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Youtuber mirim ou famoso no Instagram: até que ponto vale expor crianças?

iStock/Getty Images
Imagem: iStock/Getty Images

Lucas Vasconcellos

Colaboração para o UOL

04/02/2019 04h00

Não é de hoje que crianças crescem sob os holofotes da fama. Mas, antes restrita aos atores mirins, a superexposição da vida de celebridade hoje alcança de youtubers infantis a filhos que nem sequer imaginam o quanto seus pais já divulgaram sobre sua vida nas redes sociais.

Enquanto youtubers infantis estão na mira do Ministério Público de São Paulo e podem ter seus vídeos retirados do ar, crianças são alçadas a celebridades mirins no Instagram. Mas até que ponto vale a pena expor menores de idade na internet?

Enrico Bacchi, uma das maiores celebridades mirins das redes sociais, nem completou 1 ano e meio de vida, mas já tem 1,8 milhão de pessoas acompanhando suas fotos no Instagram.

Para se ter ideia, o perfil criado pela atriz Karina Bacchi para o baby Bacchi, como também é chamado, tem mais seguidores do que celebridades com anos de carreira, como a modelo Isabeli Fontana (1,2 milhão) e o ator Jesuíta Barbosa (331 mil).

Assim como Enrico, diversas crianças e adolescentes têm suas rotinas compartilhadas constantemente pelos pais. Quais as possíveis consequências disso no futuro dos pequenos?

"A internet, assim como tudo, tem que ser usada com moderação. Mas o limite de se expor uma criança é algo novo. Os pais de hoje tiveram pouco ou nenhum contato com a internet quando eram novos. Por isso, estão aprendendo sobre o que deve ou não ser mostrado sobre os filhos", ressalta Deborah Moss, neuropsicóloga, mestre em psicologia do desenvolvimento humano e especialista em comportamento infantil.

Para Deborah, os pais são turistas na internet e estão vivenciando os próprios erros, mas é importante que nesse processo haja bom senso. "É a atual geração que, daqui a alguns anos, vai nos mostrar quais são os limites. Mas, enquanto isso não acontece -- e como os filhos não têm como se defender, os pais têm que se perguntar: 'quando ele crescer, vai gostar disso?'".

Situações de risco e traumas

A especialista alerta que todo cuidado é pouco. Além de poder virar um meme, que pode marcar o menor por vários anos, as crianças podem ser postas em situações de risco. Uma foto com uniforme da escola especifica um pouco sobre a rotina do filho, abrindo ainda mais precedentes para um possível sequestro, por exemplo.

Como não há bola de cristal, é impossível saber como será o futuro de crianças que aparecem livremente em perfis nas redes sociais, como Enrico. Pode ser que, assim como a mãe, ele tenha veia artística e as pessoas que o seguem hoje sejam a base para uma carreira sólida lá na frente.

Mas a fama, quando chega cedo, também pode ser motivo para formar um adulto cheio de cicatrizes. "A exposição exacerbada pode gerar atrito na relação familiar posteriormente. Além disso, uma vez que a criança está exposta na mídia, precisa dar conta da pressão que vem com isso. E ela não tem maturidade e nem emocional para lidar com expectativas, críticas, agressões virtuais, julgamentos", afirma Deborah Moss.

Quantas curtidas vale?

Crianças e adolescentes não sabem quem são, pois são seres que ainda estão se desenhando, diz a neuropsicóloga. E justamente por isso, enquanto não têm voz, os adultos falam por eles. "Novamente, é por isso que o pai deve se questionar sobre como isso impactará o futuro do filho", reforça Moss.

Ainda de acordo com a profissional, antes de expor o pequeno, os pais precisam fazer também uma autoanálise e se perguntar o motivo para estarem compartilhando aquilo: é só divulgar ou tem a função de preencher alguma frustração do adulto?

"Na vida real, assim como naqueles programas em que se veem familiares de crianças em concursos de beleza dos Estados Unidos, existem responsáveis frustrados, que jogam a expectativa do que não conseguiram realizar para os filhos. Então é necessário analisar o porquê de tanto compartilhamento", pontua.