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'Coleira' para criança, contentor não substitui limites dados pelos pais

Com receio de encarar um aeroporto lotado com o filho, Suelen comprou a mochila-coleira para o filho, Théo - Reinaldo Canato/UOL
Com receio de encarar um aeroporto lotado com o filho, Suelen comprou a mochila-coleira para o filho, Théo Imagem: Reinaldo Canato/UOL

Rita Trevisan e Thaís Macena

Do UOL, em São Paulo

20/08/2013 08h05

No Japão, na Europa e nos Estados Unidos, o acessório é bastante popular. E entre os adeptos da ideia, a menção à coleira usada em animais é evitada, por ser considerada pejorativa. “O nome correto para o objeto é contentor, mochila-guia ou ainda cordão de confiança”, diz o psicólogo Reginaldo do Carmo Aguiar, especialista em terapia comportamental pela UFU (Universidade Federal de Uberlândia).

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Seja qual for a denominação, o uso do acessório tem se intensificado no Brasil e vem gerando bastante controvérsia entre pais e profissionais da educação.

Para Aguiar, recorrer ao contentor é uma estratégia viável quando os filhos são agitados demais. “Crianças que querem muito explorar e que, frequentemente, soltam-se das mãos dos pais e saem correndo, colocando em risco sua integridade física, podem se beneficiar do acessório. Além do mais, o perigo urbano é real. O cuidado que os pais têm hoje deve ser maior do que a 20 anos atrás, porque aumentou o trânsito de carros, a quantidade de pessoas nas ruas e a violência.”

Para funcionar bem nesses casos, o contentor deve ter uma faixa de tecido que não machuque a criança e que, de preferência, seja comprida e regulável. Assim, ela não tem a sua mobilidade totalmente restringida.

Outro cuidado é que, para não ferir a criança, física e emocionalmente, os pais não se valham de trancos e puxões para chamar a atenção do filho, quando ele começar a se distanciar muito.


No mais, os especialistas alertam que é preciso evitar o uso constante da peça, pois ela pode atrapalhar a conquista da autonomia e o aprendizado de limites, fundamental para que a criança se desenvolva plenamente.

“Esses contentores foram pensados para serem usados em crianças com idade entre 18 e 36 meses, que não têm qualquer compreensão de riscos e perigos. Porém, conforme vão crescendo, é importante que a criança viva situações de separação dos pais –ainda que momentâneas–, que experimentem o mundo conforme a sua curiosidade e que aprendam a dizer não aos perigos”, declara a psicanalista Gláucia Faria da Silva, do Hospital Infantil Sabará, em São Paulo.

Segurança ou comodidade

Para a assistente-administrativa Suelen Cavalcante Vida, 28 anos, o uso do contentor é uma estratégia para garantir que os filhos, Théo Marques Cavalcante, 2 anos e 6 meses, e Sofia, 1 ano e 4 meses, não se percam dela em ambientes lotados, quando ela precisa sair sozinha com os dois.

“Comprei um porque tive de fazer uma viagem sozinha com as duas crianças e fiquei em pânico só de me imaginar em um aeroporto, em época de final de ano, com eles. Comprei um modelo mochilinha que o meu filho adora usar”, fala.

Suelen lembra que teve dificuldade para achar o item no Brasil e teve de pedir a uma amiga para trazê-lo do exterior, desembolsando uma quantia correspondente a R$ 40. “O Théo é muito curioso, gosta de andar. E o acessório o deixa com as mãos livres para explorar o quanto quiser. Apesar disso, garante a segurança. A Sofia eu, normalmente, levo no colo”, diz.

Ela conta que, antes de optar pelo contentor, passou por maus bocados com as duas crianças em ambientes com grande circulação de pessoas. “Uma vez, em um shopping, o Théo saiu correndo e eu, com a Sofia no colo, não conseguia alcançá-lo. Foi sorte ele trombar com um vigia, que fez a gentileza de segurá-lo para mim. Em outra oportunidade, estava com ele em um restaurante flutuante e ele quase caiu na água, porque saiu correndo da mesa de repente. Por tudo isso, acho que usar o acessório, em ocasiões bem específicas, é importante para garantir a segurança dele”, fala Suelen.

Pensar no bem-estar da criança, e não no conforto próprio, parece ser a chave para o bom uso do recurso. “O contentor não pode ser a única forma de controle sobre a criança, assim como também não deve ser usada simplesmente para garantir mais comodidade aos pais. É fundamental que, no papel de educadores, eles se comuniquem com o filho e ensinem limites desde cedo”, afirma o psicólogo Reginaldo do Carmo Aguiar.

Entre os que são contrários à ideia do contentor, mesmo o uso em situações especiais é recriminado. “Os pais devem frequentar lugares onde se sintam seguros para levar seus filhos, principalmente, se têm dificuldade de controlá-los”, declara a psicóloga Maria Alice Fontes, do Núcleo de Estudos do Comportamento e Desenvolvimento do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

Para ela, uma criança que é segurada firmemente pelas mãos dos adultos em situações de risco, em geral, já está devidamente protegida. “Se uma criança precisa ser presa por uma coleira, provavelmente, está no local errado ou, então, está tendo um comportamento opositor que precisa ser compreendido e tratado pelos pais, fora de locais públicos”, diz.

Outra possibilidade sugerida por opositores desse artefato de contenção é o uso de carrinhos dobráveis. “Sem dúvida, essa solução é mais segura e, sob certos aspectos, menos constrangedora. Porém, a contenção é muito maior, a criança fica impossibilitada de seguir a sua curiosidade natural e aprende menos dos estímulos vindos do ambiente”, afirma o pediatra Benedito Scaranci Fernandes, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).