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Débora Miranda

Homens buscam espaço em esporte olímpico que só permite mulher

Débora Miranda

23/02/2018 05h00

Muita luta e resistência. Assim as mulheres foram conquistando espaço nos Jogos Olímpicos, aos longo dos séculos. Na primeira edição, em 1896, a participação feminina foi vetada por Pierre de Coubertin, fundador do evento, que considerou não apropriado o envolvimento de mulheres nas disputas esportivas. Mas aos poucos, com muita superação, as mulheres foram ocupando seu espaço.

Só em 2012, nos jogos de Londres, pela primeira vez vez na história, todas as modalidades esportivas tiveram mulheres na disputa. No entanto, elas ainda são minoria. Em Londres, 44% dos atletas eram mulheres. No Rio, em 2016, esse número cresceu um pouco mais e ficou em 45%, atingindo a maior porcentagem da história, segundo dados do Comitê Olímpico Internacional _que tem como meta estabelecer atuações iguais de competidores de ambos os sexos.

Giovana Stephan e Renan Alcântara formam dupla no sincronizado (Reprodução/Instagram Dueto Misto Brasil)

E apesar de as mulheres ainda serem minoria, há nas Olimpíadas modalidades que não permitem a participação de homens, como a ginástica rítmica e o nado sincronizado. E, numa espécie de inversão histórica, agora são eles que estão tendo de lutar para conquistar espaço e ser aceitos.

Renan Alcântara é um desses homens. No nado sincronizado, ele atua em uma modalidade criada recentemente chamada dueto misto, que nada mais é do que uma dupla formada por um homem e uma mulher. Apesar de reconhecida pela FINA (Federação Internacional de Natação), a modalidade ainda não conseguiu espaço nos Jogos Olímpicos, que em sua próxima edição, em Tóquio-2020, terá novamente apenas meninas.

"Já foi um avanço os homens poderem participar das competições da FINA", afirma Giovana Stephan, que é parceira de Renan. "A federação pleiteou a inclusão dos duetos mistos nesta próxima Olimpíada, mas não saiu. É muito provável que em 2024 já deva entrar", afirma, esperançosa.

Renan conta que a demanda de incluir homens no nado sincronizado teria partido da própria organização das Olimpíadas. "Comentou-se até a retirada do esporte, por não ter a participação dos dois gêneros. Não é o objetivo das Olimpíadas manter essa distinção."

Giovana começou no nado sincronizado aos nove anos e desde os 15 integrava a seleção brasileira. Quando surgiu a oportunidade de criar uma dupla mista, foi escalada e topou na hora. "Eu já tinha feito de tudo dentro do esporte e sabia que seria capaz." Já Renan tem uma história bem diferente. Fez nado dos sete aos 12 anos, mas abandonou por causa da falta de espaço para homens na modalidade.

"Acabei indo para a dança. Fiz balé clássico, jazz, hip-hop. Aí, em 2015, me convidaram para essa vaga no nado. Fiz diversos testes e acabei entrando para a seleção com 25 anos. Comecei a treinar com a Giovana, que me ensinou basicamente tudo o que ela sabe. Ela já tinha ido a sete Mundiais, é uma atleta de ponta. E em 2016 ganhamos ouro no Sul-Americano."

A dupla espera que os duetos mistos entrem na Olimpíada em 2024 (Reprodução/Instagram Dueto Misto Brasil)

Renan conta que a dança e os anos dedicados ao nado durante a infância deram uma base grande para que ele pudesse entrar no esporte, mas diz que enfrentou dificuldades. "Para mim, no início, foi um choque. Foi muito difícil. Treinei mais de oito horas por dia durante um ano. Fôlego ainda hoje é um desafio. Nado sincronizado é um esporte muito complexo", define.

Sua experiência em uma modalidade sem espaço para homens e depois na dança fez com quem encarasse o preconceito desde cedo. "Foi complicado quando eu era criança, tive que aprender a lidar com isso. Até os atletas da própria natação e do polo aquático comentavam. Mas sempre foi minha paixão. Hoje, a aceitação do público é tão grande, da minha família, dos meus amigos, que o preconceito chegar a ser mínimo. Nem sinto mais nada."

Giovana destaca que cada vez mais países estão investindo nos duetos mistos e que a modalidade é bem-vista pelo público. "Calculo que deve haver cerca de 30 duplas competindo internacionalmente. Mas como o esporte não entrou nas Olimpíadas, há países que deixam de investir. Lógico que o Mundial já dá bastante reconhecimento, e a nossa modalidade é bem aguardada nas competições. As pessoas gostam de assistir, é uma prova querida pelo público", encerra.

Sobre a autora

Débora Miranda é jornalista e editora do UOL. Apaixonada por cultura. Acredita no poder transformador do esporte. Ginástica olímpica na infância. Pilates, corrida e krav maga na vida adulta. Futebol desde sempre. Corinthians até o fim.

Sobre o blog

Espaço para as histórias das mulheres no esporte, mostrando como a atividade física pode transformar vidas e o mundo. A ideia é reunir depoimentos sobre determinação, superação e empoderamento. Acima de tudo, motivar umas às outras. Vamos juntas?