Os músicos que enfrentam a proibição de tocar no metrô - e se dão bem
Cantora e violonista desde criança, Shay Bueno, 22, começou a tocar no metrô para conseguir pagar o aluguel da casa em que morava. "No dia eu precisava de 50 reais, aí um amigo (o músico Ricardo Zuppo) me chamou pra tocar no metrô e em uma hora a gente conseguiu 120 reais. Foi surpreendente, eu não sabia que as pessoas gostavam, apoiavam a arte. Continuei por alguns dias e percebi que meu salário era bem menor do que o que eu ganhava no metrô. Foi quando abri mão do meu emprego e fiquei só como artista de rua", conta.
Do metrô pra TV
E foi assim, cantando e tocando com um violão emprestado, que ela chamou a atenção de uma produtora da Record que estava no mesmo vagão. Para Shay, o sonho de infância de ser uma artista reconhecida começava a se realizar: em alguns dias ela estaria no palco do Hora do Faro. "O programa foi ao ar dia 16 de setembro, depois de uma semana de gravações. Conheci as meninas do Rouge, o Rick Bonadio, e tive essa reafirmação do que eu queria, do sonho que eu sempre tive. Antes tocava no metrô com violão emprestado, hoje tenho dois violões, todo equipamento completo, que é muito caro e eu não tinha condições de comprar antes, e tenho fãs, pessoas que se identificaram com meu trabalho", comemora ela, que teve uma de suas composições, "Labirinto", produzida por Rick.
Até 500 euros por dia
O músico paulistano Ricardo Zuppo tem 31 anos e toca na rua há três. Autodidata, ele já se apresentou em vagões de trens e metrôs de Portugal, Espanha e Itália. Na Europa, chegou a conseguir 500 euros (mais de 2 mil e 200 reais) em um único dia; aqui no Brasil, em um dia "ruim", volta pra casa com 60 reais.
"Lá fora é diferente, faz parte da cultura a música na rua. Não só música, mas malabares, palhaços. A arte é muito mais aceita. Lá era proibido, como aqui, mas lá eles não te tiram da estação. Mas aqui não é ruim, o problema é que tem muita gente que acha que você não trabalha, e na verdade a gente trabalha bastante."
Os prazeres e os desafios dos músicos de rua
Multi-instrumentista, Jonatas Ramos, começou a tocar clarinete aos 11 anos de idade, na orquestra jovem de Barueri, a 30 quilômetros da capital paulista. "Com o tempo aprendi a tocar saxofone e flauta transversal. Ano passado iniciei o curso de Licenciatura em Música, mas tranquei este ano por motivos financeiros. Eu trabalhava em uma gráfica e não estava conseguindo conciliar o trabalho com a minha carreira musical, então saí da empresa e segui na música. Eu não me vejo trabalhando com outra coisa! Então em agosto decidi começar a tocar no metrô, pra conseguir pagar a faculdade, e foi onde me descobri", revela.
Se a melhor parte do trabalho é o reconhecimento do público, a pior é a pressão dos seguranças do metrô. "Temos que ficar correndo deles, e isso de uma forma acaba nos deixando pra baixo, né?! Porém não desistimos."
'Vamos sair daqui!'
"Já aconteceu de eu estar sentado no banco do metrô da Sé, com o instrumento guardado, chegar um segurança e falar 'vamos!'. Aí respondi 'vamos aonde?' e ele rebateu 'vamos sair daqui!'. Expliquei que o meu instrumento estava guardado, eu nem ia tocar. Tem uns que xingam, é horrível".
O som ambiente foi implementado nas estações de metrô de São Paulo há quatro meses. Nos sites das companhias de trem e de metrô não há avisos sobre a proibição das apresentações dos artistas. Por telefone, os funcionários das duas empresas informaram que "não é permitido, como o comércio ambulante e pedintes, porque pode atrapalhar a viagem dos usuários".
A repressão em São Paulo não se repete no Rio de Janeiro, lembra Jonatas. "Eu e mais três amigos músicos viajamos até lá pra tocar no metrô e foi uma experiência incrível, porque os seguranças viam a gente e ficavam na deles. A gente podia tocar tranquilamente, sem se preocupar se os agentes estavam vindo. Foi muito bom!.. Seria muito legal se aqui fosse assim também."
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