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Paola Machado

É fome ou vontade de ir ao banheiro? Como decifrar o que sua barriga quer

Paola Machado

22/05/2019 04h00

Crédito: iStock

Ganhei um livro de uma paciente que me despertou diversos questionamentos a respeito da minha barriga. O nome dele é "Tenho monstros na barriga" de Tonia Casarin. É um livro maravilhoso para crianças sobre inteligência emocional. O livro começa com:

– Mamãe, tem alguma coisa aqui na minha barriga!

A mãe sempre diz:

– Você deve estar com fome. Ou com vontade de ir ao banheiro. 

Mas a criança tenta de tudo: vai ao banheiro, come banana, que é sua fruta favorita, e… nada!

– O que será que tenho na minha barriga, que nem minha mãe sabe?"

Dentro de várias situações o livro pontua "monstros na barriga", como alegria, tristeza, raiva, medo, coragem, curiosidade, orgulho e ciúme. Além de ser um excelente trabalho de inteligência emocional para crianças, me despertou uma questão que nunca tinha refletido: a grande maioria das pessoas nunca soube decifrar o sinal que aparece na barriga. 

A barriga ronca? Fome. A barriga dói? Deve ser fome. Já me deparei inúmeras vezes com minha filha: "Mamãe, minha barriga está roncando, não sei se é fome ou vontade de ir ao banheiro."

Apesar de não ser a análise central do livro, eu gosto de fazer sempre minhas interpretações além do proposto. E por que não trabalhar a compulsão e comportamento com alguns questionamentos básicos?

Já fiz aqui um texto sobre o comer emocional com uma tabela sobre o seu estado emocional e o horário das refeições. E por isso esse trabalho é tão importante, porque vocês já pararam para pensar que não existe reeducação alimentar principalmente para uma população que nunca teve educação alimentar? A maioria de nós não aprendeu o princípio básico do comer — não é a toa que somos os mestres no "pratão montanha".

Tudo na nossa alimentação tem um sentido. A salada, o prato principal e a sobremesa; não foi uma frescura que inventaram. Essa sequência é uma simples lógica de iniciar com fibras para dar saciedade, sinalizar o cérebro que tem comida chegando, aumentar o índice e carga glicêmica aos poucos e assim alimentar-se com consciência. E a sobremesa? Não vai ser uma bomba calórica elevando do nada aos montes seu índice glicêmico e ela estará ali no meio da fanfarra. Isso é simples, básico e não fomos educados a realizar o processo mais simples.

Imagine agora interpretar sua barriga? Não é fácil. Até bebezinhos já não éramos compreendidos. Chora, dá leite; chora, dá peito; chora, dá comida. Crescemos assim. Comendo por qualquer coisa. Para solucionar e silenciar os sinais da nossa barriga.

Então como sei o que minha barriga está querendo dizer?

Gostaria que refletisse agora: quão com fome você está? Você já estava pensando nisso antes de eu te perguntar? Agora que eu comecei esse assunto, você está com mais fome do que você estava há um minuto? Você já sentiu fome apenas algumas horas depois de comer uma refeição de um bom tamanho e se perguntou como você poderia estar com fome de novo tão rapidamente? Você já passou mais tempo do que o normal sem comer e notou uma misteriosa ausência de fome? Você já ficou nervoso e a fome apareceu na sequência? Ou você teve uma semana de trabalho intensa e comeu por merecimento sem mesmo ter nenhum sinal de fome, ou seja, por hábito?

É difícil entender a fome, não é mesmo?! A fome pode aparecer de forma distintas — e em momentos ou situações diferentes — dependendo da pessoa. Eu, por exemplo, não tenho um vínculo afetivo com a comida — não me condicionei a isso — então como, pura e simplesmente, por necessidade fisiológica. Já meu marido tem um apego emocional com a comida e é mais difícil entender quando é fome fisiológica de fato.

A fome é uma sensação muito interessante — é igual ao instinto biológico e à resposta aprendida. Pode aparecer como uma variedade de sensações físicas, mas a fome também tem dimensões psicológicas e até emocionais — e essas são particularmente suscetíveis à manipulação e à influência cultural.

