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Beleza alien? Estética extraterreste questiona o que achamos bonito

Gui Mauad, 19, faz drag queen com estética que parece de outro mundo - Reprodução/Instagram
Gui Mauad, 19, faz drag queen com estética que parece de outro mundo Imagem: Reprodução/Instagram

Natália Eiras

02/08/2019 04h00

Quando está montado para suas performances em festas underground, Gui Mauad, de 19 anos, parece ter saído de uma cena de "Splice" (2009). Seu filme favorito mostra uma nova espécie de humanoides. As lentes pretas deixam as pupilas dos olhos do rapaz de Teresópolis (RJ) muito maiores do que as de outros seres humanos. A pele, maquiada, é branquíssima e, algumas vezes, tem calombos, tubos e próteses, que lhe conferem traços animalescos. Ele, que já usou até um focinho, é representante e promotor da beleza alien, estética em que os adeptos procuram referências no que imaginamos ser a aparência de seres de outros planetas.

O objetivo é causar estranhamento e mudar, mesmo que de forma sutil, a percepção sobre o que consideramos belo. "Porque, quando vemos algo estranho, ele pode te deixar nervoso, triste. Ou sublimado, feliz. Não importa qual seja a sensação, acontece um questionamento sobre essa estranheza", fala Mauad, em entrevista para Universa. Ele é performer de festas de música eletrônica e de festas de drag queens em São Paulo (SP) e no Rio de Janeiro (RJ).

Apesar de futurista, a beleza que parece ser de outro mundo não é algo novo. Em 1928, o fotógrafo francês surrealista Claude Cahun explorou uma estética que mistura visuais convencionais, humanos, e elementos bizarros. O compositor britânico David Bowie flertava com o estilo desde 1969, a partir do lançamento de "Space Oddity". Porém, desde 2018, o look tem ficado mais popular. A dupla Fecal Matter, formada pelo casal Hannah Rose Dalton e Steve Raj Bhaskaran, de Montreal (Canadá), chamou a atenção de aficionados em moda ao usar sapatos que imitam pele humana e bolsas com alça em formato de pênis de plástico. Atualmente eles têm 574 mil seguidores no Instagram e lançaram uma coleção de roupas. Na mesma rede social, a maquiadora Aryuna Tardis conquistou 103 mil seguidores, mostrando como conseguir um visual que não parece terrestre. Isso sem falar na dupla de rappers sul-africanos Die Antwood.

Segundo Gui Mauad, a androginia da beleza alienígena é uma forma de escape para a pressão que é tentar se enquadrar no que a humanidade acha bonito. "Quando você tenta se gostar e receber a aprovação dos outros seguindo os padrões de beleza dos seres humanos, acaba dando murro em ponta de faca. É impossível ficar satisfeito. Você sempre vai achar que está gordo, ou com espinha, com o cabelo feio, magro demais. Sempre há algo para criticar", diz o jovem. "Mas se, ao olhar para você, a pessoa não vê um humano, é criado um escudo, uma segurança que leva sua autoestima para outro lugar."

Apesar de grande entusiasta, Gui não vive a beleza alienígena no dia a dia, como a dupla Fecal Matter ou Salvia, personalidade do Instagram que virou modelo de passarela. "Eu me considero uma drag queen. Mas quem eu sou montado é apenas uma extensão de quem sou como rapaz", afirma. Em 2016, quando começou a se montar, tinha uma figura superfeminina, mas isso cansou. "Eu sabia exatamente como ficaria quando estivesse pronto. Demorava 30 minutos para fazer a minha maquiagem. Além disso, tinha que estar sempre impecável", diz Mauad, que, atualmente, pode levar até três horas para ficar pronto.

Quando está no metrô ou no ônibus, muita gente mostra espanto, mas logo afasta o olhar. "Parece que tentam fingir que nunca viram alguém como eu." Porém, em cima do palco, para o seu público, a história é outra. "Eu gosto de sublimar a plateia, fazer com que eles venham para o meu mundo nas minhas performances", afirma. São nestes momentos que ele percebe que pode estar mudando a percepção sobre o que é considerado belo. "Estou com o olho todo preto, careca e a pessoa ainda diz que estou muito bonito naquele dia. As pessoas já conseguem entender a beleza dentro dessa estética, enxerga o extraordinário que é uma montação alienígena."

Ele define a sua estética como "ultrahumana". "É a imaginação do que o ser humano poderia ser no futuro", diz. Gui discorda, no entanto, que o visual de outro mundo seja o futuro da beleza. "Vamos, na verdade, para um caminho com menos maquiagem, mais artístico. Isso se o mundo não acabar antes."

Mais do que uma expressão de arte, o visual o ajuda a lidar com sua aparência quando está desmontado. "Sempre tive a autoestima baixa porque já fui muito gordo, me acho baixinho, não gosto do meu nariz. Não são coisas que me incomodam tanto a ponto de me esconder. Tenho problemas com o meu corpo às vezes, como todo mundo tem, porém quando estou montado eu esqueço completamente disso, ou uso ao meu favor", afirma. Ele diz que, quando está como drag, ele coloca para fora o que é por dentro nos outros dias da semana. "E a satisfação de mostrar minha verdade com o meu corpo fez com que eu ficasse mais seguro sobre quem sou."