Topo

Até bebês em troca de dinheiro: mulher conta como realizou sonho de ser mãe

"Fiquei apaixonada em um segundo", conta Ana Davini sobre o momento em que conheceu a filha, Thalita (na foto) - Arquivo pessoal
"Fiquei apaixonada em um segundo", conta Ana Davini sobre o momento em que conheceu a filha, Thalita (na foto) Imagem: Arquivo pessoal

Denise de Almeida

Do UOL

18/01/2017 04h01

A jornalista Ana Davini e o marido Daniel Ramirez passaram oito anos atrás da resposta para a pergunta: “Quando vocês vão ter filhos?”. Nesse período como “tentantes”, até a chance de adoção ilegal cruzou o caminho do casal. Ao menos cinco pessoas a procuraram para oferecer crianças e uma delas pediu R$ 20 mil por bebês gêmeos. Eles recusaram, mas essa foi apenas uma das batalhas que o casal enfrentou para realizar o sonho de ser mãe e pai por meio de métodos não-naturais.

A história deles começou com a descoberta de uma endometriose severa e passou por tratamentos de reprodução assistida, que, Ana descobriu depois, não teriam como dar certo. “Foi uma perda de tempo e de dinheiro”, ela explica. Em depoimento ao UOL, Ana contou a saga do casal até conhecer e se apaixonar pela filha, Thalita. Conheça abaixo a história desta família.

Índia quase foi a solução

Começamos a pensar em filhos em 2005 e tentávamos naturalmente, sem pressa, porque a gente tinha acabado de casar. Depois de quatro anos, como não acontecia, fomos fazer exames para tentar descobrir o que a gente tinha. Então foi detectada uma endometriose severa. Eu estava no grau 4, que é o mais avançado, mas os médicos falavam que ainda havia chance.

Na sequência, fiz uma inseminação artificial, que não deu certo, e depois uma fertilização in vitro, que também não deu certo. O mais difícil é a frustração nessa hora. Você se empenha tanto, é uma vontade enorme de que a coisa aconteça, você não acredita que vá dar errado.

Pensamos em desistir, até, mas a vontade de ter um filho foi maior e continuamos tentando. Mas é muito doloroso você querer tanto uma coisa e demorar tanto. Não estava disposta a enfrentar mais uma fertilização. É desgastante demais tanto financeiramente quanto emocionalmente e fisicamente.

Cheguei a pensar em barriga de aluguel, peguei formulários, entrei em contato com clínicas na Índia. Levei bastante a sério isso, mas meu marido não quis. Lá é tudo legalizado e para mim era uma possibilidade, porque é tudo mais rápido do que a adoção pelo fórum. Mas ele não quis por uma questão ética, achava que era uma exploração do corpo de outra mulher e se recusou terminantemente a discutir o assunto. 

adoção, mãos, bebê, familia - Getty Images - Getty Images
A espera na fila de adoção levou dois anos para Ana e Daniel, mas pode demorar muito mais
Imagem: Getty Images

As opções de adoção ilegal surgem aos montes

Outra possibilidade foi a adoção internacional. Alguns países permitem que brasileiros adotem legalmente: é o caso do Peru, República Dominicana, China, Rússia. Pensei nisso, mas não levei para frente. É um custo altíssimo, tem que fazer várias viagens ao país em questão. Na barriga de aluguel seriam só duas viagens. Em uma adoção internacional às vezes você tem que passar três meses no lugar, é muito mais complexo.

A adoção ilegal é muito tentadora, porque ela é muito mais rápida e tem milhões de caminhos possíveis. Quando você quer, conversa com um, conversa com outro... para nós apareceram, por baixo, cinco oportunidades. Mas a gente ponderava e depois percebia que não daria certo. Teve um caso de uma mulher que falou que ia dar os filhos gêmeos dela. Depois, ela pediu dinheiro: R$ 20 mil. Não aceitamos e só não denunciamos a mulher porque ela desapareceu.

