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Bebê chorão? Dar comida nem sempre é a solução

Getty Images/iStockphoto/kirza
Imagem: Getty Images/iStockphoto/kirza

Dra. Perri Klass

The New York Times

29/06/2017 12h53

Alimentar um bebê com fome parece ser uma das tarefas mais básicas da vida dos pais, mas desde o princípio, a forma como cada bebê come, ganha peso e cresce é um misto complicado de comportamento e biologia entre pais e filhos.

Parte dessa equação é saber se o bebê está com fome, ou se os pais estão dando comida ao menor sinal de irritação. O Dr. Ian Paul, professor de Pediatria e Saúde Pública na Faculdade de Medicina da Universidade Estadual da Pensilvânia, é um dos líderes do Insight Study, uma intervenção iniciada em 2011 para observar os efeitos de ajudar os pais a aprender estratégias de "criação responsiva", que os ajudam a compreender os sinais passados pelos bebês. "Muitas pessoas dizem para as mães darem comida na hora que os bebês pedem, mas raramente explicam como identificar esse momento", afirmou.

Segundo ele, durante a intervenção os pais aprendem a reconhecer o que é fome, já que bebês famintos naturalmente precisam ser alimentados, mas também aprendem estratégias alternativas para acalmar bebês que estão chorando por outras razões. Um bebê que está irritado, mas sem fome, vai ficar mais calmo com um líquido doce, o que pode gerar outros problemas mais adiante, afirmou Paul. "Sua capacidade normal de regular suas emoções é sobreposta pelo prêmio alimentar dado para que se acalme. Isso se projeta para o resto da vida - quando ficam chateados ou frustrados, a comida se torna um mecanismo para aplacar essas emoções."

Durante a intervenção, os pais aprendem a acalmar o choro do bebê utilizando estratégias que não envolvem comida, incluindo enrolar no cobertor, reposicionar, usar ruído branco, e ninar. Além disso, também recebem informações sobre quanto choro é normal em cada idade.

Os resultados do estudo mostram que, quando os pais recebem o treinamento, os bebês têm menos chances de apresentar sobrepeso antes do primeiro ano de idade; eles também dormem melhor do que os do grupo de controle, no qual os pais receberam um treinamento de segurança, ao invés de conselhos de criação responsiva. "Os pais e avós geralmente são abertos a receber esse tipo de informação", afirmou Paul, mas que geralmente não faz parte dos cuidados básicos com o bebê.

"Nos primeiros dias de vida, os pediatras dizem que os pais devem acordar os bebês a cada três horas para garantir que recuperem o peso do parto. Mas é impressionante como encontro gente que, depois de dois meses, acha que ainda tem que fazer isso, porque os médicos não disseram que deveriam parar."

Um novo estudo mostrou que mais de 10 por cento da população do mundo é obesa, com enormes consequências médicas e de saúde pública. Entre os muitos fatores a serem levados em conta está a ciência de como cada pessoa come e engorda desde o começo da vida.

Bebês diferentes fazem demandas diferentes aos pais. "Boa parte da minha pesquisa gira em torno das características específicas de cada bebê”, afirmou a Dra. Julie Lumeng, professora de Pediatria da Universidade do Michigan. Ela enfatizou que a obesidade não é bem compreendida pelos cientistas; muitos pesquisadores creem que a obesidade infantil pode ser evitada por meio do aleitamento materno, ou por meio de diferentes estratégias para a introdução de alimentos sólidos, mas nada disso se baseia em estudos.

Segundo ela, a intervenção de criação responsiva foi um estudo bem conduzido, que ilumina a dinâmica da alimentação no início da vida, mas argumenta que mais pesquisas são necessárias sobre as características dos bebês. "Os bebês nascem com diferentes temperamentos, e eu não acredito que seja loucura dizer que alguns bebês são comedores vorazes, e exigem diferentes tipos de criação", afirmou.

O estudo Gemini, realizado no Reino Unido, que acompanha 2.400 gêmeos nascidos no país em 2007, oferece insights importantes sobre as diferenças no apetite. O estudo foi criado para permitir que os pesquisadores comparem gêmeos idênticos - que têm o mesmo DNA - e gêmeos fraternos, que são mais diferentes geneticamente, mas crescem no mesmo ambiente familiar e ao mesmo tempo.

Os pesquisadores utilizaram um Questionário de Comportamento Alimentar do Bebê, perguntando aos pais sobre quatro diferentes aspectos do apetite infantil, a reação do bebê à oferta de leite, o quanto ele gosta de comer, se fica satisfeito com facilidade e se se alimenta rápida ou lentamente.

"Ficamos muito surpresos em ver como havia variação no apetite", afirmou a Dra. Clare Llewellyn, professora de pesquisa em obesidade comportamental no University College London, responsável pelo estudo. "Descobrimos que as diferenças de apetite entre os bebês têm um importante componente genético".

Em relação à velocidade com que se alimenta, a genética explica 84 por cento da variação de um bebê para o outro; quanto a gostar de comer, ela é responsável por 53% da variação. E entre os gêmeos fraternos do mesmo sexo, os bebês com mais apetite (que reagem mais positivamente à comida, ou demoram mais a ficar satisfeitos) ganham peso mais rápido que os irmãos.

"Alguns bebês nascem com determinados conjuntos de genes que os tornam mais reativos ao leite e a alimentos sólidos; alguns nascem com mais apetite. E também há outros cujas mães têm muita dificuldade para alimentar", afirmou Llewellyn.

Ou seja, mesmo no início da vida, com um bebê indefeso e uma única fonte de alimentação, a interação já pode ser problemática. "Nos extremos do espectro a coisa é muito mais complicada. Os pais devem entender os hábitos alimentares dos filhos, dando a quantidade de comida apropriada para seu apetite", afirmou Llewellyn.

Além disso, ajudar os pais a compreender e reagir aos bebês não é o mesmo que culpá-los pelo ganho excessivo - ou insuficiente - de peso de alguns desses bebês. "Quando a medicina não compreende um problema, geralmente atribuímos responsabilidades pessoais", afirmou Lumeng. Algumas pessoas parecem pensar que "como não compreendemos a obesidade, a culpa deve ser da falta de competência das mães".

As complexidades de classificar as variações de apetite dos bebês são apenas uma parte da compressão da complicada biologia e política social da obesidade, e como mudanças na disponibilidade de alimentos e no ambiente ao nosso redor podem afetar as pessoas de forma tão profunda.

"Até mesmo no caso dos bebês comilões, nosso objetivo é ajudar as crianças", afirmou Paul. "Às vezes estamos lá para dizer não. Dizemos não para muitas coisas, mas não damos alternativas - mas em nossa intervenção, o que tentamos é encontrar alternativas para os pais".