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Como agir se a criança acha que a escola exige menos do colega deficiente

Aos serem questionados, os pais não devem estereotipar as crianças com deficiência - Getty Images
Aos serem questionados, os pais não devem estereotipar as crianças com deficiência Imagem: Getty Images

Izabel Carvalho

Colaboração para o UOL, em São Paulo

04/09/2016 07h20

Na sala de Joana*, 8, aluna do segundo ano do ensino fundamental de uma escola particular da zona oeste de São Paulo, há um aluno com deficiência intelectual. Por conta de seu atraso de desenvolvimento, o garoto recebe atividades diferentes dos colegas e, por vezes, pode sair da sala, em momentos que as demais crianças não podem. Incomodada com o que ela julga um tratamento preferencial, Joana tem questionado os pais e se sentido injustiçada. Acha que o colega tem menos obrigações do que ela no dia a dia.

Carla, mãe da menina, tem procurado conversar com a filha sobre as necessidades especiais do colega, mesmo sem saber exatamente o que falar, já que nem ela nem os outros pais receberam orientações da escola sobre como lidar com eventuais questionamentos dos filhos.

“Sei que a escola tem como prática incluir alunos com deficiência, o que apoio, mas sinto falta de uma conversa que nos dê elementos para responder perguntas como as que Joana me faz e assim ajudar no entrosamento da classe”, diz Carla.

Silvia, mãe de Gabriel, estudante do ensino fundamental também na capital paulista, tem enfrentado o mesmo dilema.

“As crianças são muito sinceras. Um dia, meu filho de seis anos comentou que havia um menino diferente em seu grupo. Perguntei como ele sabia, e ele respondeu que os colegas estavam comentando. A escola nunca falou sobre o caso, se soubesse que havia uma criança com deficiência no grupo, teria abordado o assunto antes com ele”, fala.

Segundo Rodrigo Hübner Mendes, especialista em educação para crianças com deficiência, fundador do Instituto Rodrigo Mendes --organização não governamental que tem como missão colaborar para que a pessoa com deficiência tenha educação de qualidade na escola comum--, os pais não devem nem disfarçar nem estereotipar as crianças com deficiência, mas falar abertamente e enfatizar a consciência de que todos merecem aprender juntos.

“Os desafios e conflitos da convivência devem ser tratados caso a caso por meio do diálogo respeitoso e sincero, pautado por sensibilidade e cuidado”, diz Mendes.

Um caminho para os pais é pedir para conversar com o professor da sala do filho ou com o coordenador pedagógico da escola.

“Muito provavelmente, as indagações devem ser comuns às outras crianças e, sabendo delas, a professora poderá trabalhar para melhorar o entrosamento de todos. É preciso que a criança entenda que se trata de uma característica do colega e não de um privilégio”, fala o educador Luiz Henrique de Paula Conceição, coordenador de formação do Instituto.

As reuniões periódicas de pais também podem ser espaço para troca de ideias sobre inclusão, mas sem tratar especificamente da criança com deficiência, para não expô-la.

“Tanto as famílias quanto o educador têm o dever de transmitir à criança a noção de que as pessoas são inevitavelmente diferentes entre si”, declara Mendes.

Nana Navarro, assessora de práticas inclusivas do Colégio Oswald de Andrade, em São Paulo, afirma que, quando um estudante questiona o tratamento dado a um colega com deficiência, é hora de dar mais espaço para discussão.

“Pais e professores devem evitar respostas automáticas, que indiquem apenas que a criança tem uma deficiência ou que alguns merecem estar na escola e outros não. Ao conduzir a situação, a escola precisa considerar como a criança que questiona se relaciona com as demais”, fala Nana.

A neuropediatra Paula Girotto diz que se a criança sabe exatamente o que se passa com o colega com deficiência pode entender mais facilmente a situação de forma positiva. “É papel dos pais reforçar a diversidade social.”

*Nomes trocados a pedido dos entrevistados.