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Manuais de criação de filhos só servem para deixar mães angustiadas

Não se culpe pela criação dos seus filhos - Getty Images
Não se culpe pela criação dos seus filhos Imagem: Getty Images

Daniela Carasco

do UOL, em São Paulo

20/10/2017 04h00

“Pequeno Guia da Maternidade”, “Ideias para Futuras Mamães”, “Cartilha de Amamentação”... O que não falta nas prateleiras das livrarias são manuais de boas práticas na maternidade. Na internet, a profusão de páginas de Facebook, sites especializados e perfis do Instagram propagam os mais variados conselhos e ensinamentos na hora de lidar com qualquer problema desta fase. Tudo isso somado aos palpites de familiares e amigos provoca uma realidade preocupante, a de “mães angustiadas”.

Quem afirma é a pesquisadora de saúde materna e infantil Amy Brown, da Universidade de Swansea, no Reino Unido. Ela explorou o impacto provocado por publicações que ensinam como criar filhos sob rotinas rigorosas de sono, alimentação e comportamento. O estudo feito com 350 mulheres constatou que, quanto mais elas leem sobre o assunto, mais suscetíveis ficam aos sintomas de depressão, baixa autoestima e insegurança.

“A maioria das entrevistadas que leram livros desta categoria relataram aumento de ansiedade”, diz Brown na conclusão da pesquisa. “Aquelas que já carregavam uma certa culpa se sentiram ainda mais inseguras. Muitas demonstraram frustração por não conseguirem colocar os conselhos em prática.”

No Brasil, Maria Cecília Mattos, psicóloga perinatal e responsável pelo projeto Maternidade no Divã, nota uma realidade semelhante. “Recebo no consultório muitas mães preocupadas com a teoria, e que se esquecem de olhar para o seu bebê.”

Conselhos que frustram

Blogueiras que se dedicam a desmistificar o lado romântico da maternidade concordam com a especialista. Melina Pockrandt, autora do blog Maternidade Simples, conta já ter sentido muita culpa por não seguir as regras de “bom comportamento”. Ela é mãe de Manuela, 8, e Ana Julia, 3.

“Muito se fala sobre amamentação de livre demanda. Eu chegava a ficar com minha filha mais velha no peito por quase 6 horas. Essa coisa de amor incondicional também não aconteceu imediatamente comigo. Foi um sentimento que tive que construir. Te ensinam sobre o que seu filho não pode comer, o que deve ir na lancheira, qual a melhor idade para frequentar a casa dos coleguinhas... Isso é angustiante”, diz.

Claudia Paula de Queiros, nome por trás do blog “Maternidade na Real” e mãe do Miguel, 4, e da Laura, 2, também lamenta essa idealização da criação dos filhos. Na segunda gravidez, ouviu de muita gente que não daria conta de educar dois e que seria uma pena tirar o colo do mais velho tão cedo. Para amenizar o medo, recorreu à internet atrás de dicas. “Tudo era muito romantizado, me deixava cheia de expectativas. Ao não cumpri-las, me sentia frustrada”, diz.

A questão da amamentação foi a mais delicada para Claudia. “Te falam sobre a beleza do ato, mas esquecem de dizer que dói e é desgastante. Tem dias em que estamos indispostas e ainda assim precisamos dar de mamar.”

Maria Cecília destaca ainda dúvidas recorrentes sobre adotar cama compartilhada e deixar chorar ou pegar no colo. “Nunca existiu tantos guias e manuais sobre o assunto. Só que não existe resposta definitiva pra nada”, explica.

Chega de culpa!

A psicóloga sugere se libertar das regras e encontrar uma maneira particular de criação. “Isso possibilita viver a maternidade de forma mais leve. Não é fácil ser mãe, mas fica ainda mais difícil quando se cria modelos inatingíveis. Elas esquecem que dar o seu melhor é, de fato, o melhor. Não siga o manual como um passo a passo definitivo. Crie o seu próprio.”

Maria Cecília faz questão ainda de tranquilizar quem se cobra para sentir um amor profundo e sincero. “Todo bebê, no começo, é um estranho. Ele nunca será do jeito que a mãe sonhou. O estranhamento é natural. Não existe o instinto materno como dizem. É claro que há o cuidado, mas a maternidade é uma construção, um relacionamento cheio de altos e baixos. E isso é normal.”