Por exemplo, a maioria das pessoas costumava se alimentar de três a cinco ou até seis horas entre as refeições sem pensar duas vezes sobre isso. Não é que eles nunca tenham sentido qualquer sensação de fome durante essas horas. Só que essas sensações não foram percebidas como uma emergência. Pois então, essas crenças surgiram pelo padrão. Quando pensamos que o indivíduo é um padrão, caímos no grande erro. Cada um tem suas necessidade.

Mas como sei que o sinal é fome?

Quando sente uma dor ou desconforto do lado superior esquerdo do abdômen, pode sim ser dor relacionada fome. As dores da fome são causadas por fortes contrações no estômago quando está vazio. Essa sensação desconfortável é muitas vezes acompanhada de fome ou desejo de comer.

Apesar de serem chamadas de "fome", essas dores nem sempre indicam uma necessidade real de comer. Elas podem ser causadas por um estômago vazio e uma necessidade de comer ou podem ser causadas pelo fato de seu corpo estar em uma rotina de ingerir certa quantidade de comida ou comer em horários específicos do dia.

Temos uma necessidade extremamente individual, sendo que algumas pessoas não sentem a necessidade de comer com frequência ou de se sentirem satisfeitas. Outros experimentam as dores da fome mais rapidamente — e com mais frequência — se não ingerirem alimentos com uma periodicidade maior. Não há uma quantidade de tempo exata de sentir as dores após um período sem comer.

A dor de fome pode ser a maneira do seu corpo dizer que precisa de mais nutrientes. Você também pode sentir fome, porque seu estômago se acostumou a um certo sentimento de plenitude.

O estômago é um órgão capaz de se estender e contrair. Quando estende por comida e líquido, você tende a se sentir cheio. Quando faz muito tempo desde a última vez que você comeu ou bebeu, seu estômago fica mais "vazio" e pode contrair, fazendo com que você tenha fome.

Inúmeros fatores afetam seus sentimentos de fome, incluindo:

  • Alterações hormonais.
  • Ambiente.
  • Quantidade e a qualidade dos alimentos que você ingere.
  • Dormir de forma insuficiente.
  • Estresse ou ansiedade.
  • Desejo cerebral por alimentos calóricos.
  • Fatores emocionais.
  • Alimentação pobre em nutrientes essenciais.

As dores abdominais de fome raramente são causadas por uma condição médica. Se você está com dor abdominal intensa ou contínua, entre em contato com seu médico para obter ajuda. Isto é verdadeiro se as dores forem acompanhadas por outros sintomas como, febre, diarreia, náusea, tontura, vômito, dores de cabeça e/ou sentimentos de fraqueza.

Os sintomas de fome geralmente incluem dor abdominal, estômago roncando, contrações dolorosas no estômago, sensação de "vazio". Essas dores são frequentemente acompanhadas de sintomas de fome, como desejo de comer, desejo por alimentos específicos, fraqueza, tontura e irritação.

As dores da fome normalmente diminuem com a alimentação, mas podem diminuir mesmo se você não comer. Seu corpo é capaz de se ajustar ao que sente ser necessário para a plenitude do estômago. Com o tempo, as contrações do estômago diminuirão. No entanto, se você não estiver comendo o suficiente para obter nutrientes essenciais, será mais difícil que suas dores de fome desapareçam.

Como aliviar as dores de fome?

  • Tente comer refeições menores e com mais frequência. Sua ingestão calórica total, não a freqüência de suas refeições, é o que afeta a perda ou ganho de peso. Comer porções menores com mais frequência ao longo do dia pode ajudar a reduzir os desconfortos fome.
  • Certifique-se de que você está comendo uma dieta rica em nutrientes. Ingerir proteínas, grãos integrais, legumes, frutas e legumes dará ao seu corpo a nutrição que ele necessita, o que pode ajudar a prevenir as dores da fome.
  • Alimentos ricos em fibras ajudará com a sensação de saciedade. 
  • Durma o suficiente. Uma boa noite de sono ajuda a manter em equilíbrio os hormônios que influenciam nas sensações de fome e plenitude.
  • Tente se concentrar e aproveitar cada refeição enquanto a come.
  • Mantenha-se hidratado. 
  • Se for vontade, e não fome fisiológica, tente mudar o hábito — leia o texto sobre hábito.

