart rate. Med Sci Sports Exerc. 2007 May;39(5):822-9.
– McArdle, W.D.; et al. Fisiologia do Exercício – energia, nutrição e desempenho humano. Sexta edição. Guanabara Koogan. 2008.
– https://serendipstudio.org/sci_edu/waldron/pdf/HeartRateProtocol.pdf 
– Vanderlei, L.C.; et al. Basic notions of heart rate variability and its clinical applicability. Rev Bras Cir Cardiovasc 2009; 24(2): 205-217.
– Guyton & Hall. Tratado de fisiologia médica. Nona edição. Guanabara Koogan. 1997.

Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.