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Ela temia não ser mãe após tratamento agressivo de câncer, mas está grávida

Barbara Campos Moraes e o noivo, Leandro; os dois estão à espera do primeiro filho e se casam em 2018 - Arquivo pessoal
Barbara Campos Moraes e o noivo, Leandro; os dois estão à espera do primeiro filho e se casam em 2018 Imagem: Arquivo pessoal

Adriana Nogueira

Do UOL

26/09/2017 04h00

Uma dor no braço muito forte e persistente levou Barbara Campos Moraes a peregrinar de médico em médico até descobrir que, aos 22 anos, estava com um linfoma de Hodgkin, um tipo raro de câncer que se origina nos gânglios do sistema linfático.

Durante o tratamento, Barbara, que é enfermeira e dentista, enfrentou o medo de ficar infértil e decidiu congelar óvulos (saiba mais sobre o procedimento abaixo). No começo deste ano, já com casamento agendado para 2018, ela viu-se grávida naturalmente. "A criança quis vir de convidada na festa", brinca.

A seguir, ela conta sua história, no mês que é dedicado a conscientização dos linfomas.

“Estava sofrendo com uma forte dor no braço fazia uns dias. Trabalhava como enfermeira e achei que tinha dado mau jeito. Procurei um ortopedista e nada. Estava em uma festa com o meu então namorado, o Leandro, que hoje é meu noivo, e minha mãe, quando a dor veio forte, de novo.

Além dela, senti, pela primeira vez, um caroço do lado esquerdo do pescoço. Na hora, pensei que podia ser algo grave. No dia seguinte, procurei um pronto-socorro. O médico insistiu que era infecção de garganta. Não era leiga. Além de trabalhar na área de saúde, estava fazendo a segunda faculdade, de odontologia. Exigi uma ultrassonografia.

Diagnóstico assustador

No mesmo dia, peguei o laudo, que apontou um nódulo de mais de 1 cm e dois outros, menores. Fui procurar um cirurgião de cabeça e pescoço no AC Camargo [hospital referência no tratamento de câncer em São Paulo]. Quando veio o diagnóstico de linfoma de Hodgkin, baqueei e perguntei se tinha chance de sobreviver.

Barbara Campos Moraes, personagem de matéria de UOL Estilo sobre linfoma e congelamento de óvulos - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal
Em setembro de 2014, comecei a quimioterapia. Só que uma reação alérgica, que me deixou marcas escuras pelo corpo até hoje, como se fossem feitas por ferro de passar roupa, fez com que o oncologista tivesse de alterar a composição do protocolo que estava recebendo. O problema fez com que, em vez de quatro ciclos de quimio, eu recebesse seis.

Uma picada de mosquito poderia me matar

Terminados os ciclos, exames mostraram que eu ainda tinha tumores. Minha médica falou que o melhor era partir para um transplante autólogo de medula. Teria de receber uma dose mais forte de quimioterapia, que correria pelo meu corpo por 24 horas. Feito isso, os médicos tirariam a minha medula e dariam uma carga de quimio nela. Com isso, ela seria recolocada em mim. Isso significaria que ela estaria livre da doença, mas também não teria capacidade de me proteger de nada.

Uma picada de mosquito poderia me matar. Ao receber essa notícia, sofri muito. Além de qualquer coisa poder me matar, teria de ficar em isolamento. De tanto minha mãe insistir, fomos procurar outros médicos. Foram dois onco-hematologistas, de hospitais de referência.

O primeiro disse que se não me curasse do linfoma com radioterapia, entregava o CRM. O segundo também falou que era a melhor indicação para mim. Fiquei sem entender, pois estava conformada que teria de fazer o transplante. Eles me disseram que a minha médica queria atacar uma formiga com um tiro de canhão. Que antes de partir para o procedimento, devia fazer uma tentativa com o tratamento. A perspectiva inicial de 45% de chance de cura. Não era muito, mas também não era pouco.

Decisão difícil

Decidi apostar. Foram 18 sessões de radioterapia. Para fazer o tratamento, tinha de usar uma máscara –feita a partir de um molde da minha cabeça. O artefato era preso na maca, enquanto eu recebia a radioterapia. Na primeira vez, tive uma crise de ansiedade. Meu coração disparou, tive falta de ar, comecei a suar... Antes de iniciar a radio, fui aconselhada a congelar meus óvulos [leia sobre o procedimento abaixo].

A radioterapia terminou em novembro de 2015. Em janeiro do ano seguinte, era a formatura na faculdade de odontologia e o PET Scan, exame que mostraria se estava ou não doente ainda. Era oradora da turma e fiz dois discursos: um para o caso de estar curada e outro, se não estivesse. Peguei o resultado dois dias antes da cerimônia e só contei para a família.

Na formatura, quando revelei no discurso, fui aplaudida de pé. No começo deste ano, a minha ginecologista pediu para eu parar de tomar o anticoncepcional por quatro meses, para fazer um exame hormonal. No último mês, antes de voltar a tomar a pílula, descobri que estava grávida. Estou com 18 semanas, e o casamento está marcado para outubro de 2018. O nosso filho, a gente já sabe que é um menino, quis vir de convidado.”

Sobre o congelamento de óvulos

Segundo Alfonso Massaguer, ginecologista e especialista em reprodução humana, o processo de congelamento de óvulos começa com uma estimulação hormonal de oito a 11 dias, usando remédios por via oral e/ou subcutânea, a depender de cada caso.
 
Ao longo desse período, são feitas de três a quatro ultrassonografias transvaginais, para checar como está a resposta do ovário a estimulação.
 
Quando os folículos (espécie de bolinhas de água, dentro das quais ficam os óvulos) chegam a aproximadamente 20 mm, é hora da aspiração, que tem de ser feita em centro cirúrgico, com a mulher sedada.
 
A retirada é feita com uma agulha inserida pela vagina. Em geral, são extraídos dez óvulos, que são congelados em nitrogênio líquido a - 196ºC.
 
No caso de pacientes com câncer, o ideal é congelar antes de quimioterapia e de radioterapia. Mas, mesmo após os tratamentos, é possível fazer o procedimento, caso de Barbara.
 
O congelamento também é uma saída para mulheres que queiram ser mães e cheguem aos 35 anos sem perspectiva de concretizar. “É uma forma de ter óvulos de qualidade, mais para frente, quando ela resolver que é hora de engravidar”, diz o especialista.
 
Em média, o procedimento –da estimulação ao congelamento– custa R$ 14 mil. A partir do ano seguinte da coleta, a clínica que armazena o material cobra um valor anual de conservação em torno de R$ 900.