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Regina Navarro Lins

Certa vez, falei sobre amor com um dos pensadores mais libertários do país

Regina Navarro Lins

06/12/2018 04h00

Ilustração: Caio Borges

Há alguns anos tive a oportunidade de conversar longamente sobre o amor com um dos pensadores mais libertários do país, o psicoterapeuta e escritor Roberto Freire (1927-2008). A seguir parte da nossa conversa.

Como você acha que vai ser o amor no futuro?

Cito esta frase da declaração do meu amor anarquista, no livro Ame e dê vexame: "Porque eu te amo, tu não precisas de mim. Porque tu me amas, eu não preciso de ti. No amor, jamais nos deixamos completar. Somos deliciosamente desnecessários."

Por que sofre tanto o amor?

O prazer e a dor são dois indicativos do funcionamento normal do instinto da irritabilidade animal. São eles que orientam e guiam nossas opções de vida. Por isso o amor dói quando não está sendo bem vivido e é o maior prazer possível quando amamos criativamente e livremente de modo simultâneo. Perder um grande amor é extremamente doloroso. Mas é extremamente difícil fazer avaliações sobre o amor enquanto ele está durando. Parece que alguma coisa estranha nos oblitera a clara compreensão das sensações amorosas — como o ciúme, o sentimento de posse, as fantasias, a desconfiança. Por isso, afirmei certa vez que do amor só se pode fazer necropsia, nunca biópsia. Quando o amor acaba a gente pode, então, entender e explicar todo o processo da sua causa à morte.

É fundamental uma relação amorosa estável?

Não. Porque a relação estável depende de muita segurança e evita o risco, como a criatividade e a liberdade. Tudo o que existe e é vivo tem começo, meio e fim, não podendo ser determinado por nós sem autoritarismo. Cada amor tem seu tempo e independe de nossa vontade.

***

De uns tempos para cá vem diminuindo muito a disposição das pessoas para sacrifícios. A maioria busca desenvolver ao máximo suas possibilidades e sua individualidade, evitando manter relações insatisfatórias. Afinal, há muito a ser vivido. Ao contrário da época em que, excetuando os casos de intenso sofrimento, ninguém se separava, hoje a duração dos casamentos é cada vez menor.

Para o filósofo francês Pascal Bruckner, o medo de perder a independência prevalece sobre o pudor de antigamente. É o que procuram as sociedades modernas: por a lei a serviço das paixões, em vez de enquadrar as paixões na lei. Acompanhar cada mudança nos costumes, mesmo que seja necessário reformular as instituições para melhor adaptá-las.

"Cavalgar o tigre mesmo correndo o risco de ser derrubado, canalizar, pela concordância, o rio impetuoso das emoções que os antepassados represavam com proibições. É uma louca ambição, cujos efeitos se fazem sentir.", diz ele. É inegável que  aumenta o número dos que buscam relacionamentos amorosos distantes dos padrões tradicionais.

Sobre a autora

Regina Navarro Lins é psicanalista e escritora, autora de 12 livros sobre relacionamento amoroso e sexual, entre eles o best seller “A Cama na Varanda”, “O Livro do Amor” e "Novas Formas de Amar". Atende em consultório particular há 45 anos e realiza palestras por todo o Brasil. É consultora e participante do programa “Amor & Sexo”, da TV Globo, e apresenta o quadro semanal Sexo em Pauta, no programa Em Pauta, da Globonews. Nasceu e vive no Rio de Janeiro.

Sobre o blog

A proposta deste espaço interativo é estimular a reflexão sobre formas de viver o amor e o sexo, dando uma contribuição para a mudança das mentalidades, pois acreditamos que, ao se livrarem dos preconceitos, as pessoas vivem com mais satisfação.

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