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Paola Machado

Por que sempre sinto que é mais difícil correr no começo do treino?

Paola Machado

15/07/2019 04h00

Crédito: iStock

Correr parece algo simples, mas quem pratica ou já tentou praticar a atividade sabe que não é tão simples assim, especialmente no começo.

A corrida é um esporte muito complexo por diversos pontos, dentre eles:

  • Você precisa saber o mínimo da técnica e entender as limitações do seu corpo;
  • Você precisa ter a musculatura bem fortalecida para reduzir a sobrecarga articular e diminuir o risco de ter lesão devido ao impacto;
  • Você precisa saber quanto treinar e os limites dentro de um planejamento adequado para seu objetivo.

Além de todos os pontos que temos que levar em consideração —que deixarei para um texto sobre o tema —, a corrida exige uma motivação e um trabalho mental absurdo. Por isso, entrando no tema do texto, te pergunto: quantas vezes você não estava começando a correr e quis desistir nos primeiros 5 minutos? Por que é tão difícil correr nos primeiros minutos de treino?

O aquecimento é um fator imprescindível para evitar essa desistência no início da corrida. Muitos começam a correr de supetão e não preparam o corpo para o estímulo. O aquecimento prepara o seu corpo para o exercício e, dependendo do quão condicionado você é, deve ser planejado para a distância que percorrerá. O que você nunca pode fazer é deixar essa etapa passar batida e iniciar a corrida em ritmo forte logo de cara, pois o aquecimento eleva o trabalho metabólico, a temperatura corporal e auxilia no redirecionamento do fluxo sanguíneo para musculatura ativa, sendo que isso acontece aos poucos, de forma gradual e não de uma hora para outra.

Agora, tão importante quanto todos os aspectos fisiológicos e de treinamento, tem todo seu estado mental e motivacional. Sua mente desempenha um papel tão crucial em suas corridas quanto seu estado físico. Estudos mostram que a fadiga mental prejudica o desempenho da corrida, fazendo com que os corredores — amadores e profissionais — tenham uma taxa maior de esforço percebido.

Dependemos do nosso subconsciente para fazer a maior parte do que fazemos, se permitirmos que ele governe a corrida, o cérebro podr secretar hormônios responsáveis pelo estresse, levando à ansiedade e ao negativismo, tornando a sua corrida um problemão, que o corpo entende que deve parar o quanto antes.

Por isso, seguem algumas dicas para trabalhar a sua mente durante a corrida:

Pense em algo que mantenha você motivado

Quando você gosta de correr, é muito fácil deixar os problemas de lado e correr com a sensação de que não está pensando em absolutamente nada. Porém, pessoas que iniciam a corrida e estão pegando o gosto têm dificuldades de, em um primeiro momento, aproveitar dessa boa sensação, por isso pensam em problemas, trabalho, pressão, estresse. Se você foca em pensamentos que não te fazem bem no momento do seu treino, pense em alguma coisa específica e positiva, exemplo sobre seu futuro feliz. Quando deixa seu subconsciente agir — que deixamos agir sozinho e pode nos levar a pensamentos negativos —, ele pode controlar seu treino também dessa forma. Por isso, deixe sua consciência agir e a controle com seus pensamentos positivos. Assim, começará a produzir endorfinas, sendo que essas substâncias aumentam o bem-estar e diminuem a ansiedade, prolongando seu estímulo de treino.

Repita palavras ou frases positivas

Parece uma coisa besta, mas tente. Palavras ou frases positivas como "eu posso", "eu consigo", "eu sou capaz", quando repetidas diversas vezes auxiliarão a recuperar a sua força de vontade no início dessa sua "briga" interna na corrida. Quando repete essas palavras positivas, você ativa uma região do lobo frontal do seu cérebro que "bloqueia" pensamentos negativos e de desistência do seu subconsciente.

Ouça uma boa música

Pesquisas mostram que a música reduz a percepção de esforço por "distrair" o cérebro da sensação da fadiga, reduzindo o cansaço e a resistência muscular e melhorando a performance.

