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Mundo da moda desfila por cenários históricos de Berlim

Ximo Albors

Berlim

22/01/2010 12h18

Locais simbólicos da história de Berlim como o aeroporto de Tempelhof e a Bebelplatz, onde os nazistas organizaram sua queima de livros, viraram palcos para a semana de moda da capital alemã.

 

Se em 10 de maio de 1933 os nazistas utilizaram a Bebelplatz, junto à avenida Unter den Linden, para queimar 20 mil livros que consideravam contrários aos seus ideais políticos, 77 anos depois, o mesmo local foi ocupado por uma longa passarela pela qual transitam saltos, roupas e acessórios de mais de 30 estilistas de todas partes do mundo.

 

A semana de moda de Berlim redefiniu totalmente um espaço urbano no qual uma placa lembra o dia no qual as chamas reduziram a pó as ideias impressas de Thomas e Heinrich Mann, Bertolt Brecht, Heinrich Heine e Karl Marx, entre outros.

 

A famosa fogueira, feita por estudantes pró-nazismo, tinha o claro objetivo de acabar com todo tipo de pluralismo político e de consciência após a nomeação de Adolf Hitler como chefe de Governo.

 

Nesta semana, no entanto, a imagem do local é completamente diferente. As chamas de então se transformaram em holofotes, os gritos dos nazistas em aplausos dos especialistas e as cinzas do papel em roupas com as mais variadas estampas.

 

A passagem do tempo e a evolução da sociedade serviram também para que, na mesma praça na qual uma parte da cultura foi queimada há décadas, uma das personalidades convidadas hoje é Klaus Wowereit, prefeito de Berlim e homossexual assumido.

 

Além disso, o aeroporto de Tempelhof, situado em pleno centro da cidade e ponto de destino da ponte aérea que salvou Berlim do bloqueio soviético entre 1948 e 1949, está repleto de cabides, modelos e luzes que iluminam outra passarela da semana da moda, a "Bread & Butter", cheia de tendências urbanas.

 

Em 1948, a União Soviética decidiu bloquear o acesso terrestre à parte ocidental de Berlim, almejando que os aliados cedessem o controle total da capital alemã.

 

Grande parte dos berlinenses ficou então isolada, até que as potências ocidentais decidiram estabelecer uma ponte aérea, cujas pistas de aterrissagem seriam as de Tempelhof.

 

No mesmo local onde há 60 anos os aviões estiveram durante 11 meses levando mantimentos para os berlinenses sitiados, se celebra nestes dias uma feira de moda na qual grifes como Hugo Boss, Diesel e Lacoste apresentam suas ideias.

 

A "Bread & Butter" tem sua origem na cidade alemã de Colônia, onde se formou como uma reunião de moda alternativa às passarelas tradicionais.

 

Há alguns meses, e depois de ter passado anos em Barcelona, o salão de moda urbana voltou a pousar em Berlim para transformar os hangares de Tempelhof em passarelas.

 

Embora a decisão de transformar um lugar tão simbólico como a Bebelplatz em sede de um evento de moda não seja aplaudida por todos, mais consenso tem a utilização para o mesmo fim do heroico aeroporto que, fechado para o tráfego aéreo desde 2008 e encravado no meio da cidade, se estabelece como um inovador espaço capaz de abrigar eventos culturais.

 

A semana da moda de Berlim, que existe desde 2007, é praticamente uma recém-nascida no circuito de passarelas internacionais. O evento tenta conseguir espaço ao lado de Milão, Paris e Nova York, não hesitando em utilizar a originalidade de certos espaços da cidade.

 

Assim, a imagem que o mundo da moda monta nesta semana em Tempelhof e Bebelplatz, dois lugares carregados de memórias e lembranças para os berlinenses, mostra que nesta capital europeia a história não é jogada no lixo, mas reciclada.