Topo

Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


O sexo após o câncer: como voltar a sentir prazer depois do diagnóstico

Getty Images
Imagem: Getty Images

Susan Gubar

Do New York Times

02/02/2018 14h58

No momento do diagnóstico, muitos pacientes com câncer veem Eros fugindo apressado. Sei disso porque aconteceu comigo.

Para alguns, o erotismo desaparece durante ou após o tratamento. A anedonia, a incapacidade de sentir prazer, pode afligir tanto homens quanto mulheres com câncer. Muitas vezes obtemos mais ajuda uns dos outros do que de especialistas médicos que começam a enfrentar este desafio.

Leia também:

Pode ser difícil vivenciar o desejo se você não apenas não gosta, mas teme seu corpo, ou se não consegue reconhecê-lo como tal. Cicatrizes cirúrgicas, partes do corpo ou cabelos que se foram, fadiga quimicamente induzida, queimaduras radiológicas, náuseas, medicamentos que bloqueiam hormônios, dormência causada por neuropatias, ganho ou perda de peso e ansiedade não são bons afrodisíacos.

Aos 46 anos, a mais jovem integrante do meu grupo de apoio explica muito bem: "Uma crise existencial não é sexy". Embora seus médicos não tenham oferecido nenhum conselho, ela acabou tentando promover uma renovação de sua vida sexual, meio que pensando em seu parceiro carinhoso que acompanhava seu tratamento.

"Sex and Cancer", o novo livro do Dr. Saketh R. Guntupalli, especialista em câncer ginecológico, e Maryann Karinch, quer ajudar mulheres com câncer ginecológico ou de mama. Saketh e Maryann fazem de tudo para fornecer evidência científica de uma situação que alguns podem considerar previsível: "Descobrimos que o sexo era menos prazeroso para as mulheres depois do câncer e que todos os tipos de atividade sexual – oral, vaginal e anal – diminuíram após a doença". Em algumas passagens mais pesadas, o livro descreve as maneiras nas quais o tratamento inibe o romance.

Ns seções mais informativas, os autores explicam como assegurar que "o imperador de todos os males" não vai governar nem destruir os relacionamentos dos leitores. Primeiramente, Saketh e Maryann dizem que não devemos "rotular a vida amorosa como não funcional só porque lemos alguma coisa dizendo o que é 'normal', ou 'na média'".

Casal, casal de mãos dadas - Getty Images - Getty Images
Sexo não deve ser confundido com penetração ou relação sexual, de acordo com os autores. Beijos, mãos dadas, abraços, carícias e massagens mantêm a excitação e o ardor
Imagem: Getty Images

Exercícios de foco sensorial ajudam

Sexo, enquanto termo mais amplo, não deve ser confundido com penetração ou relação sexual, de acordo com os autores. "Não há nenhuma disfunção se os dois integrantes do casal estão felizes com o nível e o estilo da intimidade que desfrutam". Beijos, mãos dadas, abraços, carícias e massagens unem casais ao manter a excitação e o ardor. Os autores não mencionam a palavra francesa "frottage", que significa atrito ou fricção; ela une muitas formas de estimulo que motivam a ternura e a emoção.

Com um terapeuta ou sozinhos, os parceiros podem tentar "exercícios de foco sensorial", que envolvem o toque exploratório sem a pressão para atingir um objetivo como o orgasmo. Exercícios do assoalho pélvico, vibradores, técnicas para lidar com a cicatriz e movimentos restritos, dilatadores, e lubrificantes: Guntupalli e Karinch abordam essas especificidades para incentivar os sobreviventes a redefinir o sexo após o câncer como uma fonte sensual de prazer, utilizando um leque de atividades.

Para ilustrar esse ponto, contam a história de Allis, paciente de 49 anos de idade com câncer de ovário que passou por "uma evisceração pélvica total" (remoção cirúrgica da bexiga, uretra, reto, ânus, vagina e colo do útero). Ela tem colostomia permanente e derivação urinária. Precisa usar dois sacos para recolher fezes e urina. Para sua tristeza, teve que abandonar as calcinhas sensuais e substituí-las pelas grandonas. Comprou uma cinta para proteger e esconder os sacos e uma camisola preta.

mulher espelho - Getty Images - Getty Images
Reaprender a gostar de si mesmo pode ajudar
Imagem: Getty Images

Mas sofre quando abraça seu marido, o que a faz perceber que "não dá mais para fazer sexo normal". Depois que ele lhe garantiu que poderiam ser criativos, começam a ter ideias visitando o que ela chama de "lojas marotas", e então explorar todas as formas possíveis para terem prazer juntos.

Mesmo sem ter que enfrentar essas deficiências fisiológicas extremas, a integrante mais jovem do meu grupo de apoio se percebe hoje "menos excitável e com menos tendência a ter orgasmos". Sua explicação de como cultiva "a arte do desejo" me pareceu brilhante, não só para as mulheres, mas também para os homens.

Ela usa o exercício para apreciar a grande resiliência de seu corpo, reconhece que está anatômica, psicológica e hormonalmente alterada, testa variações do sexo solitário e também amplia o período de preliminares com seu parceiro e experimenta o estímulo compartilhado de filmes, concertos e viagens para criar uma sensação de proximidade. Como sua cama conjugal se tornou a cama de tratamento, ela redecorou o quarto com estimulantes sensoriais. O ambiente agora promove a alegria na vida dela e de seu parceiro.

Quando Eros desaparece, livros e conversas podem ajudar casais a se preparar para o retorno do pequeno deus. Como disse uma vez a poetisa Marianne Moore, em um contexto inteiramente diferente: "Seja qual for o problema, devemos tapear a sensação de aprisionamento, mesmo que a única coisa que possamos dizer a nós mesmos seja 'se não agora, mais tarde'". Para muitas pessoas, antes tarde do que nunca.

Porém, percebi que esse não é o caso para todos quando minha contemporânea e companheira acadêmica Nancy K. Miller respondeu ao meu pedido de comentários sobre a questão do sexo após câncer. Agora com mais de 70 anos, ela consegue, como eu, controlar a doença há muito tempo. Com a mesma sinceridade que associo à intimidade que busco, ela retrucou: "Você espera que eu me lembre de sexo?". Minha risada foi um prazer, pois me deliciei com a sinceridade de minha amiga.

SIGA O VIVABEM NAS REDES SOCIAIS

Facebook: https://www.facebook.com/VivaBemUOL/
Instagram: https://www.instagram.com/vivabemuol/
Inscreva-se no nosso canal no YouTube: http://goo.gl/TXjFAy