Se não for fome, como sei o que é?

  • Dores na região superior do abdômen O desconforto na parte superior do abdômen geralmente está relacionado a problemas com os ácidos da dieta, portanto os antiácidos devem ajudar e, eventualmente, a dor deve passar. Se as dores persistirem, pode estar ligada a condições mais graves no estômago, coração, pulmões, aorta e outros órgãos. Se a dor não cessar poucos dias, procure um médico.
  • Inchaço e gases com dor de barriga Inchaço é uma queixa extremamente comum quando se trata de dores de barriga e muitas vezes está ligada à dieta, pois certos alimentos podem causar dor, desconforto ou sensação de inchaço. Evite alimentos gordurosos. Se a dor persistir, você pode estar com síndrome do intestino irritável (SII), procure um médico.
  • Dor na parte superior do abdômen e peito Terminou de jantar e está com uma apenas para dor e desconforto no abdômen e no peito? É muito provável que tenha comido rápido demais. Alimentos muito pesados e gordurosos, junto com uma rápida mastigação e comer com muita pressa, pode levar a esse desconforto. Esta sensação pode ser confundida com uma intolerância alimentar ou SII. Por isso, mantenha um diário alimentar para detectar padrões alimentares ou grupos de alimentos que afetam a sua saúde. Leve seu diário alimentar com você quando for ao nutricionista ou médico para identificar causas específicas.
  • Dor na parte inferior do abdômen A dor abdominal na parte inferior do abdômen é comum em mulheres em fase de ciclo menstrual — se mais de uma semana antes do período menstrual estiver sentindo cãibras, marque uma consulta com seu ginecologista, pois existe a cãibra de implementação, que é a fase que o óvulo recém-fertilizado "entra" na parede do útero. Se você não está perto de menstruar ou é um homem que sente esse tipo de dor sofre de dores, se ela aparecer rapidamente pode ser apendicite. A dor geralmente começa no meio do abdômen e pode aparecer e desaparecer (inicialmente). Dentro de algumas horas, a dor aparece do lado inferior direito e se torna constante e severa. Procure um médico.
  • Cólica abdominal Mais uma vez, as cólicas abdominais podem, na maioria das vezes, estar relacionadas ao período menstrual. Se você estiver passando por esse tipo de dor ao longo do mês, e não só nos dias que antecedem o período menstrual, procure um médico, pois podem ser sinais de miomas, doença inflamatória pélvica, endometriose ou adenomiose, que requerem tratamento médico.
  • Inchaço e diarreia Dores abdominais que vêm com inchaço e diarréia muitas vezes podem se apresentar junto com prurido e erupções cutâneas, e pode ser um sintoma de intolerância. Não há testes específicos para intolerâncias alimentares, por isso é importante manter um diário alimentar se você acha que tem esse problema. Se você sentir esses desconfortos com frequência, vale a pena dar uma olhada em quais alimentos e bebidas você está consumindo regularmente. Reduza as bebidas com cafeína, incluindo chá e café, e reduza a quantidade de álcool que você bebe. Parar de fumar, perder peso se você está acima do peso, não pular refeições, tentar ficar de pé durante o dia e ter a cabeça mais erguida à noite pode ajudar. Minimize a ingestão de alimentos ricos e gordurosos e tente não temperar demais.
Sugestão de leitura:
– "Tenho monstros na barriga" de Tonia Casarin.
Referências:
– Brunstrom J, et al. (2012). Episodic memory and appetite regulation in humans.
– Camps G, et al. (2016). Empty calories and phantom fullness: A randomized trial studying the relative effects of energy density and viscosity on gastric emptying determined by MRI and satiety.
– Cummings DE, et al. (2001). A preprandial rise in plasma ghrelin levels suggests a role in meal initiation in humans.
– Hill AJ, et al. (1986). Macronutrients and satiety: The effects of a high-protein or high-carbohydrate meal on subjective motivation to eat and food preferences.

Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.