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Antes de proibir, entenda por que o adolescente quer fazer plástica

A dismorfofobia (o medo de ter o corpo diferente de um padrão) é frequente em adolescentes - Thinkstock
A dismorfofobia (o medo de ter o corpo diferente de um padrão) é frequente em adolescentes Imagem: Thinkstock

Ludmilla Ortiz Paiva

Do UOL, em São Paulo

06/06/2013 08h05

Com a valorização cada vez maior de padrões estéticos, é natural que o tema cirurgia plástica surja precocemente nas famílias com adolescentes querendo se submeter a intervenções.

"Diante de influências tanto internas quanto externas, o adolescente se vê pressionado a desejar uma imagem que, muitas vezes, não é aquela que ele vê quando se olha no espelho”, afirma a psicóloga Claudia Baldo de Camargo. 

Psicoterapeuta corporal, Claudia integrou a equipe do Departamento de Cirurgia Plástica da Santa Casa da PUC do Rio de Janeiro (chefiada pelo cirurgião Ivo Pitanguy), e responsabiliza a mídia, que, nas palavras dela, "massacra e desinforma", por essa insatisfação com a própria aparência. "A mídia cria imagens de seres mutantes que correspondem a um mercado de biótipos artificiais", afirma.

O cirurgião plástico José Horácio Aboudib confirma a tese da psicóloga. "Existem muitos casos em que o paciente se enxerga de um jeito diferente do que é. Como quando uma menina magra quer fazer lipoaspiração ou sonha em reduzir o tamanho das mamas que são normais", diz Aboudib, que é presidente da SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica). "Já recusei casos como esses e, normalmente, encaminho-os para orientação psicológica ou psiquiátrica", ressalta.

Imagem distorcida

Segundo Claudia, a dismorfofobia (o medo mórbido de ter o corpo diferente de um padrão) é um quadro de distorção da imagem frequente em adolescentes, e é nesse estado que eles muitas vezes procuram a cirurgia plástica.

Assim, se o jovem tocar no assunto, o melhor a fazer é conversar. José Horácio Aboudib e o psicólogo Wálter Poltronieri, doutor no tema cirurgia plástica pelo Instituto de Psicologia da USP, afirmam que vale a pena considerar as motivações do adolescente para desejar a cirurgia plástica.

 


Wálter Poltronieri diz que é preciso desconfiar de casos de inveja momentânea que acontecem, por exemplo, quando uma adolescente visita a amiga que acabou de fazer cirurgia, viu que ficou legal e também quer fazer. "Também não considero saudável quando o desejo de mudar o corpo surge depois do término de um namoro, ao assistir a um programa de televisão ou folhear uma revista", diz .

O psicólogo também cita o adolescente que nunca fixa o seu desejo em uma parte do corpo específica. Durante um mês, reclama do nariz; no mês seguinte, seu foco de atenção muda para as mamas, por exemplo.

Todos esses casos podem mascarar algum tipo de conflito psicológico. "É inconsciente. Lá no fundo, o adolescente acredita que, depois da cirurgia plástica, ele vai recuperar o namoro ou trazer de volta a sua autoestima", diz Poltronieri, reforçando que essas atitudes escondem problemas que podem ser resolvidos longe da mesa de cirurgia.

Ajuda profissional

Contudo, a proibição dos pais diante da insistência do filho em se submeter ao procedimento pode gerar problemas. Os pais que proíbem vão conviver com um adolescente que não se sente no seu melhor. "Se a aparência física não está legal, a pessoa não se sente confiante e isso pode reprimi-la em outros aspectos”, afirma Poltronieri.  Além disso, a adolescência é a fase em que começam as primeiras experiências de conquista, o que pode impelir o jovem a procurar um cirurgião assim que tiver autonomia financeira.

Há que se considerar também que existem problemas reais. "Há meninos com mamas muito grandes (ginecomastia, crescimento das glândulas mamárias em homens ou pseudoginecomastia, quando o crescimento é causado pelo acúmulo de gordura) e gorduras localizadas que se tornam motivo de vergonha, entre outros inúmeros casos em que a família pode considerar a cirurgia", diz José Horácio Aboudib. "Se a alteração é muito visível e está causando problemas reais, ela pode ser coberta pelo plano de saúde ou até mesmo pelo SUS", completa.

Por isso, Claudia Baldo de Camargo aconselha a família a escutar um profissional de cirurgia plástica e sua equipe. Eles podem auxiliar para um entendimento tanto da urgência do adolescente quanto da postura dos pais. "O cirurgião criterioso, responsável, ajudado por uma equipe multidisciplinar, pode ajudar no processo de formação da autoestima do adolescente”, declara Claudia.


Reparadora versus estética

Cirurgiões dividem a cirurgia plástica em dois tipos: reparadora e estética. A primeira corrige defeitos na morfologia ou na função de alguma parte do corpo, e a segunda é para melhorar a aparência física.

Para o psicólogo Wálter Poltronieri, existe uma grande diferença entre as duas modalidades. "Na estética, a pressão é interna: a pessoa acredita que quem é bonito se sai melhor." Aboudib entende que, de qualquer forma, os dois casos incomodam. Levá-los a cabo vai depender do nível de incômodo do adolescente e da cultura de cada família.

“A cirurgia de lábio leporino é reparadora, mas dá um resultado estético fantástico", afirma o cirurgião Pedro Martins, coordenador da residência médica e chefe do serviço de cirurgia plástica do Hospital São Lucas da PUC do Rio Grande do Sul. Na opinião de Martins, nem sempre é possível dividir a cirurgia plástica em dois tipos distintos, sem que um resultado final não envolva o outro.

Maturidade física

De acordo com os cirurgiões Pedro Martins e José Horácio Aboudib, a cirurgia plástica, independentemente do local do corpo, deve ser realizada após o adolescente completar seu crescimento físico. Há meninos que, aos 14 anos, atingiram o ponto máximo de crescimento, o que permite, segundo Aboudib, a realização da intervenção. Nas meninas, de acordo com o médico, a maturidade corporal chega, normalmente, dois anos depois da menarca (a primeira menstruação).

Cirurgias que mexem com a estrutura óssea, como a do nariz, só devem ser realizadas depois que os ossos do jovem tiverem sido formados. Pedro Martins explica que, para verificar, basta fazer uma radiografia de um osso, como o do punho. Se houver cartilagem perto das articulações, é sinal de que o adolescente ainda não se desenvolveu completamente. Se não há cartilagem, sua estrutura óssea está formada e a cirurgia pode ser feita.

Em casos como implantes de próteses mamárias ou lipoaspiração (as duas cirurgias plásticas mais realizadas no Brasil, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica), o cirurgião deve solicitar o parecer de um ginecologista ou de um mastologista. “Apesar de uma prótese mamária não interferir na funcionalidade da mama, é preciso ter o laudo de um ginecologista, que vai indicar se o corpo da pessoa está maduro o suficiente para recebê-la”, diz Martins.