As oportunidades de adoção ilegal surgem mesmo, com a maior facilidade. Todo mundo sabe de alguma chance, mas é realmente perigoso: não só pela Justiça, mas você pode perder o filho que você já pegou amor, já se envolveu. De repente você vê seu filho tirado de você.

O processo legal também cometeu um erro grave

Meu marido sugeriu entrar na fila da adoção e eu topei. Ficamos lá dois anos, o que é muito rápido, até. E isso só porque a gente acompanhou de perto. Monitorávamos pelo site do Tribunal de Justiça o andamento do nosso processo. A cada vez que eles demoravam a encaminhar nossa ficha para outro setor, a gente ia lá pessoalmente, para saber o que estava acontecendo.

Essa era a forma como a gente conseguia monitorar de perto e fazer a coisa andar. Algumas vezes a gente achou a nossa ficha perdida em uma pilha de documentos! Tenho amigas que não acompanhavam tão de perto e que demoraram de quatro a seis anos para conseguir adotar.

Quando deu certo, a gente, na verdade, já nem esperava mais. Um pouco antes de acontecer, recebemos a indicação de uma criança. Quando você entra com o processo de adoção você pode escolher o perfil da criança que você quer: se menino ou menina, idade, raça. Não tínhamos feito nenhuma restrição, a não ser problema de saúde grave.

Daí, em janeiro de 2013, nos chamaram para indicar uma menina que tinha paralisia cerebral. Como estava fora do nosso perfil e não teríamos condições de adotá-la, a própria assistente social pediu desculpas pelo erro deles. Ela admitiu que não tinha lido nossa ficha. Depois de uma sucessão de frustrações, essa foi mais uma enorme. O Ministério Público ainda fez a gente repetir o processo de avaliação psicológica para poder comprovar que a gente queria mesmo uma criança e nisso perdemos seis meses. A gente não merecia ser penalizado porque o erro não tinha sido nosso.

Já estávamos muito desencanados, por conta disso. Até que eles ligaram para nós numa segunda, falando que tinham uma criança para indicar. Não contaram nada: a gente não sabia sexo, idade, nada. Pediram para irmos no dia seguinte no Fórum. Na terça-feira eles leram a ficha e perguntaram se a gente tinha interesse em conhecer pessoalmente. Na quarta-feira a gente foi visitá-la e, na quinta, ela já foi morar com a gente.

Você fica em choque, a palavra é essa. Você espera tanto, tanto, tanto e depois, na hora em que acontece, você percebe que não estava pronto. Você vê sua vida virando do avesso. É uma coisa muito louca, porque eu nunca acreditei em amores instantâneos, incondicionais, tudo isso. Eu sempre acho que vai nascendo aos poucos, com a convivência. Achava isso também em relação à adoção, mas não é. Eu vi minha filha, olhei para ela e sabia que ela era minha filha. Fiquei apaixonada em um segundo. Paguei minha língua (risos)!

Também está tentando? Veja os conselhos da Ana

  • Se estiver pensando em adoção, o primeiro ponto é nunca cair na adoção ilegal. É tentador, muito mais rápido e muito mais fácil, mas também tem riscos muito grandes. 
  • Se você entrar em um processo de adoção legal, mantenha-se muito presente. Acompanhe o processo pelo site do Tribunal, faça visitas ao Fórum, porque senão a coisa vai demorar muito tempo.
  • Antes de partir para um especialista em reprodução humana, procure um médico de confiança. O especialista quer te convencer que o tratamento dele é eficaz e que você vai conseguir. Ele não pede exames que já podem dar um indicativo de que não adianta fazer uma fertilização em um caso extremo. Ele pede três, quatro exames básicos e simplesmente já parte para a fertilização. Te vende uma ideia de que é possível de qualquer forma. No meu caso, foi uma perda de tempo e de dinheiro. Depois consultei outros médicos, não tinha sentido eu ter feito a fertilização.