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The Voice Kids: encarar logo cedo a rejeição faz bem ou não para a criança?

Ivete Sangalo, uma das treinadoras, abraça candidata do "The Voice Kids" na estreia da segunda temporada - Isabela Pinheiro/Divulgação Globo
Ivete Sangalo, uma das treinadoras, abraça candidata do "The Voice Kids" na estreia da segunda temporada Imagem: Isabela Pinheiro/Divulgação Globo

Adriana Nogueira

Do UOL

17/01/2017 12h40

Quando um episódio do programa “The Voice Kids” vai ao ar na Globo, a internet é inundada de comentários de pessoas lamentando as eliminações dos candidatos mirins. Alguns tratam o "não" recebido pelos treinadores como uma tragédia. Será que é?

Lidar com a rejeição é algo que o indivíduo começa a aprender na infância, mas o impacto de isso acontecer em um programa de TV pode ser maior. "A criança vive aquilo intensamente e, se ela não for preparada para perder, pode ter uma marca muito séria", afirma a terapeuta familiar e psicodramatista Miriam Barros.

Ser preparada quer dizer que os pais devem falar que não ganhar faz parte do programa e não deve ser visto como fracasso, já que estar ali participando –entre tantas outras que se candidataram– já é um mérito.

“O problema é quando os pais não têm condições emocionais de fazer isso. Quando depositam no filho as próprias expectativas e sonhos. Esses não têm como ajudar. Daí a importância de programas do gênero oferecerem suporte psicológico, declara Miriam. A TV Globo informa que dá suporte psicológico a todo o elenco infantil da emissora, e tem um trabalho específico para as necessidades do ‘The Voice Kids’ –disponível, também, para os jovens e seus responsáveis..

A pedagoga Daniela Fischer conta que tem se dividido em apoiar o sonho da filha Nicole, 11 anos, de ser modelo e fincar os dois pés da menina na realidade. “Falo que é difícil conseguir, que é muito competitivo. Também tenho filtrado muito as seleções das quais ela participa. Se vejo que vai ter chá de cadeira ou deixarão as crianças esperando sem nem um lanche, não levo ou, se estou lá, viro as costas e vou embora.”

Daniela Fischer e a filha Nicole, personagens de matéria de UOL Gravidez e Filhos - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Daniela Fischer e a filha Nicole
Imagem: Reprodução/Facebook
 Daniela fala que tenta “abafar” a vontade da filha, mas não se sente no direito de barrá-la. “Ela diz que é com isso que vai trabalhar. Então falo que ela tem de se preparar, estudar línguas, e que a escola vem antes de tudo. Até agora, foram poucos testes, mas ela fica chateada e chora quando não passa.”

Na opinião da psicóloga Rosely Sayão, mais do que a dureza de ter de lidar com a rejeição, o problema é que programas do gênero expõem a criança em uma fase em que ela está desenvolvendo a personalidade.

“A criança está aprendendo a lidar com a vida pública e deveria fazer isso na escola, sob a tutela de adultos responsáveis, e não na TV”, afirma a psicóloga e consultora em educação Rosely Sayão.

 Como o aprendizado está se dando na frente de milhões de pessoas, fica uma confusão do que é público e do que é privado. “A criança que está ali e perde, chora na frente de todo mundo. O reflexo disso é que nunca se viu tanta gente que não hesita em chorar no ambiente de trabalho. E não é na frente de qualquer pessoa que demonstramos meus sentimentos mais íntimos.”

Para os pais que justificam a participação dos filhos em competições similares com o argumento de que o mundo é competitivo e é bom que a criança ou o adolescente aprenda a se virar, Rosely faz um contraponto. “A competição será ensinada de qualquer maneira. O que se precisa aprender hoje em dia é colaborar.”

Segundo Miriam Barros, programas do gênero, por terem muita repercussão, não impactam as crianças apenas nas situações de fracasso. “Com a vitória, a criança se sente uma estrela, mas ela também precisa estar pronta para quando isso acabar.”