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“Muita gente saiu queimada do BBB17”, avalia o diplomata Rômulo

Mauricio Stycer

16/05/2017 04h01


Um dos tipos mais originais a participar de um "BBB", o diplomata Rômulo Neves já voltou à vida normal e garante que tudo está como havia deixado antes de entrar na "casa mais vigiada do Brasil". Além do trabalho no Itamaraty, ele tem aproveitado os dias de folga para promover um livro de poesias que lançou no ano passado, "Terminal", e falar a platéias sobre os temas de seu interesse – "valores, posturas, sobre como a gente pode ter um Brasil melhor a partir das nossas atitudes".

Candidato a deputado federal em 2018 pela Rede, Rômulo esteve em São Paulo no Dia das Mães e aproveitou para autografar o livro na Reserva Cultural. Foi lá que conversou com o UOL sobre a sua experiência no "BBB". Falou que a produção ficou chateada com a sua postura "antijogo" e que chegou a pensar em abandonar a casa, mas pensou: "Vou estragar a brincadeira de 50 milhões de pessoas?"

Rômulo fala, também, sobre como viu o desempenho de alguns colegas: "Muita gente saiu queimada". Disse que ficou "surpreso" com o comportamento de Marcos na reta final, que levou à expulsão do médico, e que viu muita gente atuando no programa. "Funciona". Abaixo, os trechos principais da conversa:

A VOLTA AO ITAMARATY
Voltei há um mês, para a mesma mesa, para a mesma posição. Sou chefe da divisão de Oceania. Eu estava trabalhando em duas reuniões grandes antes entrar no "BBB". Durante a minha ausência, as reuniões foram marcadas – uma para 10 dias depois da minha volta e outra para 20 dias depois. Então, o primeiro tipo de contato que tive com meus colegas foi exatamente o mesmo tipo de contato que eu teria antes do "BBB". Foi um choque anafilático. Muita gente que poderia imaginar que o primeiro contato comigo seria com um ex-BBB viu que foi com o mesmo Rômulo que era antes.

COMO FOI PARAR NO BBB

Quando eu fui abordado, em Brasília, eu falei "não". Eu estava chegando no futebol quando um casal me abordou. Primeiro, não acreditei. Tinha cara de pegadinha. Fui pra casa, falei pra minha mulher, ela também não acreditou. Comecei a pensar: se eu der aula até os 80 anos eu não vou atingir um décimo do público que eu poderia alcançar se eu atingisse 1% da audiência do BBB. Falar sobre valores, sobre posturas, sobre como a gente pode ter um Brasil melhor a partir das nossas atitudes. Quando eu vou conseguir falar com um porteiro de prédio?

CÁLCULO DE VANTAGENS
Dou aula porque gosto de formar gente. Gosto de influenciar as realidades onde estou inserido. Acredito nisso. É piegas, é idealista, mas isso sou eu. Quando me foi oferecida a oportunidade de falar com esse tanto de gente e falar isso… E tenho uma carreira política em Brasília. Mas isso não pode prejudicar? Pode ajudar. Não vou passar vergonha. Não vou falar besteira e vou ter exposição, pensei. É muito mais provável que isso me ajude do que me atrapalhe.

PERIGOS DA EXPOSIÇÃO

O maior medo é as pessoas saírem de lá queimadas – e isso aconteceu. Pode até ter sido um sucesso no mundo do show business, mas do ponto de vista da credibilidade tem muita gente ali que saiu muito queimada. Não achava que isso ia acontecer comigo, e não aconteceu.

CANDIDATURA EM 2018
Desde que eu saí do governo do Distrito Federal e do PSB, em fevereiro de 2016, comecei a organizar minha candidatura à deputado federal em 2018. Me filiei à Rede. Isso independentemente de BBB. Eu falei isso lá. Eles sabiam.

POR QUE FOI SELECIONADO
Não sou ingênuo. Ter um diplomata no elenco era um elemento que chamava a atenção. A imagem pública do diplomata, longe da realidade, é de uma figura glamurosa que nunca participaria do BBB. Eles sabiam também que eu fazia triatlo, escrevia poesia, tinha um programa de rádio. Era um perfil que interessava. Na entrevista, eles viram que eu era uma pessoa mais ou menos normal, que não ia despirocar, mas que tinha potencial de ter conflito. Eu disse: "sou uma pessoa paciente, mas transparente". Pensaram: "esse cara vai perder a paciência". Não foi isso que aconteceu.

