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Ambientes proibidos para criança: falta tolerância ou pais não dão limites?

Carolina Prado e Simone Cunha

Colaboração para Universa

15/02/2019 04h00

O movimento "childfree" --ou livre de crianças-- nasceu com a proposta de agradar adultos que se sentiam incomodados com a presença de crianças. Estão se multiplicando os espaços em que crianças não são bem-vindas --como hotéis e restaurantes. Esses estabelecimentos alegam que o barulho infantil alteraria o clima de tranquilidade que desejam oferecer aos seus clientes. Por alguns pais, a iniciativa é tomada como uma afronta, uma atitude radical e discriminatória.

Por outro lado, quem não tem filhos argumenta que gritos, brigas e correrias atrapalham os momentos de lazer --e que alguns pais não fazem a menor questão de impor limites. "O fato de querer ir a um local mais tranquilo não significa que não gosto de criança. Mas, em muitas situações, elas fazem birra e realmente incomodam", diz Cristine Lore Cavalheiro, 35 anos, casada, sem filhos. 

Para Vera Iaconelli, doutora em psicologia pela USP e diretora do Instituto Gerar, faz sentido os pais se preocuparem em selecionar os locais onde vão levar seus filhos. "Os pais também precisam compreender que a função chata de dizer 'chega' cabe a eles. Não é para esperar que a outra pessoa venha e diga que a criança está atrapalhando, para que eles permaneçam com a imagem de bonzinhos diante dos filhos", diz a especialista. 

A enfermeira Marina Gomes Pereira, 30 anos, mãe de Luiza, de 9 meses, concorda. "Não é porque me tornei mãe que o mundo todo tem que se adaptar à maternidade. Eu penso nas pessoas que estão ao redor quando estou com a minha filha, mas também no bem-estar dela. E não é todo local que tem infraestrutura e entretenimento para a faixa etária em que a Luiza se encontra", afirma. 

Por outro lado, não é preciso isolar completamente as crianças de ambientes mais formais ou de espaços majoritariamente ocupados por adultos. De acordo com Edith Rubinstein, diretora do Centro de Estudos Seminários de Psicopedagogia, é necessário ter bom senso e buscar o equilíbrio. Ela explica que a criança precisa aprender a conviver e a se ajustar às mais diversas situações da vida em sociedade: "O limite é um contorno que irá ensiná-la e é fundamental sinalizar o que pode ser feito e o que não pode. Crianças devem compartilhar ambientes com adultos, mas precisam compreender que existem regras nesses locais". 

Juliana Falci Mendes Fernandes, 37 anos, advogada, mãe de Miguel, 5 anos, e Rafael, 2 meses, também não se sente incomodada com o fato de alguns locais sugerirem a entrada apenas de adultos. "Crianças não têm botão liga ou desliga e, muitas vezes, elas fogem do controle. O problema é que alguns pais não conseguem fazê-las parar. Outros, nem tentam, simplesmente largam seus filhos, sem se importar se eles estão incomodando outras pessoas", afirma. 

Atenção e diálogo são imprescindíveis

Para Sabrina Pierangeli, 36 anos, publicitária, mãe de Valentim, 3 anos, há uma falta de paciência generalizada com as crianças. Ela entende o movimento "childfree" como um tipo de discriminação. "A criança em sua natureza é barulhenta: ela corre, grita, pula e precisa de limites, claro, mas não pode ser podada. Hoje em dia, querem transformar as crianças em miniadultos", diz. Na avaliação de Edith, a não-aceitação de crianças em determinados locais soa um pouco arrogante. "Elas precisam ser sempre bem-vindas na sociedade e devem ser ajudadas para aprenderem a conviver bem". 

A falta de atenção e paciência dos próprios pais com os filhos, no entanto, é um agravante do problema. "Muitos saem com uma criança de dois anos e querem que ela fique quietinha. Cada adulto pega o seu celular e ambos acham que ela vai se distrair sozinha. Mas o que ela mais precisa é de atenção", diz Elisama Santos, consultora em educação não violenta e educadora parental. 

Outro erro comum é não fazer combinados com as crianças, antes mesmo de sair de casa. "É interessante que os pais digam com antecedência ao filho para onde irão e, principalmente, o tipo de comportamento que esperam da criança naquele lugar. Ela nem sempre sabe como deve agir e precisa dessa explicação", afirma Elisama. 

A especialista também defende que aqueles que não têm filhos busquem exercitar a empatia. "Muitas pessoas enxergam a criança como um problema do pai e da mãe, mas ela faz parte da sociedade. E é preciso entender que ela só irá aprender a viver no coletivo experimentando, ou seja, convivendo", finaliza.