Um estudo da Universidade do Estado de Santa Catarina mostrou que a música interfere positivamente no desempenho esportivo considerando: menor variabilidade da frequência cardíaca na situação de repouso ouvindo música; menor valor da freqüência cardíaca correndo ouvindo música; e menor variabilidade da frequência cardíaca na corrida com música comparando com a mesma situação sem música. Ou seja, melhora o desempenho do praticante.

Outra pesquisa realizada pelo pesquisador Karageorghise, um expert em música e exercício da Univerdade Brunel de Londres, mostrou que a música aumenta o seu rendimento em até 15%, isto porque as batidas da música bloqueiam e "distraem" mensagens que a musculatura e órgãos vitais enviam ao cérebro, reduzindo, consequentemente, a percepção de esforço. Por exemplo, em exercícios leves e moderados, a percepção do esforço reduz em até 12%.

O que você faz, na verdade, é "distrair" o seu cérebro com a música, então, ele "não percebe" que está mais ou menos cansado. Porém, duas coisas têm que ser levadas em consideração. Quando o esforço aeróbio for maior que 75%, as músicas já não são tão eficazes e o esforço acaba não sendo influenciado pelo poder das batidas. E, se você for uma pessoa que não está tão acostumada em praticar atividades físicas, cuidado, você pode se empolgar demais e, depois, não aguentar.

Músicas motivacionais, que trazem nas letras "push it" ou "work it" sincronizadas com as batidas.melhoram ainda mais o desempenho. Por isso, inclua músicas na sua playlist que trazem lembranças boas ou faixas com as batidas no mesmo ritmo das passadas. 

Defina metas intermediárias no trajeto

Sempre falo que somos condicionados a nos frustrarmos. Estabelecemos metas inatingíveis e nos frustramos. Ou, focamos em um número grande — que assusta –, em vez de estabelecer pontos ou números menores. Exemplo, se você está começando, por que em vez de falar "vou correr 3 km sem parar", você não foca em pontos? Exemplo, tenho que chegar naquele poste e, quando chegar, tenho que correr até aquela árvore. Assim, com pequenas metas durante seu percurso, você atinge seus 3 km sem nem mesmo ter percebido. 

Não desista

Sabemos que lutar contra a negatividade e a desistência imposta pelo seu cérebro pode ser difícil. E enquanto alguns corredores podem desistir rapidamente, outros conseguem combater essa "vozinha" interior e seguir em frente. Por isso, o segredo é colocar a sua mente em ordem, pensar positivo, focar no seu objetivo final — que deve ser realista, pois você não começará correndo 10 km — e estabelecer metas intermediárias de acordo com esse objetivo. Criando um novo hábito, repetindo esses estímulos e se condicionando, você irá longe.

Sugestão de leitura:
– Mental Training for Runners: How to Stay Motivated. Jeff Galloway. Ed. Meyer & Meyer Sport (15 de abril de 2011).
Referências:
– KARAGEORGHIS, C.I.; et al. Development and initial validation of an instrument to assess the motivational qualities of music in exercise and sport: The Brunel Music Rating Inventory. Journal of Sports Sciences. Volume 17, 1999 – Issue 9.
– Rodrigues, N.S.; et al. Influence of the music listening in the physical exercises of adult people. Rev. bras. educ. fís. esporte vol.26 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2012.
– Smith, M.R.; et al. Mental Fatigue Impairs Intermittent Running Performance. Medicine and Science in Sports and Exercise. 2015 Aug;47(8):1682-90.
– NAKAMURA, P.M.; DEUTSCH, S.; KOKUBUN, E. Influência da música preferida e não preferida no estado de ânimo e no desempenho de exercícios realizados na intensidade vigorosa. Revista Brasileira de Educação Física, São Paulo, v.22, n.4, p.247-55, 2008.
– KARAGEORGHIS, C.I.; MOUZOURIDES, D.A.; PRIEST, D.L.; SASSO, T.A.; MORRISH, D.J.; WALLEY, C.L. Psychophysical and ergogenic effects of synchronous music during treadmill walking. Journal of Sport & Exercise Psychology, London, v.31, p.18-36, 2009.
– Rapoport, B.I. Metabolic factors limiting performance in marathon runners. PLoS Computational Biology, 2010, Oct.;6(10):1553-7358.

 

Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.