NÃO FOI BOM PARA O PROGRAMA
Concordo totalmente. Eles ficaram muito chateados. No primeiro mês, o Tiago teve que falar ao vivo para as pessoas exercerem os seus defeitos. E nesse dia eu fiquei muito revoltado. Não só que ele falou (sobre a organização) da cozinha. Eu passei o primeiro mês dirimindo conflitos. Inseri um joguinho que baixa a tensão (o chamado "Golpinho", uma versão de um jogo chamado "Coup"). Tenho total noção de que para a audiência tradicional não foi bom. Mas esse não era o meu objetivo central.

"SER CORRETO NÃO É CHATO"
Pode atrapalhar o jogo, dependendo do tipo de promessa que você fez para o seu interlocutor. Não fui eu que foi atrás. Eles me chamaram. O que eu tenho a oferecer é isso. Vai ter uma parte do público que vai gostar.

O que eu ofereci, em parte, era o que eles queriam. Primeiro, um perfil diferente do tradicional, um diplomata. Fizeram propaganda disso. Não sou bobo. Segundo, o fato de eu ser um anti-BBB foi utilizado na narrativa para tentar me vilanizar. Isso é útil pra narrativa. Essa utilidade eu tive. Quando eu percebi lá dentro que teria chances de isso estar acontecendo, pensei: já deu, já posso ir embora. Quando eu percebi isso? Quando o Pedro foi eliminado. O que estava sendo mostrado aqui fora era um pouco diferente do que estava acontecendo lá dentro. Quando percebi isso, deu.

Cheguei a pensar em pedir pra sair. Mas ia contra uma coisa minha. Eu aceitei entrar. Não era mais benéfico pra mim continuar, mas eu tinha aceitado entrar. Vou estragar a brincadeira de 50 milhões de pessoas?

As figuras de "vilão", "injustiçado", "perseguido" estavam sendo montados de um jeito diferente do que ocorria lá. Não tinha nenhum coitado, nenhum perseguido, ninguém que era vítima de nada.

A EXPULSÃO DO MARCOS
Nenhuma surpresa. Zero surpresa. O que eu via lá eram alianças pragmáticas para participar do processo BBB. Isso inclui popularidade, marketing, as estruturas que funcionam no programa – casal, vilão, personagem antagônico e tal… Eu tive a impressão que essas pessoas tinham estudado o BBB muito.

A violência foi surpresa. Não achei que fosse chegar a tanto. Mas, mesmo a partir da violência, o que aconteceu depois, o uso da violência como parte da disputa ali, tampouco foi surpresa. Quem é vítima? Quem denuncia? Quem usa? Quem não usa? E depois, "como era coitadinha", "eu amava"… Isso é script. E dá certo. Funciona. As pessoas sabem que funciona.

"Falem mal, mas falem de mim" é um negócio que funciona. Não que tenha sido planejado bater em alguém, mas quem quer viver uma vida normal depois de ter passado pelo BBB? Poucos, né?

Nosso amigo médico teria alcançado resultados muito parecidos sem precisar chegar a tanto. Rola realmente uma falta de inteligência emocional de olhar para os seus resultados e perguntar: "Eu quero chegar aonde? O que eu preciso fazer para chegar lá? Eu preciso passar uma determinada linha?" Para o programa, é ótimo (sair do script). Mas é um pouco de crueldade… Se não houvesse isso, não teria tanta audiência.

As pessoas gostam do drama, do conflito, mas não querem isso perto de si. Elas gostam do drama na terceira pessoa. E aí está a crueldade. As pessoas esquecem que aquele drama é de alguém, é real. As pessoas podem até viver o programa como personagens, mas aqui fora sofrem como gente real, passam vergonha, são cobradas aqui fora. Se o participante tivesse consciência disso, talvez não topasse encarnar um personagem com tanta veemência.

PRESENÇA VIP
Estou fazendo um filtrozinho. Que evento eu topo? Eventos que tenham algum significado com as atividades que eu faço. Me chamar para uma festa onde não conheço as pessoas, o tema não me diz respeito, me pagar uma grana e o cara chegar e me pedir: "Dança igual você dançava lá no BBB". Esse tipo de evento educadamente eu digo que não dá. Não vou correr esse risco.

BALANÇO
Recebi muitos retornos legais. Valeu a pena. Valeu a pena não entrar na onda, fazer uma outra coisa, ser chamado de chato, "o cara tá estragando o programa". Tudo bem. Mas para algumas pessoas, valeu. Foi bom.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.